Política
Tudo ou nada
Cenário pulverizado na cidade pressiona por união do campo progressista, mas Salabert e Correia relutam em ceder cabeça de chapa


A um mês do início da campanha eleitoral, Belo Horizonte prepara-se para uma das mais acirradas – e indefinidas – disputas de sua história. Ao contrário de outras capitais, como Rio de Janeiro e Recife, onde o atual prefeito desponta como favorito, na capital mineira o desempenho do prefeito Fuad Norman, do PSD, com apenas 9% das intenções de voto na pesquisa Quaest divulgada em 15 de junho, nutre as esperanças de vitória sobre seus adversários à esquerda e à direita. Talvez por isso o quadro eleitoral permanece pulverizado, com pelo menos nove nomes ainda embolados na disputa, e as tratativas para possíveis alianças parecem emperradas.
Apesar dos discursos de união contra a direita e do entendimento de que precisa estar unida para garantir com maior facilidade um lugar no segundo turno, a esquerda não conseguiu, ao menos por enquanto, chegar a um nome de consenso. Pré-candidato do PT e apoiado publicamente por Lula, o deputado federal Rogério Correia, que aparece com 6% das intenções de voto, conseguiu os apoios das pré-candidatas do PSOL, Bella Gonçalves (2%), e da Rede, Ana Paula Siqueira (1%), mas não obteve êxito com a deputada estadual Duda Salabert, do PDT, que aparece com 9% na pesquisa, empatada com Norman e com o senador Carlos Viana, do Podemos. “Para a esquerda, a aliança é importante, pois ela corre o risco de ficar fora do segundo turno”, avalia o cientista político Carlos Ranulfo, da UFMG.
Um eventual acordo entre as candidaturas de PT e PDT, diz o professor, aumenta as chances de chegada do campo progressista ao segundo turno: “Isso não quer dizer que vai ganhar a eleição, porque o desempenho da esquerda em Belo Horizonte tem sido muito ruim. Mas, se houver aliança, há uma chance. Essa eleição não tem favorito”. Mesmo assim, as negociações para uma união já no primeiro turno patinam: “Na conversa com o PT, o PDT deixou claro o critério que adotamos, que é o das pesquisas. O nome que tiver maior viabilidade eleitoral, menor rejeição e mais chance de ir para o segundo turno deverá ser aquele que estará na cabeça de chapa. Essa é a posição do PDT, sempre foi, é pública, e o PT aparentemente não concorda com esse critério. Então, não há consenso, os partidos vão caminhar separados no primeiro turno”, afirma Salabert.
Em reunião realizada no início do mês, com a presença de Gonçalves e Siqueira, o petista tentou convencer Salabert a ser vice em sua chapa. “A conversa foi boa, mas inconclusiva. Haverá outras. A intenção geral é buscar a unidade, de preferência no primeiro turno. Por ora, mantêm-se as duas pré-candidaturas”, diz Correia. Se o acordo com o PDT não evolui, ele afasta qualquer negociação em torno de um eventual apoio à reeleição de Fuad: “Não existe essa possibilidade. Minha candidatura segue, com apoio do presidente Lula. Inclusive, as decisões para que eu me tornasse pré-candidato foram unânimes nos diretórios municipal, estadual e federal do PT”.
Amplificada pelo grupo político do atual prefeito, que ainda aposta na boa relação de Norman com Lula, a ideia de unidade da esquerda em torno da reeleição também é refutada por Salabert: “As pesquisas têm mostrado que o meu nome, entre as candidaturas do campo progressista, é aquele que tem maior fôlego eleitoral e maior chance de ir para o segundo turno. Então, a pergunta não é se nós vamos apoiar o Fuad ou o Rogério, mas quando os dois vão desistir de suas candidaturas e apoiar aquela que tem maior chance eleitoral, que é a nossa”.
A candidata do PDT está mais bem posicionada nas pesquisas. Já o petista conta com apoio de Lula
Para Ranulfo, é muito difícil a esquerda apoiar Norman, apesar de 32% da população de BH considerar positiva sua gestão. “Lula chegou a insinuar que o Fuad poderia ser seu candidato, mas tanto o Rogério quanto a Duda têm mais intenções de voto. Fuad é um candidato pouco competitivo. A prefeitura é bem avaliada, mas o prefeito não passa dos 10% nas pesquisas porque ninguém o conhece, é uma pessoa muito discreta. Por isso, acho que a chance de Duda ou Rogério apoiarem Fuad é muito pequena”, diz.
Segundo a Quaest, a direita está em vantagem na corrida eleitoral em BH. O apresentador de tevê Mauro Tramonte, do Republicanos, lidera com 25% das intenções de voto. Há 16 anos na TV Record e considerado o “Datena mineiro”, Tramonte goza de grande popularidade, sobretudo entre os eleitores de menor renda. Na pesquisa, ele aparece com 39% no eleitorado que ganha até dois salários mínimos e com 36% entre os evangélicos. A título de comparação, Tramonte é conhecido por 53% dos entrevistados, número que cai para 25% no caso do prefeito Fuad, mas isso pode não ser suficiente para levá-lo ao segundo turno. “Essa liderança do Tramonte pode desmoronar rapidamente. Ele também não é favorito”, avalia Ranulfo. Empatados em segundo lugar, o deputado estadual bolsonarista Bruno Engler, do PL, e o tucano João Leite figuram com 11% das intenções de voto.
A disputa, acrescenta o professor da UFMG, permanece indefinida também no que diz respeito à consolidação de um nome de direita. Ranulfo diz não acreditar em uma aliança nesse campo ainda no primeiro turno: “Não vejo chance de coligações já. O Engler terá apoio de Bolsonaro, o Tramonte corre por fora e o João Leite vai mais pelo centro. Estarão cada um na sua”.
A única certeza é que quem chegar ao segundo turno precisará conquistar muitos eleitores. “Tudo indica que teremos na etapa decisiva dois candidatos com pouco voto. E o terceiro e o quarto colocados provavelmente chegarão no dia da eleição fungando no cangote dos dois primeiros. Há pelo menos cinco candidatos que podem chegar ao segundo turno e não dá para dizer quem vai ganhar. É uma eleição completamente em aberto.” •
Publicado na edição n° 1319 de CartaCapital, em 17 de julho de 2024.
Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título ‘Tudo ou nada’
Apoie o jornalismo que chama as coisas pelo nome
Depois de anos bicudos, voltamos a um Brasil minimamente normal. Este novo normal, contudo, segue repleto de incertezas. A ameaça bolsonarista persiste e os apetites do mercado e do Congresso continuam a pressionar o governo. Lá fora, o avanço global da extrema-direita e a brutalidade em Gaza e na Ucrânia arriscam implodir os frágeis alicerces da governança mundial.
CartaCapital não tem o apoio de bancos e fundações. Sobrevive, unicamente, da venda de anúncios e projetos e das contribuições de seus leitores. E seu apoio, leitor, é cada vez mais fundamental.
Não deixe a Carta parar. Se você valoriza o bom jornalismo, nos ajude a seguir lutando. Assine a edição semanal da revista ou contribua com o quanto puder.