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A religião invade a disputa presidencial, ofusca os problemas reais e ameaça o Estado laico

Bolsonaro, ao lado de Tarcísio Freitas, tenta se reaproximar dos eleitores católicos, negligenciados por sua campanha. Contra as fake news, Lula até beija a santa - Imagem: Nelson Almeida/AFP e Caio Guatelli/AFP

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A Paróquia São João Batista, no município paulista de Jacareí, jamais esquecerá a missa das 9 da manhã do domingo 16. Após cometer o “sacrilégio” de citar a vereadora assassinada Marielle Franco durante a homilia, o padre Éverton foi interrompido aos gritos: “O senhor não vai falar de uma homossexual envolvida com o tráfico de drogas dentro da casa de Deus”, berrou uma fiel. Dois dias antes, na Igreja Nossa Senhora do Carmo, no município paranaense de Fazenda Rio Grande, foi a vez de o padre Édson ser censurado em plena missa ao afirmar que o Altíssimo não defende a corrida armamentista. “O senhor está pedindo voto para Lula? Quer dizer que o Deus da vida é a favor do aborto?”, desafiou uma senhora. Relatos semelhantes acumulam-se na mídia e nas redes sociais.

A inédita agressividade entre os católicos confirma que a “guerra santa” promovida pelo bolsonarismo na campanha eleitoral, antes limitada aos evangélicos, espalhou-se como as pragas do Egito por outras religiões e sequestrou o debate nacional. Pela primeira vez desde o fim da ditadura e da retomada do direito ao voto livre no Brasil, oficialmente um país laico, a Bíblia tomou o lugar da Constituição. Fome, desemprego, inflação, miséria, educação, saúde, temas que afligem a vida da maioria, acabaram relegados ao segundo plano, enquanto os candidatos optam ou são obrigados pela dinâmica da disputa a paparicar pastores e padres e a gastar tempo para negar a intenção de fechar templos, perseguir fiéis, liberar o aborto ou instituir banheiros unissex, como se vivêssemos não no século XXI, mas no auge das disputas sangrentas entre católicos e protestantes que marcaram a Europa no perío­do da Contrarreforma, no século XVI.

“O bolsonarismo faz uso inescrupuloso e antiético da fé para construir um projeto de poder autoritário e violento”, acusa o pastor Henrique Vieira

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1 comentário

PAULO SERGIO CORDEIRO SANTOS 25 de outubro de 2022 16h07
Eles querem vencer no grito porque estão desesperados com a iminente derrota nas urnas de Bolsonaro. A guerra santa perpetrada por eles não têm limites, pois desafiam e xingam os bispos católicos que criticam veladamente pelo ódio e através da violência , agridem jornalistas. Ninguém tem nem o direito de usar uma peça de cor vermelha. Numa espécie de daltonismo ideológico parecem touros numa tourada imaginária em que uma simples camiseta vermelha soa como um insulto e provocação. Os lugares sagrados do catolicismo e do cristianismo viraram mesmo púlpitos políticos e partidários do bolsonarismo. O fanatismo religioso e político é a estratégia desses entes ensandecidos. Eles se dizem seguidores do cristianismo, mas parece que não entenderam nada, pois se não respeitam nem imagens, representantes religiosos e os lugares sagrados, muito menos os seus semelhantes que estão na essência do próprio cristianismo. Na verdade são hipócritas, néscios e desequilibrados. O Brasil através do retorno de Lula vai ter muito trabalho com essa gente que se sentiu autorizada pelo seu chefe e líder Bolsonaro a ofender aqueles que pedem respeito pelas coisas democráticas e vandalizar bens e imagens religiosas para imporem sua fé política a fórceps.

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