Política

Jones Manoel: “Quero socializar o conhecimento sobre nomes fundamentais do pensamento crítico e da luta popular”

O historiador estreia coluna em vídeo no canal de CartaCapital no Youtbe nesta quarta-feira 05 às 18h

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O historiador e youtuber Jones Manoel estreia, nesta quarta-feira 05 às 18h, a coluna “Manual do Jones” no canal de CartaCapital?feature=oembed" frameborder="0" allowfullscreen> no Youtube. Nascido e criado na Favela da Borborema, em Recife, Jones ganhou fama na internet ao falar sobre marxismo e educação popular.

A sua militância começou cedo, quando Jones tinha 14 anos e trabalhava vendendo jornal no semáforo de sua cidade.

“Comecei meu processo de politização a partir do rap com Racionais MCs, Facção Central, GOG, Tupac Shakur, etc”, conta.

Em 2011, com 23 anos de idade, ele começou a cursar história na Universidade Federal de Pernambuco ao mesmo tempo que iniciou sua militância no Partido Comunista Brasileiro (PCB), sigla que ele faz parte até hoje.

“Hoje, continuo minha militância pelo PCB, busco atuar na popularização e divulgação do marxismo e do programa da Revolução Brasileira, mantenho as iniciativas do canal no youtube e outros meios de comunicação”, conta.

Em sua coluna quinzenal no Youtube de CartaCapital, Jones promete “cultivar a amplitude de conhecimentos”.

“Vou procurar atuar em dois sentidos: fazendo uma espécie de glossário com temas fundamentais do debate político, como vídeos explicando o que é liberalismo, imperialismo, fascismo, ideologia, soberania nacional e outros conceitos, sempre indicando bibliografia para se aprofundar; e ajudando a socializar o conhecimento sobre nomes fundamentais do pensamento crítico e da luta popular, com vídeos no estilo ‘quem foi…’ sobre figuras como Frantz Fanon, Vânia Bambirra, Ana Montenegro, Minervino de Oliveira, Thomas Sankara, Ruy Mauro Marini, Domenico Losurdo e outros, sempre indicando também livros para conhecer melhor o pensamento desses autores e autoras.”, conta.

Confira a entrevista completa:

CartaCapital: Como foi que você começou sua militância? 

Jones Manoel: Bem, eu sou Jones Manoel, filho de Dona Elza e Luis Manoel, nascido e criado na Favela da Borborema em Recife. Filho de uma mulher negra que começou a trabalhar com 8 anos de idade e, aos 15, migrou para Recife para trabalhar como empregada doméstica. Meu pai, quando eu tinha 11 anos, foi assassinado, e como a maioria dos casos de homicídio, foi um crime nunca solucionado no qual ninguém foi punido. Cresci com minha mãe e irmã mais velha, Juliana. Comecei a trabalhar muito cedo, vendendo jornal no sinal de trânsito aos 14 anos para ajudar em casa. Passei toda a adolescência sem ter adolescência, trabalhando e estudando. Comecei meu processo de politização a partir do rap com Racionais MCs, Facção Central, GOG, Tupac Shakur, etc.

Com 20 anos, a partir de um amigo, conheci o marxismo e passei a conseguir acesso a literaturas de esquerda. Aos 21 anos já me considerava comunista. Minhas duas primeiras experiências de militância foram pleitear o cargo de presidente da associação de moradores da minha comunidade, mas diante de ameaças e intimidações tive que desistir. Em seguida, montei junto com meu amigo Júlio César um cursinho popular chamado Novo Caminho, mantido por dois anos, e que ajudou mais de 20 jovens da Borborema e região a acessar instituições de ensino públicas. Eu, Júlia e Filipe fomos os primeiros jovens da história da Borborema a entrar numa universidade pública.

Entrei no curso de história da UFPE em 2011, comecei a militar na União da Juventude Comunista, a juventude do PCB, em 2013, e me mantive nos anos seguintes como estudante e militante do movimento estudantil. Depois da graduação fiz um mestrado em Serviço Social, também na UFPE, e nesse período passei a focar minha militância em comunicação e educação popular. Mantive por anos um blog de relativo sucesso (mais de 300 mil acessos) e depois passei a trabalhar com um canal no youtube e com podcasts, a escrever para vários meios (Revista Opera, Lavrapalavra, blog da Boitempo, site do PCB) e para iniciativas variadas de educação popular. Também atuei no movimento sindical e fui, por um curto período de tempo, professor de uma escola pública militar do estado da Bahia.

