Saúde

Covid-19: 10 perguntas ainda sem respostas sobre coronavírus no Brasil

O País corre risco de enfrentar uma segunda onda? A vacina significa o fim da pandemia? Quando a vida volta ao normal?

Representação criativa de partículas do vírus SARS-COV-2; Foto: NIAID Representação criativa de partículas do vírus SARS-COV-2; Foto: NIAID
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Após 11 meses do primeiro caso do novo coronavírus diagnosticado no mundo, em novembro de 2019 na China, muitas perguntas sobre a pandemia seguem sem resposta.

No Brasil, a primeira notícia de infecção data de 26 de fevereiro, em São Paulo. De acordo com o Ministério da Saúde, o caso foi de um homem de 61 anos que havia feito uma viagem para Itália, na região da Lombardia.

Desde então, o Brasil chegou a cinco milhões de casos confirmados, ultrapassou as 148 mil mortes e já teve três ministros da Saúde no período.

CartaCapital selecionou alguns questionamentos sobre a pandemia e conversou com especialistas.

1) É possível se infectar com o coronavírus mais de uma vez?

Para o professor Alessandro dos Santos Farias, coordenador da Frente de Diagnósticos da Força Tarefa da Universidade de Campinas (Unicamp) contra a Covid-19, “existem, sim, alguns casos que aparentemente são de reinfecção”.

Mas ele pondera: “Ainda precisamos entender se esses casos são infecções com a mesma cepa [variação genética] ou se é uma diferente, que adquiriu mutações. Neste caso, a resposta imune não mais protege aquele indivíduo, pois o vírus pode ser diferente”, diz Farias.

2) É possível ter ideia do tamanho da subnotificação no Brasil?

De acordo com o professor da Unicamp, “no Brasil é bem difícil”.

Ele ressalta, no entanto, que é possível fazer uma projeção. “Uma conta que pode ser feita é que a letalidade gira em torno de 0.8 a 1.4% dos casos. No País, ela está em 3%. Só aí já teríamos três vezes o numero de casos. As mortes também estão subnotificadas por falta de testes”, alerta.

“É possível estimar o número de mortes subnotificadas olhando para o número de óbitos por [Síndrome Respiratória Aguda] SRA, que não são de Covid-19, e compará-lo com a média de anos anteriores”, completa.

3) O pior da pandemia já passou?

Com mais de 148 mil mortes e com uma marca superior aos de cinco milhões de infectados, Farias afirma que “aparentemente, sim”.

O professor, porém, aponta para a possibilidade de que a “a imunidade protetora não seja duradoura”. Neste caso, pode ser que haja muitos casos de reinfecção.

4) Quais são os risco de uma segunda onda?

Na Europa, países tentam conter o que se chama de segunda onda da pandemia. França, Irlanda, Espanha e Rússia já retomaram medidas restritivas de circulação a fim de contê-la.

No Brasil, diz o professor, uma segunda onda é bem pouco provável: “Nossa curva é muito mais longa do que dos países que tomaram medidas reais de cuidado. Por aqui, só deve acontecer se for proveniente de reinfecções”, explica.

5) A vacina é a garantia do fim da pandemia?

Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), uma vacina contra a Covid-19 pode estar pronta até o fim deste ano.

“Vamos precisar de vacinas, e há esperança de que possamos ter uma até o final deste ano”, afirmou o diretor-geral, Tedros Adhanom Ghebreyesus, na última terça-feira 6. “Há esperança”.

No Brasil, duas vacinas – consideradas as mais promissoras e avançadas contra o coronavírus – são testadas: a da Universidade de Oxford em parceria com a farmacêutica AstraZeneca e a da empresa chinesa Sinovac.

Outras duas, das farmacêuticas norte-americanas Johnson & Johnson e Pfizer receberam, recentemente, autorização das autoridades brasileiras para começar os ensaios clínicos no País.

Para Farias, decretar o fim da pandemia vai depender “da cobertura e da possibilidade de nos próximos anos termos cepas diferentes do vírus que não estariam cobertas por uma possível vacina”. Ou seja, depende da capacidade do coronavírus adquirir algum tipo de variação.

6) Quando a vida volta ao normal?

