Saúde

Falta generalizada de leitos de UTI revela ‘tomada de decisão tardia’, avalia epidemiologista

A lotação precisa ser avaliada, ‘mas não é o indicador principal’ para o controle efetivo dos números da pandemia, diz Guilherme Werneck

(Foto: Instituto de Estudos Avançados da USP)
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Com os números de ocupação dos leitos UTI por pacientes da Covid-19 em forte alta ao longo das últimas semanas, estados e municípios correm para abrir novas vagas ou retomar a construção dos hospitais de campanha – como foi o caso de São Paulo, que anunciou 11 unidades emergenciais para atendimento a pacientes mais graves.

No entanto, para além de refletir uma “tomada de decisão tardia” do poder público, a medida poderia ser melhor utilizada caso novos leitos fossem reativados ou implementados em hospitais que já contam com uma infraestrutura adequada. É esta a análise de Guilherme Werneck, pesquisador e professor do Instituto de Medicina Social da UERJ.

A estratégia principal de estratégias estaduais como o Plano São Paulo, desta maneira, estaria baseada em um princípio de tentar remediar o que já vinha “sendo alertado por vários epidemiologistas, profissionais da saúde e pesquisadores” com base nas baixas medidas de isolamento social e ritmo lento da vacinação no País.

“A ocupação precisa ser considerada, mas não é o indicador principal da tomada de decisão. Para isso, temos a taxa de infecção, de contato, o número de casos, eventualmente o número de óbitos, internações, hospitalizações, vários outros aspectos relacionados à dinâmica da transmissão na sociedade que permitem vislumbrar a situação mais adiante.”, comenta Werneck.

Apesar do professor destacar que os hospitais de campanha podem auxiliar no manejo de situações de pandemia em que o sistema de saúde está sobrecarregado, Werneck argumenta que há alternativas vistas como mais eficientes e com maior agilidade de funcionamento do que instaurar novos grandes complexos provisórios e, posteriormente, ter que desativá-los pelo alto custo continuado.

“Para o funcionamento de um hospital desses com o atendimento adequado, você precisa de mais que o leito e ventiladores, mas também de um suporte para a realização de exames, pessoal de diferentes matizes – desde intensivistas a profissionais da enfermagem, terapeutas, médicos, auxiliares de limpeza. Existem outras alternativas que, no meu ponto de vista, seriam prioritárias.”

Entre elas, estaria prospectar quais hospitais possuem alas ou leitos desativados, de forma a compartilhar a estrutura já instalada e deixar um legado para o futuro próximo, em caso de novas ondas de contágio, ou para o sistema de saúde em si, já que o problema da falta de leitos de UTI é anterior à pandemia.

“Os hospitais de campanha não são nem a solução, problema ou responsáveis por essa situação. Eles são ferramentas emergenciais e provisórias, uma estratégia posterior àquela que poderia ser implementada que é aumento das estratégias de prevenção não farmacológicas, vacinas e a disponibilidade de leitos nas estruturas já existentes.”, pontua Werneck.

Na segunda-feira 8, o governo paulista anunciou a implantação, entre 20 e 31 de março, de 11 hospitais de campanha em diferentes regiões do estado. Com a expansão, São Paulo passará a ter 15 hospitais de campanha. Serão abertos 140 novos leitos de UTI e 140 de enfermaria em meio à respectivos piores índices de internação no estado.

Para a implementação dos novos hospitais, uma problemática vivida pelo estado do Rio de Janeiro, por exemplo, foi o escândalo de desvio de recurso público destinado aos hospitais e o superfaturamento do preço das unidades.

Foi o caso do Hospital Modular de Nova Iguaçu, construído para atender pacientes de Covid-19, mas que nunca chegou a ser aberto. O governo do Rio destinou R$ 62 milhões na unidade, que foi concluída em julho, com espaço para 300 leitos, incluindo 120 de UTI. No entanto, de acordo com a Secretaria Estadual de Saúde, havia, até outubro de 2020, apenas 100 leitos equipados.

As fraudes foram centrais para o Ministério Público do Rio de Janeiro denunciar diversos gestores da saúde do estado, além de provocar a abertura do processo de impeachment contra o governador afastado Wilson Witzel (PSC).

Para Werneck, os estados devem se pautar nos modelos de gestão que efetivamente funcionaram e olharam para as demandas necessárias em cada região. A diminuição no tempo do transporte para se locomover até o hospital, por exemplo, também deve ser considerada.

“Existem casos de superfaturamento e hospitais que não tiveram demanda necessária, o que precisa ser visto em relação ao custo. Às vezes vale a pena abrir um hospital com menor atendimento se o custo não for tão alto, já que tem a ver com a expectativa de evolução da epidemia, e elas não são coisas facilmente realizadas.”

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