Política

Salvo, Temer tende a voltar a ser “decorativo” e ameaçado

Enterro de “flechada” indica perda da maioria na Câmara, sustentáculo do governo sem rua. Caso Geddel é risco

Maia e Temer: do CEO e o decorativo?
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O peemedebista Michel Temer escapou pela segunda vez de ir a julgamento na Justiça, mas até o fim do mandato tem tudo para voltar a ser “decorativo”, como queixava-se de ser tratado por Dilma Rousseff. No caso, “decorativo” em relação a Rodrigo Maia (DEM-RJ), o comandante da Câmara que chegou a lançá-lo à reeleição em 2016 e agora quer distância do presidente mais impopular do mundo, a quem vê como morto político.

Ameaçado de perder serventia ao dito “mercado”, por não ser capaz de seguir com suas indigestas reformas, Temer poderá balançar outra vez no cargo, a depender dos desdobramentos do caso Geddel Vieira Lima, seu ex-ministro dono do espantoso bunker de 51 milhões de reais na Bahia. É o que pensa Maia, codinome “Botafogo” na lista de trambicagens da Odebrecht.

Em conversas reservadas com deputados próximos, Maia comentava que o enterro da segunda “flechada” em Temer, a acusação dos crimes de organização criminosa e obstrução da Justiça, seria a última cota de sacrifício da Câmara para com o presidente.

Depois disso, os deputados fugiriam do governo, de olho na campanha de daqui um ano. Tudo o que eles pensam, falam e fazem hoje é para se reeleger, tarefa complicada caso esteja atrelada à imagem de um governo com aprovação de míseros 3%. Nos Estados Unidos, um presidente desse tipo, impopular e sem perspectivas de ajudar numa eleição, é chamado de “pato manco”.

O Palácio do Planalto, avalia Maia, não terá mais votos daqui em diante para aprovar sua agenda impopular, medidas que jogam contra a reeleição dos deputados. Exemplos: a reforma das aposentadorias e mudanças na Previdência dos servidores públicos.

Gente no PSDB, partido controlador de quatro ministérios, inclusive o da articulação política, mas que deu mais votos contra Temer (23) do que a favor (20), compartilha da tese de “Botafogo”.

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“O governo foi abalado na delação da JBS e não se recuperou mais. Não tem mais como levar adiante uma agenda reformista. A votação de hoje vai mostrar que o governo perdeu a maioria que tinha”, dizia o secretário-geral do PSDB, o deputado Silvio Torres (SP).

Na mosca. Naquela quarta-feira, o presidente teve 251 votos por sua blindagem contra um julgamento agora (será processado quando deixar o poder). Um número superior ao de seus adversários (233), mas menos do que seria a maioria absoluta da Câmara (257).

Sem serventia ao “mercado” fiador de sua salvação nas duas “flechadas”, Temer estará politicamente frágil se, por exemplo, o homem do milionário bunker baiano perder a cabeça. Da cadeia onde está preso desde 8 de setembro, Geddel já cansou de mandar recado de que não aguentará muito tempo.

Da Procuradoria-Geral da República (PGR), acaba de emanar um sinal dúbio para o Palácio do Planalto. Ao opinar perante o Supremo Tribunal Federal (STF) para o ex-ministro continuar preso, Raquel Dodge classificou-o de “chefe de organização criminosa”. Se a PGR acha isso, Geddel não poderá fazer delação, proibida a capi.

Ou então “Boca de Jacaré”, apelido dado a Geddel pelo criminoso doleiro delator Lucio Funaro devido à gula financeira, terá de entregar algo bem concreto contra alguém que possa ser taxado de chefe em seu lugar. Humm, quem?

Renan Calheiros (PMDB-AL), o megaprocessado senador, deu irônica pista via Twitter: “Engraçado… Nunca soube que Geddel era o chefe. Para mim, o chefe dele era outro”. E completou, em seguida “…era ouTro”. Assim mesmo, com o “T”, de Temer, destacado.

“Esse é um governo que não tem apoio das ruas, sustenta-se no parlamento. Se perder o apoio dos deputados, ficará em situação complicada. Podemos ter grande turbulência nos próximos meses”, diz o deputado Vicente Cândido (PT-SP). “O governo acabou”, opina Alessandro Molon (Rede-RJ).

Por tudo isso, não surpreende que Rogério Rosso (PSD-DF), um dos vice-líderes de Temer Câmara, a quem caberia defender o chefe, venha dizendo que é hora de Rodrigo Maia ser o CEO do Brasil, o executivo que bota a mão na massa no dia a dia de uma empresa, e de Temer tornar-se uma espécie de presidente do Conselho de Administração, uma figura mais distante de negócios diários.

Uma forma elegante de propor que Temer volte a ser “decorativo”.

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