Alessandro Farias afirma que isso dependerá da eficácia da vacina contra o coronavírus: “Das mais avançadas, falam em 50% de eficácia. Assim, seria necessário imunizar todas as pessoas”.

Em entrevista a CartaCapital, o cientista Miguel Nicolelis disse que não é possível fazer esse prognóstico.

“Nós tivemos uma pequena queda que já foi vista em outros países, como nos EUA, mas a situação lá explodiu de novo no começo de junho. Só agora eles estão tendo níveis um pouco mais baixos, basicamente os mesmos números de óbitos diários que temos neste momento, 800 em média. E isso para um país que tem uma população 50% maior do que a nossa. Ou seja, nós estamos em um patamar de instabilidade, onde qualquer surto mais importante pode levar a um crescimento de casos, vide o que aconteceu no Rio de Janeiro. Há duas semanas, a taxa de ocupação de leitos da rede pública na cidade do Rio de Janeiro chegou a 79%, e na rede privada chegou a 90%. É muito difícil dizer que o pior já passou. No Brasil, a gente aprendeu que essa frase é extremamente perigosa de ser usada”, disse.

7) Por que há reações tão diferentes nas pessoas?

O professor Alessandro Farias explica que “ainda não dá para saber por completo”.

“O que temos claro é que as comorbidades facilitam a forma agressiva da Covid-19. No entanto, ainda existe muito para entender sobre o vírus e sua interação com o organismo e diferentes condições imunológicas e metabólicas”.

8) É possível saber quanto tempo dura a imunidade?

Um estudo feito pela King’s College de Londres, na Inglaterra, indicou que a imunidade contra o coronavírus dura apenas alguns meses e que o vírus pode ser detectado novamente como um resfriado.

Cerca de 90 profissionais e pacientes de dois hospitais do sistema NHS do Reino Unido — equivalente ao SUS, no Brasil — foram analisados na pesquisa.

Os anticorpos dessas pessoas atingiram o pico de proteção na terceira semana depois de apresentar sintomas da Covid-19.

Neste período, o “nível potente” dessas estruturas de defesa do organismo era encontrado em 60% das pessoas. Três meses depois, apenas 17% dos profissionais e pacientes ainda mantinham o nível desejado.

Para o professor da Unicamp, no entanto, será preciso de tempo para entender isso:

“Esse é um problema do Brasil, a gente deixa a Ciência de lado, não dá nenhum valor, corta verba. Aí, na hora que acontece uma coisa dessas, todo mundo acho que Ciência é pastelaria : ‘Oi, queria um de queijo’ . Vacina não surge de uma hora pra outra. Conhecimento leva tempo e depende de investimento constante”, diz.

9) Crianças têm menos riscos que adultos?

A infecção pelo novo coronavírus na infância tem se comportado de maneira distinta da observada em adultos, apontam alguns estudos.  O número de crianças acometidas é menor e a maioria delas permanece assintomática ou desenvolve sintomas brandos.

“No início da pandemia, pensava-se que crianças não estavam sendo infectadas, mas agora está claro que a quantidade de infecção em crianças é a mesma que em adultos”, disse Andrew Pollard, professor de Infecções Pediátricas e Imunidade na Universidade de Oxford, em entrevista à BBC.

Ocorre que, na maioria dos casos, acrescenta ele, quando crianças são infectadas, seus sintomas são mais leves.

10) Qual a relação da síndrome inflamatória multissistêmica pediátrica (Sim-P) com a Covid-19?

O Brasil já registra mais de 300 casos de uma síndrome inflamatória grave em crianças e adolescentes que é investigada por sua possível ligação com o novo coronavírus.

“Parece que existe sim uma relação”, diz Farias a CartaCapital.

Os dados são de um levantamento do jornal Folha de S.Paulo junto a secretarias estaduais de Saúde e em boletins do governo federal.

Para comparação, até 26 de agosto, balanço do Ministério da Saúde apontava 197 casos —um avanço de 89% em cerca de um mês.

Alguns especialistas  apontam para uma síndrome relativamente rara, mas que exige atenção e acompanhamento por sua gravidade e por se tratar de uma possível nova doença.

O quadro tem sido chamado de Sim-P, sigla para síndrome inflamatória multissistêmica pediátrica, com registros no País em crianças e adolescentes de 0 a 19 anos.

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