Saúde

A obesidade na mira

Uma nova droga aponta para a possibilidade de perda consistente de peso com uma simples injeção semanal

Foto: IstockPhoto
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Perder peso de forma consistente está se tornando mais fácil. A cirurgia bariátrica, após vasta experiência e centenas de estudos científicos, comprovou sua capacidade de reverter quadros de obesidade, com perdas de peso acima de 20% mantidas por vários anos. Com isso, há redução de doenças como diabetes, hipertensão, infarto etc.

Há poucos dias, resultados de um estudo extenso, com 2.539 pacientes, demonstrou, pela primeira vez, a possibilidade de perda de peso acima de 16%, também mantida por mais de um ano, com uma simples injeção semanal. Esta revolução apresenta novas possibilidades para os pacientes obesos.

Conversamos com o doutor Ricardo Cohen, pesquisador e coordenador do Centro de Obesidade e Diabetes do Hospital Oswaldo Cruz, a respeito desses dados e da perspectiva de combate à pandemia da obesidade.

CartaCapital: A obesidade continua sendo um grande problema de saúde pública, no Brasil e no Mundo?

Ricardo Cohen: A obesidade é a real pandemia do século. No Brasil, a prevalência dessa doença crônica aumentou 72% nos últimos 13 anos, saindo de 11,8% em 2006 para 20,3% em 2019.

CC: O senhor tem uma das maiores experiências de cirurgia bariátrica no Brasil e no mundo. Como vê esta pesquisa recente do medicamento que conseguiu reduzir o peso dos pacientes?

RC: Realmente, na semana passada, um laboratório farmacêutico anunciou dados de um estudo extenso de uma nova droga injetável que age em receptores hormonais que controlam a fome e a saciedade, chamada “tirzepatide”.

CC: Ela é específica para obesidade?

RC: Não. O objetivo dessa medicação, nos estudos iniciais, era mostrar sua ação sobre o controle do diabetes. No entanto, cerca de 60% dos pacientes perderam ao redor de 20% do peso total. O controle do peso, conforme resultados de estudos do nosso grupo publicados na revista ­Lancet, é fundamental no manejo do diabetes. Os resultados de perda de peso com tirzepatide nunca haviam sido conquistados com nenhuma droga até hoje. Isso abre uma boa perspectiva para o tratamento eficaz da obesidade.

CC: Resultados encorajadores. Temos informações a respeito de efeitos colaterais?

RC: Em termos de segurança e tolerabilidade, os resultados foram comparáveis com outras terapias com análogos hormonais para obesidade, como a liraglutide e a semaglutide. Náuseas e diarreia foram os efeitos colaterais mais comuns. Mas aguardamos análises mais detalhadas de segurança.

CC: A tirzepatide já pode ser considerada o tratamento de escolha para obesidade?

RC: Temos de ter cautela na análise dessa informação. Os resultados ainda não foram publicados em nenhuma revista médica que tem revisão por pares. Os resultados anunciados pelo laboratório são de um seguimento de 72 semanas de uso da medicação. Necessitamos de resultados e de seguimento a longo prazo (vários anos). Os resultados iniciais de outro análogo hormonal, a semaglutida, foram bons em relação à perda ponderal. No entanto, um ano após a retirada da semaglutida, os participantes recuperaram dois terços do peso perdido, com alterações semelhantes nos parâmetros cardiometabólicos. Os resultados confirmam a cronicidade da obesidade e sugerem a necessidade de tratamento contínuo.

CC: Mas a tirzepatide é um avanço. Como fica a indicação da cirurgia bariá­trica no futuro?

RC: Alguns já defenderam a ideia de que esta droga vai substituir a cirurgia bariátrica. Para mim, isso parece um pouco prematuro. A cirurgia já mostrou efetividade e a dicotomia cirurgia vs. tratamento clínico não é boa. A cirurgia e a melhor medicação disponível devem andar juntas. Imagine os resultados que podemos conseguir ao associar a eficaz e segura cirurgia com a tirzepatide, quando ela estiver no mercado?

CC: A associação de cirurgia com medicamento tem sido oferecida aos pacientes?

RC: Nosso grupo utiliza, em casos selecionados, a semaglutida com a cirurgia para um melhor desfecho em pacientes que cumpram as indicações dessa associação. O desenvolvimento das novas drogas é o alvorecer de uma era para o tratamento da obesidade. Assim como nas doenças oncológicas a cirurgia é associada à quimio ou à radioterapia, podemos vir a ter, no tratamento da obesidade, a associação entre a cirurgia bariátrica, quando indicada, com o melhor tratamento clínico – sempre de forma individualizada, para cada paciente. •

PUBLICADO NA EDIÇÃO Nº 1207 DE CARTACAPITAL, EM 11 DE MAIO DE 2022.

Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título “A obesidade na mira”

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