Política

Para especialista, Dirceu encara prisão como “herói” e Genoino, como “vítima”

Segundo o professor titular de Ética da USP Renato Janine Ribeiro, o deputado dá sinais de sofrimento, enquanto o ex-ministro parece disposto a reagir contra inimigos

O professor titular de Ética e Filosofia Política da USP Renato Janine Ribeiro
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O professor titular de Ética e Filosofia Política da USP Renato Janine Ribeiro observa caminhos diferentes para três dos réus condenados no processo do “mensalão” que começaram a cumprir pena no último fim de semana.

No caso de José Genoino, ex-presidente do PT condenado por corrupção ativa, a prisão desperta piedade e solidariedade humana em razão de sua debilidade física e da convicção, manifestada por nomes como Nelson Jobim e Jarbas Vasconcelos, de ser inocente.

Também condenado por corrupção, o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu, por sua vez, se prepara para reverter a condenação judicial pela via da luta política. Prova disso, segundo Janine Ribeiro, é que ele vai fazer mestrado, trabalhar e lutar para sair da prisão como “herói” no sentido literário. “Não é um elogio. O ‘herói’ não é aquele cujas ações são eticamente admiráveis, mas alguém que, na tradição clássica, enfrenta os obstáculos com o maior vigor e disposição possíveis para vencê-los.”

Já Henrique Pizzolato, o ex-diretor de marketing do Banco do Brasil condenado por corrupção, peculato e lavagem de dinheiro, tem a chance de obter um julgamento na Itália, para onde fugiu após ser condenado, sem pressão política. Segundo o professor, isso pode gerar um resultado que desacredite a decisão do Supremo Tribunal Federal.

“São acasos (a nacionalidade italiana de Pizzolato), personalidades diferentes (Genoino, que suportou a prisão política mas não suporta ser preso comum, e Dirceu, para quem nos dois casos a prisão é política), fatos da vida. A história não terminou”, escreveu o especialista em sua página pessoal do Facebook.

Em outra análise publicada na rede social, ele expandiu a análise sobre as trajetórias de Genoino e Dirceu. “Genoino realizou uma espetacular conversão pessoal ao se eleger deputado. Antes disso, tinha lutado com armas na mão contra a ditadura. Mas, no Parlamento, foi talvez o deputado que mais se empenhou em construir pontes com seus oponentes, em fazer da política o que ela deve ser: lugar do conflito, sim, mas com educação e sobretudo com a construção de acordos, que permitam que o País avance em vez de patinar em mútuas rejeições”.

“Suas duas prisões se contrapõem. Mesmo que considere a atual como uma prisão política, deve ser-lhe difícil aturar a campanha que prosperou contra ele. Parece padecer, muito, das ofensas contra sua honra. Provavelmente, é quem mais vive, no plano pessoal, o drama político”, escreveu.

“O ataque maciço a seu nome e reputação simboliza a destruição desse espaço de interlocução que a democracia deve ser. Qualquer história futura do nascimento da democracia brasileira, no período de 1985 a 2000, o colocará como um dos principais protagonistas.”

Para Janine Ribeiro, o ex-dirigente petista não merecia a pena aplicada contra ele  STF. “Pessoalmente, penso que, se teve culpa no caso, foi a de assinar um documento como presidente do partido. Isso acontece o tempo todo. Em qualquer cargo, você assina muito mais do que pode ler ou entender. Ele não merecia a pena que lhe deram, é inocente de qualquer acusação de corrupção, mas mesmo que merecesse, continua valendo tudo o que afirmei acima. Ele é o personagem trágico dessa história.”

Para o especialista, o caso do ex-ministro da Casa Civil é o contrário do de Genoino. “(Dirceu) Compreendeu a política como espaço de conflitos, por vezes implacáveis. Por isso mesmo, parece não sofrer tanto. Deve certamente sofrer, mas menos. Sua pele é mais curtida.”

Janine Ribeiro lembrou que, nas eleições do ano passado, Genoino foi hostilizado ao chegar à sua seção eleitoral, voltou para casa e somente mais tarde decidiu votar, a todo custo. Já Dirceu chegou à sua seção acompanhado de dezenas de militantes, “que não deixaram lugar para nenhuma gracinha de desafetos”. “Dirceu é, nessa história, o herói de um drama clássico: alguém que enfrenta as adversidades com seu esforço próprio, quase uma moral do trabalho. Para ele, as duas prisões que sofreu são políticas, uma infligida pela ditadura, outra pelos inimigos de política.”

O professor titular da USP ressalta que seus desafetos são inimigos, e não adversários. “Genoino sofre porque quem ele pensava que fosse adversário se revelou inimigo. Dirceu talvez sofra menos porque nunca acreditou que fossem outra coisa que não inimigos.”

No caso de Dirceu, afirma, não se tratará de uma conversão ou redenção, porque não se considera culpado, mas sim como alguém que agiu politicamente, como seus inimigos. “Ele perdeu, mas continuará lutando”.

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