Hoje, continuo minha militância pelo PCB, busco atuar na popularização e divulgação do marxismo e do programa da Revolução Brasileira, mantenho as iniciativas do canal no youtube, participo do Revolushow, o maior podcast marxista do Brasil, dirijo junto com o Gabriel Landi a coleção Quebrando as Correntes (publicada pela Autonomia Literária), sou professor do curso “Domenico Losurdo e Frantz Fanon: uma introdução ao marxismo anticolonial” na plataforma Classe Esquerda, e antes da pandemia vinha andando o Brasil, participando de debates e atividades.

CC: Quais temas serão tratados em sua coluna quinzenal?

JM:  Eu sou um historiador que procura cultivar a amplitude de conhecimentos. Estudo e debato temas da sociologia, teoria política, geopolítica, direito, economia, filosofia, etc. Vou procurar atuar em dois sentidos: fazendo uma espécie de glossário com temas fundamentais do debate político, como vídeos explicando o que é liberalismo, imperialismo, fascismo, ideologia, soberania nacional e outros conceitos, sempre indicando bibliografia para se aprofundar; e ajudando a socializar o conhecimento sobre nomes fundamentais do pensamento crítico e da luta popular, com vídeos no estilo “quem foi…” sobre figuras como Frantz Fanon, Vânia Bambirra, Ana Montenegro, Minervino de Oliveira, Thomas Sankara, Ruy Mauro Marini, Domenico Losurdo e outros, sempre indicando também livros para conhecer melhor o pensamento desses autores e autoras.

CC: Na sua visão, qual a importância deste espaço dentro da Carta?

JM: Um dos grandes problemas do Brasil hoje é o baixo nível do debate político. A produção científica está muito fechada nos muros da universidade e o debate político na esfera institucional é pobre, superficial, marqueteiro e sem qualquer profundidade histórica e teórica. É cada vez mais urgente atuar a partir da pedagogia política, fazer política socializando conhecimento, popularizando uma visão científica de mundo, fazendo da teoria crítica o senso comum do povo trabalhador. Espaços como esse na CartaCapital ajudam nessa difícil tarefa de politizar a esfera pública e socializar conhecimentos críticos com intenção de transformação da realidade.

CC: Quais são suas expectativas?

JM: As melhores possíveis. O público da CartaCapital já está acostumado com uma visão tendencialmente crítica e democrática de mundo. Dialogar com esse público, e quebrar os vários mitos que existem sobre a visão comunista e radical da política, será algo fundamental. Aliás, como bem disse a socióloga e também comunicadora Sabrina Fernandes, é preciso “normalizar a radicalidade [política]”. Normalizar a radicalidade e popularizar o marxismo. Essas são as minhas expectativas.

CC: Qual sua análise da esquerda brasileira? Acha que a oposição está fazendo um bom trabalho ao governo de Jair Bolsonaro?

JM: Bem, essa é a pior oposição da história brasileira. É uma oposição que não consegue oferecer uma alternativa real e radical a ofensiva burguesa hoje coordenada pelo bolsonarismo. Desde o segundo Governo Dilma, quando ela colocou o Joaquim Levy no Ministério da Fazenda, teve início um ajuste fiscal antipopular que sob Michel Temer e Bolsonaro/Guedes só se radicalizou, isso sem falar no fortalecimento do Estado penal e policial. A oposição fica presa entre brigas palacianas e mesquinhas, como a disputa entre Lula e Ciro Gomes, buscando alianças com apoiadores da política econômica de Paulo Guedes como Rodrigo Maia, FHC, PSDB etc., e comemorando coisas sem importância político-estratégica, como “vitória” em Reality show da Globo ou debatendo política a partir das músicas de Beyonce.

