Política

Serasa não é fiscal da cidadania

A corregedoria eleitoral atropelou Constituição ao aceitar compartilhar dados de eleitores com a empresa de crédito

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O Brasil, depois de tantas fraudes e resultados eleitorais manipulados, mudou, a partir do Código Eleitoral de 1932, o seu sistema de controle do processo eleitoral. E a Constituição de 1934 criou a Justiça eleitoral, como órgão do Judiciário e aproveitamento de emprestados juízes estaduais para atuação em primeiro grau, nas zonas e circunscrições.

Até então, três sistemas eram conhecidos. Na verdade, todos voltados a dar legitimidade à representação popular e assegurar a cidadania, ou seja, o direito de votar, de ser votado, da livre escolha e da igualdade.

O primeiro sistema, de controle pelo Legislativo, tinha por meta acabar com a influência ilegítima do Poder Executivo. Na Inglaterra e na França, e depois na Constituição norte-americana de 1787, ficou marcado o princípio de que “cada Câmara é o natural juiz da elegibilidade e da regularidade da eleição dos seus membros”.

Essa forma de controle pelo Legislativo, no Brasil conhecido desde a Carta imperial de 1824 e reproduzida na primeira Constituição republicana de 1891, foi um escárnio. Todos lembram, e rios de tintas foram desaguar em livros e artigos, das fraudes por “bico de pena”, cédulas falsificadas validadas, coações de potentes coronéis, compra de votos, etc, etc. Tudo isso, por evidente, tirava a legitimidade do eleito e comprometia a representação popular. E hoje o grande problema é o abuso do poder econômico.

Para se exercitar a cidadania ativa, e o voto é obrigatório no Brasil, há necessidade de se fazer inscrição e postular, junto à Justiça eleitoral, o deferimento do registro e a inclusão administrativa nas listas de votantes. E um título eleitoral é expedido a comprovar (e não é a única forma) a condição de eleitor.

Se para exercitar o direito de cidadania existe essa formalidade de inscrição, fica evidente que os dados identificatórios só podem ser utilizados para fins eleitorais. Não se pode, assim, fornecer dados a órgão privados como uma Seresa, fundada no início para atender as instituições bancárias e por meio de uma base de dados. Com efeito, dados da base do Serasa são voltados a interesses negociais.

A decisão da corregedoria do Tribunal Superior Eleitoral no sentido de colocar dados e ensejar certificações por um órgão privado tipo Serasa é flagrantemente inconstitucional. Viola o direito à privacidade e não se sustenta pela inexistência de correlação com matéria eleitoral e de cidadania. E tem mais: se a Justiça eleitoral precisar de dados do Serasa basta requisitar e estabelecer prazo para atendimento.

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