Política

Presidente do DEM no Acre é suspeito de laranjismo eleitoral

Apoiador de Bolsonaro ‘doa a quem doer’, Alan Rick teria se favorecido de candidata que teve seis votos

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Jair Bolsonaro assistiu a um coral de jovens do Acre em 20 de agosto, no Palácio do Planalto. Havia na plateia um deputado federal acreano, Alan Rick, que adora o presidente e até conseguiu depois uma foto com ele – outra, aliás; seu Facebook tem várias. Em seu estado, Rick, de 42 anos, dirige o DEM, partido do chefe da Casa Civil do governo, Onix Lorenzoni, de quem é amigo.

Certos fatos da eleição de 2018 indicam que Rick, um evangélico frequentador do Planalto que diz estar com Bolsonaro “doa a quem doer”, tem afinidade com um outro ministro. Mas aí por razões diferentes de partido e amizade.

É um aparente laranjismo com verba destinada a mulheres no fundo eleitoral que o aproxima do ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antonio. Uma prática que em tese significa os crimes de desvio de recursos públicos, falsidade ideológica e uso de documento falso.

A policial militar Sonia de Fátima Silva Alves, de 44 anos, nasceu em Belém do Pará e em 2018 concorreu a deputada estadual no Acre, pelo DEM. Sua candidatura parece ter nascido às pressas. Foi registrada na Justiça Eleitoral em 25 de agosto de 2018, dez dias após encerrado o prazo, para preencher uma vaga remanescente a que o DEM tinha direito.

Sonia recebeu 240 mil reais da direção nacional do partido para sua campanha. Pela lei, as legendas precisam direcionar a candidatas mulheres 30% da verba do fundo público eleitoral. Ao todo, a policial arrecadou 280 mil, sendo 39 mil declarados ao TSE como tendo saídos da campanha de Rick.

As despesas de Sonia informadas ao tribunal somaram 240 mil. Ela contratou 46 pessoas como militantes de campanha, por um total de 182 mil. Gastou 49 mil com o aluguel de 16 carros. Mais 10 mil com a criação de publicidade gráfica. E 4 mil com assessoria de comunicação. E apesar dessa estrutura, obteve 6 (seis) votos. Nem seus militantes pagos votaram nela.

No DEM, há quem diga que Sonia foi usada por Rick como laranja para financiar homens com grana que deveria ir para mulheres, daí o registro meio às pressas da candidatura. Os homens seriam o próprio Rick e um concorrente a deputado estadual que fez dobradinha com ele, Nésio Mendes, do PSDB. Mendes era competidor de Sonia, apesar de seus partidos estarem aliados.

Fala-se mais no DEM: que o aparente laranjismo teve a ciência do presidente demista, Antonio Carlos Magalhães Neto, prefeito de Salvador. A aposta de 240 mil em Sonia não teria sido feita pela direção nacional sem negociação com Rick, o chefe do DEM no Acre. Detalhe: a mulher de Rick, Michele de Araújo Miranda, é a tesoureira estadual da sigla.

Há pistas de união das campanhas de Rick e Sonia. Contrataram a mesma pessoa (Jacob Gomes de Almeida Junior), e por valor igual (10 mil reais), para criar peças publicitárias gráficas. Usaram a mesma contadora (Juliana Fernandes do Nascimento), e por pelo valor igual (300 reais). Tiveram o mesmo fornecedor de adesivos e cartazes, S. Cardoso Silva (Rick gastou 343 mil, Sonia 4 mil). Houve ainda 39 mil reais dados por Rick a Sonia, para gasolina e diesel.

Outra pista é um certo aluguel de carro por Sonia. A policial gastou 6 mil reais com a locação de um automóvel Strada, placa NAA-2082. O dono? Nésio Mendes. O tucano disputou a eleição em parceria com Rick. É comum que um candidato a deputado federal e outro a estadual se juntem e um peça voto para o outro. Há imagens eleitorais a mostrar a dupla lado a lado na eleição.

Mendes fez uma campanha bem mais modesta do que Sonia. Arrecadou 5,6 mil reais, dos quais 5 mil dados pelo senador Marcio Bittar, que concorria pelo MDB. E, apesar disso, saiu-se 122 vezes melhor do que a policial: conseguiu 737 votos, o que também não bastou. Quem se elegeu deputado estadual no Acre com menos votos teve 3,3 mil.

Se a candidatura de Sonia foi laranja de Rick, há aí, em tese, três crimes previstos no Código Eleitoral. O laranjismo com dinheiro que deveria ir para mulheres foi examinado pelo ex-juiz do TSE Henrique Neves em um artigo de março. Segundo Neves, se o destino final da grana do fundo não era mulher, mas homem, cabe falar em desvio de recursos públicos por parte de quem se beneficiou. Se a candidatura era de mentira, houve crime de falsidade ideológica por parte do inventor da candidatura e de uso de documentos falsos por parte de quem registrou a candidatura.

A versão de Alan Rick

Questionado por CartaCapital, o deputado Alan Rick negou, via assessoria de imprensa, ter participado da decisão da direção nacional do DEM de enviar 240 mil reais do fundo eleitoral para Sonia. “O deputado participou apenas das definições referentes a parte do recurso usado em sua campanha”, disse sua assessoria.

Também negou ter participado da construção e do lançamento da candidatura de Sonia. “Recebeu a presidência do partido em agosto de 2018, véspera da eleição, com tempo exíguo para organização partidária e não participou do processo de montagem de chapa eleitoral”, afirmou sua assessoria.

Não é verdade que Rick assumiu o comando do DEM no Acre em agosto de 2018. Ele foi oficializado no cargo em março de 2018, durante reunião da cúpula nacional demista em Brasília. Confrontada com esse fato, a assessoria de Rick disse ter cometido um erro.

Rick também negou, via assessores, ter participado de decisões da campanha de Sonia: “O deputado responde somente por sua prestação de contas”. E negou saber do aluguel do carro de Nésio Mendes pela policial: “O deputado não tem qualquer participação no uso do fundo dos candidatos a deputado estadual”.

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