Os grandes temas da política como a soberania nacional, a privatização das riquezas naturais, o desmonte das estatais, a questão militar, o crescimento assustador da pobreza, da miséria, da fome e do desemprego, o avanço do latifúndio e da mineração, o endurecimento do Estado penal, o combate ao racismo e machismo estruturais… Esses temas ficam de fora. É uma oposição perdida, fiel a um sistema político falido e sem respaldo popular, e que insiste em um discurso improdutivo de “defesa da democracia”. Segundo dados do IBGE de 2019, 14 milhões de famílias voltaram a cozinhar com lenha ou carvão porque não tem dinheiro para comprar o gás de cozinha. Alguém acha de verdade que esses milhões de brasileiros, as vítimas preferenciais da violência policial, vão se mobilizar por abstrações como “democracia” e “estado de direito”? Isso é um descolamento assustador da realidade.

Enquanto não tivermos uma oposição conectada com a realidade material da nossa classe, que coloque os debates em termos estruturais e críticos, que consiga ser organizadora de uma vontade nacional-popular no sentido da Revolução Brasileira, vamos continuar sendo derrotados. É incrível, por exemplo, como mesmo após tudo o que vimos nos últimos 5 anos, especialmente agora no Governo Bolsonaro, a maioria da esquerda brasileira ainda resiste em falar e debater o imperialismo e uma visão radical, antiburguesa, de soberania nacional e defesa dos nossos recursos naturais. Esse discurso democrático, legalista, moderado, como o de políticos como Fernando Haddad, nunca derrotou, em canto nenhum do mundo, uma ofensiva da extrema-direita. No Brasil não será diferente.

CC: Qual Brasil você sonha para o futuro?

JM: Um Brasil organicamente ligado aos seus vizinhos latino-americanos na construção da Pátria Grande Socialista. Um Brasil sem fome, miséria, pobreza, desemprego, violência. Um Brasil com saúde, educação, cultura, lazer, transporte, segurança e todos os direitos fundamentais da dignidade humana garantidos para todos/as. Em suma, um Brasil que tire essa elite, ou burguesia, do poder, e que consiga sua segunda e real independência se libertando do domínio do imperialismo estadunidense. Um Brasil dono do seu destino, com o povo trabalhador comandando esse país. Em poucas palavras: o Brasil que vai nascer depois da nossa Revolução Brasileira.

Fidel Castro dizia numa famosa frase que “hoje milhões de crianças vão dormir nas ruas. Nenhuma delas é cubana”. No dia em que pudermos acrescentar, como disse o grande Theotônio dos Santos, que nenhuma dessas crianças que dormem na rua é brasileira, teremos um sintoma de que esse país começou a ser um lugar digno. É para isso que eu luto. Luta que remete à Revolta de Malês, ao Quilombo dos Palmares, ao Contestado, a Canudos, à Coluna Prestes, ao Levante antifascista de 1935, à Revolta do Quebra Milho, às Ligas Camponesas, a Trombas e Formoso e a muitos outros episódios do esforço secular do nosso povo trabalhador para ser livre e acabar com o domínio dessa burguesia que tem como única função explorar os trabalhadores e o país.

Acho que para terminar, é importante dizer que, como militante e historiador, uma das minhas áreas de luta política é divulgar e valorizar a história revolucionária dos povos. Como disse, dirijo junto com o Gabriel Landi a coleção Quebrando as Correntes. Já lançamos o primeiro livro, “Revolução Africana: uma antologia do pensamento marxista” (2019), em cujo lançamento inclusive dei uma entrevista aqui para a Carta Capital, e agora vamos lançar o II volume da coleção. O livro, que começa a ser vendido agora no final de Agosto, tem como título “Raça, classe e revolução – a luta pelo poder popular nos Estados Unidos”, e traz artigos, discursos e reflexões de lideranças históricas da luta antirracista revolucionária nos Estados Unidos. O livro contempla materiais dos Panteras Negras, dos Jovens Lordes, dos Boinas Marrons, do Poder amarelo, de povos indígenas, etc. Busca mostrar toda a força política e potência revolucionária dos negros, latinos, indígenas e descendentes de asiáticos quando combinaram a luta antirracista com o projeto socialista. Material profundamente atual, no Brasil ou nos Estados Unidos, dada a importância cada vez maior da questão racial na luta política.

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