Política

Plebiscito e eleições

O governo interino, ilegítimo, age como se tivesse um amplo mandato para implementar um programa que não foi aceito pelos eleitores

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O Brasil vive, desde fevereiro de 2015, uma grave crise política causada por um impasse completo entre o Executivo e o Legislativo. Esse impasse tem diversas origens, e a principal delas reside no instrumento que permite coligação nas eleições proporcionais, o que, aliado ao financiamento privado e ilegal de campanha, gerou um Congresso completamente incompatível com o programa da presidente eleita.

Desde a eleição de Eduardo Cunha para a presidência da Câmara dos Deputados, a Casa barrou as principais iniciativas da presidente e, no último dia 17 de abril, aprovou o seu impeachment, apesar da inexistência de qualquer base legal para tal decisão. Algumas semanas depois, o afastamento provisório da presidente foi chancelado pelo Senado.

Quem teve quaisquer dúvidas sobre Michel Temer não ser capaz de gerar uma solução adequada para o impasse se convenceu disso nas últimas semanas. Temer nomeou um ministério pífio, cujo único elemento comum é comungarem da cruzada anti-direitos em curso no País.

A maior parte dos membros do ministério, devido à sua forte origem congressual, está completamente envolvida em financiamento ilegal de campanha e corrupção. Além disso, o presidente interino se comporta como se tivesse um mandato para realizar uma completa inversão da agenda que foi aprovada pelo eleitor em 2014. Sua continuidade na Presidência irá macular profundamente a democracia brasileira. Portanto, torna-se necessário pensar nas alternativas.

Estivéssemos em um sistema parlamentarista ou semi-presidencialista, provavelmente o Congresso teria sido dissolvido e o governo também. Mas estamos em um regime presidencialista onde tal ato não possui guarida institucional. Resta, portanto, pensar quais são os institutos legais capazes de romper com os impasses entre Executivo e Congresso, já que este “recall congressual” que ocorreu em abril não tem legitimidade nenhuma e acentuará a crise do sistema político.

Uma volta da presidente tampouco lhe daria força para governar, devido à natureza congressual do impeachment e do forte conflito entre Executivo e Legislativo. Uma das soluções institucionais possíveis neste momento é a chamada de um plebiscito para a convocação de novas eleições.

O referendum e o plebiscito são institutos legais plenamente compatíveis com a democracia representativa e utilizados frequentemente pelos estados da costa leste dos Estados Unidos. Eles são invocados sempre que decisões importantes que dizem respeito à população não são adequadamente encaminhadas e processadas pelo sistema político, o que parece ser claramente o caso no Brasil hoje.  A crise brasileira aponta na direção de que a única repactuação possível é por meio da soberania popular, com o eleitor se manifestando e recompondo o sistema político com novas eleições para presidente.

O sistema institucional brasileiro oferece essa possibilidade fundada nos artigos 1ª e 14ª da Constituição. O artigo primeiro é o que fundamenta em princípios gerais a participação. No seu parágrafo único ele afirma: “Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”.

O artigo 14 elencou os termos do exercício direto da soberania instituindo o plebiscito, o referendum e a iniciativa popular de lei. Assim, podemos dizer que um plebiscito sobre a convocação de novas eleições se encaixa perfeitamente na intenção do legislador constituinte. Trata-se de um caso no qual o sistema político mostra total incapacidade de resolver o impasse no qual o País se encontra.

A solução congressual, além de ilegal, uma vez que não existe absolutamente evidência de que as pedaladas são suficientes para justificar o afastamento da presidente, não gerou nenhuma recuperação do sistema político. Além disso, temos o problema adicional de um governo sem legitimidade que age como se tivesse um amplíssimo mandato para implementar um programa que não foi corroborado pelos eleitores. Aí se encontra a origem do impasse brasileiro: não é possível nenhuma saída congressual para a crise. Portanto, resta apenas uma repactuação por meio da devolução da soberania ou seu titular, o eleitor.

Já está tramitando no Senado a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 28/2016, que prevê realização de um plebiscito nacional, no primeiro turno das eleições municipais de 2016, perguntando ao eleitor sobre a realização de novas eleições para presidente e vice-presidente da República. A proposta, feita pelo senador Walter Pinheiro (sem-partido-BA), recebeu o apoio de 32 senadores.

No plebiscito, o eleitor deverá responder “sim” ou “não” para a seguinte pergunta: Devem ser realizadas, de imediato, novas eleições para os cargos de presidente e vice-presidente da República?

A resposta sim no plebiscito pode ser o início do fim da crise política na qual o País se encontra mergulhado desde 2015. O governo interino aponta para o agravamento de todos os problemas relativos à Operação Lava Jato e uma “congressualização” da Presidência. Essa é a pior via possível, porque os problemas mais graves do sistema estão no próprio Congresso.

A única repactuação possível no Brasil hoje é aprovando a PEC de Walter Pinheiro e recompondo o poder Executivo. Ainda assim, restará a pergunta se o Brasil é governável com o atual Congresso ou se deve se pensar também na sua dissolução e na convocação de eleições gerais.

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