Coronavírus: MP apura ordem de omissão em postos de saúde de São Paulo

E-mails revelam ordem para não notificar casos em 37 unidades da capital; plano de saúde para idosos também é alvo de inquérito

Unidade Básica de Saúde (UBS) na cidade de São Paulo (Foto Guilherme Gandolfi/ Fotos Públicas)

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O Ministério Público de São Paulo abriu, nesta quinta-feira 2, um inquérito para apurar indícios de irregularidades na notificação de casos do novo coronavírus em unidades de saúde em São Paulo. O caso envolve as secretarias estadual e municipal de Saúde e o Centro de Estudos e Pesquisas Dr. João Amorim (Cejam), organização que administra postos de saúde públicos no estado. 

E-mails revelados no dia 27 pelo G1 mostram que o Cejam determinou a 37 postos de saúde da capital que deixe de comunicar casos brandos de Covid-19 em pacientes comuns. Apenas casos de profissionais da saúde, segundo o documento, deveriam ser comunicados ao governo federal.

O caso também foi tema de uma reportagem da CNN Brasil, publicada no dia 1º de abril. A reportagem mostrava ainda, no corpo daquele mesmo e-mail, uma mensagem enviada no dia 24 pela Diretora da Divisão Técnica, Samantha Leite de Souza, para as Coordenadorias, Supervisões e Unidades de Vigilância em Saúde, o que reforça que a ordem veio de instâncias superiores.

“Assunto: ENC: Notificação SRAG COVID-19, ‘Segue orientação sobre notificação e coleta de casos suspeitos de Coronavírus. Somente casos hospitalizados no SIVEP e SG: em profissionais da saúde no Redcap (ambos terão amostra coletada): A vigilância de Coronavírus está inserida  na vigilância de SRAG e a partir desta data somente os casos de SRAG Hospitalizados devem ser notificados…’”. O trecho em questão foi removido da reportagem.

E-mail encaminhado a postos de saúde de SP orienta notificação apenas de casos graves entre os pacientes (Reprodução/G1)

À CNN Brasil, o Cejam afirmou estar apenas seguindo as diretrizes de Secretaria Estadual da Saúde. A pasta nega. A Diretora da Vigilância Epidemiológica da pasta, Helena Sato afirmou à emissora não reconhecer a determinação passada aos postos de saúde.


Ao G1, porém, ela disse que a medida era necessária para concentrar esforços nos casos mais graves: “É só uma forma de a gente poder acompanhar o que é mais importante nesse momento. Quando começa a ter mais casos, a gente começa a focar nos graves.”

Em coletiva nesta quinta-feira 2, o secretário estadual de Saúde, José Henrique Germann, afirmou que não existe orientação do governo para que casos de coronavírus não sejam notificados. Ele respondia a pergunta de repórter sobre denúncias em postos de saúde. 

A portaria foi instaurada pelos promotores Dora Martin Strilicherk e Arthur Pinto Filho, do grupo de Saúde Pública do MP. No despacho, reforçam que a resolução do estado esteja provocando “subnotificação em larga escala” dos casos suspeitos de coronavírus. Também chamam para a gravidade do ocorrido.

“A subnotificação dos casos suspeitos de COVID-19 impede a adoção de política pública eficiente para combater a propagação acelerada do vírus e proporcionar atendimento adequado às pessoas infectadas (investimentos, leitos, EPI, RH, etc.), falseando a necessidade de compra pelo Poder Público da quantidade de testes necessária para controle do real  número de infectados e análise da efetiva possibilidade de expansão da pandemia (…)”. 

A Cejam tem dois dias para esclarecer à promotoria “como uma OSS que administra serviço público municipal de saúde, com repasse de verba do município, desdenha das determinações do gestor municipal de saúde ao adotar procedimento que favorece à subnotificação dos casos suspeitos de coronavírus”.

As secretarias de Saúde estadual e municipal terão que detalhar ao, em até cinco dias, o que vem fazendo para garantir que todos os casos suspeitos de coronavírus sejam notificados. No início da semana, o Ministério Público de Contas já havia cobrado o governo para não testar apenas os pacientes internados em estado grave

Prevent Senior

Não é a primeira organização de saúde que entra na mira do poder público em meio à pandemia. No início da semana, o MP-SP abriu inquérito criminal contra a rede de planos de saúde Prevent Senior. O objetivo é apurar se a rede omitiu mortes pela doença.

A Prevent Senior é dona dos hospitais Sancta Maggiore, contabiliza ao menos 79 mortos por Covid-19, mais da metade dos óbitos confirmados até agora em São Paulo. Quando a doença eclodiu, os pacientes estavam concentrados em uma única unidade da rede, no bairro do Paraíso. Na quarta-feira, foi instaurado um segundo inquérito, cível, para apurar as medidas tomadas pela Secretaria Estadual de Saúde em relação à rede.

O poder executivo também põe em xeque a conduta da companhia. No dia 27, a Secretaria Municipal de Saúde de São Paulo pediu ao governo estadual intervenção nos três hospitais da rede. Entre os problemas detectados pela prefeitura, estariam o isolamento inadequado de pacientes com covid-19 e descumprimento de notificação obrigatória de casos suspeitos.

Na terça-feira 31, o ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta disse que um dos hospitais da operadora se transformou em “ambiente de transmissão” da doença. Lançada há 23 anos, a Prevent Senior ficou famosa por oferecer planos de saúde para a terceira idade a preços acessíveis. A empresa nega todas as acusações.

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