Política

Quem é o general Etchegoyen, que acusa Lula de ‘covardia’ com militares

No centro da polêmica está a admissão, por parte do petista, da perda de confiança em uma parcela das Forças Armadas, após os atos golpistas no DF

O ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional Sérgio Etchegoyen. Foto: Antonio Cruz/Agência Brasil
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O general da reserva do Exército Sérgio Etchegoyen classificou como “profunda covardia” a decisão do presidente Lula (PT) de admitir ter perdido a confiança em uma parcela das Forças Armadas, após os atos golpistas de 8 de janeiro.

“Ele sabe desde já que nenhum general vai convocar uma coletiva para responder à ofensa”, alegou o militar, na última quarta-feira 18, em entrevista à TV Pampa. “Então, isso é um ato de profunda covardia, porque ele sabe que ninguém vai responder.”

É relevante contextualizar a declaração de Lula. A afirmação sobre fardados ocorreu quatro dias depois das ações de terrorismo em Brasília, durante um café da manhã com jornalistas, no qual CartaCapital esteve presente. Questionado sobre sentir-se ameaçado, Lula disse que “perdeu a confiança” em uma parcela dos militares da ativa e emendou: “Na hora em que eu recuperar a confiança, eu volto à normalidade”.

O presidente se reúne nesta sexta 20, em Brasília, com o ministro da Defesa, José Múcio, e os comandantes do Exército, Júlio Cesar de Arruda; da Marinha, Marcos Olsen; e da Aeronáutica, Marcelo Damasceno. Trata-se da primeira agenda após o petista criticar militares envolvidos na segurança do Palácio do Planalto pelos atos bolsonaristas deste mês.

Quem é o general a acusar Lula de “covardia”?

O gaúcho Sérgio Etchegoyen ingressou no Exército via Academia Militar das Agulhas Negras em 1971, oitavo ano da ditadura militar. Naquele momento, presidia o Brasil o general Emilio Garrastazu Médici e o País vivia a mais brutal fase do regime.

Etchegoyen chefiou a Escola de Aperfeiçoamento de Sargentos das Armas em Cruz Alta, sua cidade natal. No posto de general, comandou a 4ª Brigada de Cavalaria Mecanizada, de 2005 e 2006, em Dourados (MS); a Escola de Comando e Estado-Maior do Exército, de 2007 a 2009, no Rio de Janeiro; e a 3ª Divisão de Exército – Divisão Encouraçada, de 2011 a 2012, em Santa Maria (RS).

Também foi oficial do Estado-Maior da Missão de Verificação da Organização das Nações Unidas em El Salvador, entre 1991 e 1992, e chefe da Comissão do Exército Brasileiro em Washington, de 2001 a 2003.

O general ganhou espaço no debate público em 2014, após a divulgação do relatório de conclusões da Comissão Nacional da Verdade, a investigar episódios ocorridos na ditadura. Ele se manifestou ao ver o nome de seu pai, o general Leo Guedes Etchegoyen, morto em 2003, incluído na lista de 377 agentes do Estado considerados responsáveis por violações de direitos humanos no regime militar.

Etchegoyen assinou uma nota em 11 de dezembro de 2014 para repudiar o que considerava um relatório “leviano”.

O Memorial da Resistência de São Paulo, gerido pela Associação Pinacoteca Arte e Cultura, reúne diversas informações sobre a biografia do pai de Sérgio Etchegoyen. General de Brigada, Leo Guedes foi:

  • secretário de Estado de Segurança Pública do Rio Grande do Sul, de novembro de 1964 a fevereiro de 1965;
  • assessor de Médici e chefe do Estado-Maior do II Exército, de agosto de 1979 a julho de 1981;
  • chefe do Estado-Maior do III Exército, em agosto de 1982.

Seu nome consta no relatório da CNV como militar responsável por violações de direitos humanos durante a ditadura, o que gerou processos da família contra a União.

Em 2020, a 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por quatro votos a um, manter uma sentença de primeira instância que rejeitou um pedido da família Etchegoyen para retirar o nome do general Leo Guedes da lista elaborada pela Comissão.

Prevaleceu no TRF-4 o voto da relatora da apelação, a desembargadora federal Vivian Josete Pantaleão Caminha. Segundo ela, “os fatos históricos passados durante o regime militar, antes sigilosos, devem ser revelados a quem viveu aquele período de nossa história e às novas gerações, concordem os envolvidos ou não, sendo o relatório da Comissão da Verdade apenas um destes instrumentos”.

Também está no relatório da CNV um tio de Sérgio, Cyro Guedes Etchegoyen, coronel do Exército. Eis uma das menções a ele no relatório: “Chefe da seção de contrainformações do Centro de Informações do Exército (CIE) de 1971 a 1974. Segundo depoimento do coronel Paulo Malhães à CNV, Etchegoyen era a autoridade do CIE responsável pela Casa da Morte, em Petrópolis (RJ)”.

A história da família na política é mais antiga, no entanto, e remete até ao avô de Sérgio, Alcides Gonçalves Etchegoyen, como atesta o Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil da FGV.

Ele compôs o movimento que derrubou Washington Luís, barrou a posse de Júlio Prestes e conduziu Getúlio Vargas à Presidência em 1930. Em 1954, após ocupar uma série de cargos no governo, assinou um manifestou a exigir a renúncia do presidente. Um ano depois, parte das Forças Armadas – Alcides incluso – levou a cabo uma tentativa fracassada de impedir a posse do presidente e do vice-presidente eleitos, Juscelino Kubitschek e João Goulart. O movimento golpista foi frustrado pelo contra-ataque do ministro da Guerra, o marechal Henrique Teixeira Lott.

Os atos finais de Sérgio Etchegoyen

O nome do general voltou a ganhar repercussão após a derrubada de Dilma Rousseff da Presidência, em 2016, ao ser nomeado por Michel Temer para o cargo de ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional.

Cabe lembrar que o GSI havia perdido o status de ministério no âmbito de uma reforma promovida por Dilma em 2015. A Agência Brasileira de Inteligência ficou brevemente, então, sob o guarda-chuva da Secretaria de Governo da Presidência, à época chefiada por Ricardo Berzoini.

Recriado após o golpe, o GSI absorveu mais uma vez a Abin e esteve intimamente ligado às ameaças de Jair Bolsonaro (PL) à democracia, durante a gestão do general Augusto Heleno.

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