Política

Secretaria de Saúde Indígena tem suspeita de fraude em licitação

Termo de referência de concorrência para contratar helicóptero já circula no setor privado antes mesmo de sair edital

Secretaria de Saúde Indígena tem suspeita de fraude em licitação
Secretaria de Saúde Indígena tem suspeita de fraude em licitação
Foto: Karina Zambrana - ASCOM/MS
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A Polícia Federal (PF) requereu em 2019 à Secretaria de Saúde Indígena (Sesai), repartição do Ministério da Saúde, a cópia de cerca de 15 contratos, em uma investigação sobre desvio de verbas destinadas a pagar aeronaves que ajudassem a prestar assistência médica em comunidades indígenas isoladas. Será que uma licitação milionária preparada pela secretaria merecerá atenção policial?

O objetivo dessa licitação é contratar transporte aéreo (helicóptero, basicamente) para Distritos Sanitários Especiais Indígenas. Os chamados Dseis, cerca de 30, formam uma espécie de SUS especial dos povos tradicionais. O costume é cada um realizar sua licitação. O que a Sesai elabora é uma compra unificada para eles. Coisa de uns 400 milhões de reais.

O edital ainda não foi publicado. A papelada está na comissão de licitação do Ministério da Saúde, segundo CartaCapital apurou. Estranhamente, no entanto, ao menos desde dezembro circula no setor privado o “termo de referência” da licitação.

Esse tipo “termo” detalha o que o órgão público quer adquirir e em quê condições. O normal é ficar disponível para os fornecedores interessados somente depois de o edital ser publicado – o edital é genérico, serve como um aviso à praça de que uma compra estatal vem aí. A reportagem obteve uma cópia do termo. Ele possui o brasão da República, a identificação do Ministério da Saúde e da Sesai. São 40 páginas, com 29 itens e três anexos (A, B e C).

De acordo com o item 1, intitulado “Do objeto”, a licitação é de “contratação de horas voo com frações de minutos de aeronaves (de asa rotativa ou fixas), incluída logística de abastecimento e manutenção, conforme especificações contidas neste Termo de Referência, para emprego em missões de caráter de apoio à saúde indígena e transporte de cargas; cargas perigosas; transporte de equipamentos, materiais, pessoal, ações supletivas e outras atribuições da Sesai e Distritos Sanitários Especiais com pagamento mensal por hora de voo executada”.

Pelo item 26, intitulado “Da Vigência do Contrato”, “o prazo de vigência do contrato é de 12 (doze) meses, podendo ser prorrogado por interesse das partes até o limite de 60 (sessenta) meses”.

O anexo C lista os 16 Dsei’s para os quais o serviço de transporte seria prestado: Altamira, Alto Rio Negro, Guamá-Tocantins, Alto Rio Purus, Alto Rio Solimões, Amapá e Norte do Pará, Araguaia, Kaiapó do Mato Grosso, Kaiapó do Pará, Leste de Roraima, Médio Rio Purus, Médio Rio Solimões, Parintins, Rio Tapajós, Vale do Jari e Yanomami.

O “termo” chegou às mãos de algumas fornecedores que provavelmente participarão da licitação. É uma situação que parece caracterizar favorecimento.

A licitação estaria sendo preparada na Sesai por dois funcionários cedidos ao Ministério da Saúde por um convênio com a Organização Pan-Americana de Saúde (Opas). Um é Dorival Kioshi Otabe e o outro, Lucas Divino Queiroz. Seriam eles, juntos ou individualmente, que teriam distribuído cópias do termo a certas empresas.

A reportagem procurou a Secretaria, através da assessoria de imprensa do Ministério da Saúde, no dia 14 de janeiro, em busca de esclarecimentos sobre a licitação e o vazamento do termo. Até a segunda-feira 20, o órgão não havia se manifestado, apesar de a assessoria ter dito anteriormente que responderia.

A Sesai é comandada desde abril de 2019 por uma militar indígena e evangélica, Silvia Nobre Waiãpi, bem relacionada com a primeira-dama, Michelle Bolsonaro, e com a ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves. Silvia tinha feito parte da equipe de transição do governo Michel Temer para o de Jair Bolsonaro, no fim de 2018. O orçamento da sua secretaria em 2020 é de 1,3 bilhão de reais.

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