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Tostão por tostão

O ex-ministro Celso Pansera descreve o esforço para recompor os investimentos em Ciência e Tecnologia

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Empenhado em colocar ordem na casa, avaliar com precisão o tamanho do estrago produzido nos quatro anos de governo Bolsonaro e identificar as formas mais seguras e rápidas para que a ciência brasileira volte a andar para a frente, o grupo de ex-ministros, parlamentares, cientistas e professores responsável pela transição no setor apresentou na quarta-feira 30 o primeiro relatório. Integrante da equipe, o ex-ministro Celso Pansera participou do programa Direto da Redação, no canal do YouTube de CartaCapital, e citou as prioridades a partir de 1° de janeiro.

PEC da Transição
Em valores reais, o Orçamento da Ciência e Tecnologia executado no ano passado se compara ao de 2012. Ou seja, sob o governo Bolsonaro vivemos o retrocesso de uma década. Para recompor essa perda é fundamental a aprovação da PEC da Transição, que abre um espaço fiscal de mais de 100 bilhões de reais. Dessa forma será possível recompor boa parte dos recursos. A PEC também prevê que as receitas próprias das universidades ficarão fora do alcance do teto de gastos.

Bolsas
Uma prioridade muito clara é recuperar as bolsas de mestrado e doutorado. Se não houver reajuste, a bolsa de mestrado em 2024 terá valor menor do que o salário mínimo. O último reajuste foi em 2013 e pedimos um mínimo de 40% de recomposição diante de uma perda que varia entre 70% e 75%. Não para recompor o valor total, mas para dar um mínimo de dignidade e possibilitar que a nossa inteligência permaneça aqui, que a juventude que hoje faz pesquisa e ciência fique no Brasil. O País hoje produz entre 70 mil e 80 mil artigos científicos por ano, é uma das melhores produções do mundo. Mas a tendência é cair, porque não há base para sustentar. Os cérebros se perdem, vão para o exterior ou desistem de suas pesquisas e decidem sustentar a família de outra forma. Há uma expectativa muito grande de conseguir esse reajuste até janeiro, mas depende da aprovação da PEC. Se não der para recompor tudo agora, teremos o segundo ano de governo para recompor o restante das perdas.

Transição
Temos três olhares. Primeiro, viabilizar um orçamento mínimo para o setor, incluindo universidades, pesquisas e bolsas. Segundo, definir ações estratégicas para os primeiros cem dias de governo. Terceiro, apontar aquilo que tem de ser revogado, que não tem como manter por atrapalhar o funcionamento da máquina pública no setor. É um trabalho intenso para um curto tempo, mas a equipe de transição está bastante dedicada a essa questão. Temos feito uma série de ­reuniões com os diversos setores e entidades, procuramos ouvir todos.

Militares
Vários projetos militares em Ciência e Tecnologia funcionam à meia-bomba, alguns estão praticamente paralisados. Tenho certeza de que amplos setores das Forças Armadas estão atentos a isso e querem retomar esses projetos. São projetos importantes para a defesa nacional e para a própria ideia de nação. Os militares não estão preocupados só com salário. Em termos de ciência e inovação, há coisas que dizem respeito à própria essência e existência das Forças Armadas. No setor de Ciência e Tecnologia, o governo Lula terá muito a falar com as Forças Armadas.

“No mundo todo, quem sustenta a pesquisa básica é o setor público”

FNDCT
É importante impedir a aprovação da Medida Provisória 1136, porque ela estabelece um cronograma de liberação de recursos do FNDCT que na prática estica sua execução plena até 2026. Isso é muito ruim. Aprovamos a Lei Complementar 177 em 2020. Bolsonaro vetou dois dispositivos, mas nós derrubamos um dos vetos e obrigamos a liberar os recursos do FNDCT plenamente. Neste ano, o fundo teve em torno de 8 bilhões de reais, mais da metade está, porém, retida no caixa único do Tesouro. Para o ano que vem, a previsão é de 11 bilhões de reais e temos conversado com o Parlamento para que o FNDCT seja liberado plenamente.

Pré-sal
A Educação tem direito a 37,5% do Fundo Social do Pré-sal. E vão 12,5% para a Saúde. Os outros 50% compõem o saldo primário do governo. Nossa proposta é que metade desse saldo restante – ou seja, 25% – seja repassada à Ciência e ­Tecnologia. A previsão é de que o Fundo Social do Pré-sal arrecade 620 bilhões de reais nos próximos dez anos. Deixar um quarto disso com a CT&I significa injetar até 16 bilhões por ano. São recursos que nunca tivemos e que permitirão à ­ciência brasileira dar um salto enorme em sua produção de pesquisa, com resultados práticos para a economia do País. Essa lei está na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara e, se aprovada, irá direto ao Senado. Não inventamos dinheiro novo. É dinheiro arrecadado, está no caixa da União e queremos que parte disso fique com o setor.

Papel do Estado
Quem investe em produção de conhecimento e ciência básica é o Estado, não a iniciativa privada. No mundo inteiro, quem paga pela ciência é o Poder Público. A iniciativa privada, e isso nós não conseguimos fazer plenamente no Brasil, vai à universidade ou ao instituto de pesquisa, pega aquela tecnologia para si e se associa ao Poder Público para lançar o produto. A iniciativa privada é importante porque tem capacidade de gerir e criar capilaridade para negócios e para a produção em larga escala, mas a essência da ciência no mundo é pública.

Meio Ambiente
O meio ambiente será um dos grandes eixos do governo. Tudo o que será desenvolvido no Brasil em pesquisa, inovação e ciência terá foco na preservação da Amazônia e na busca de novos conhecimentos oriundos da floresta. A Amazônia tem um potencial enorme para a produção de riquezas, remédios, alimentos e fitoterápicos. Todo o governo está focado nisso, todo grupo de transição está empenhado em fazer com que a Amazônia seja um tema transversal a todo o governo. No caso da CT&I vamos avançar em pesquisas na área. A Amazônia é um mundo a ser desvendado de forma sustentável para trazer um novo ciclo de desenvolvimento à ciência brasileira. •

PUBLICADO NA EDIÇÃO Nº 1237 DE CARTACAPITAL, EM 7 DE DEZEMBRO DE 2022.

Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título “Tostão por tostão “

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