Política

Para cientista político francês, esquerda ‘pós-PT’ se renovou durante eleições

‘Não é a esquerda do Lula e nem do Partido dos Trabalhadores’, aponta

Guilherme Boulos (PSOL), líder do MTST. Foto: Reprodução/Twitter
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O primeiro turno das eleições municipais brasileiras, há duas semanas, registrou um avanço dos tradicionais partidos de centro e centro-direita no Brasil e uma clara derrota da extrema-direita. Mas, para Olivier Dabène, professor de Ciências Políticas da Sciences Po de Paris e presidente do Observatório Político da América Latina e do Caribe, a votação é palco de uma renovação da esquerda.

“É uma esquerda pós-PT, não é a esquerda do Lula e nem do Partido dos Trabalhadores”, aponta. O maior exemplo desta “oxigenação” progressista, segundo o especialista, é o PSOL, que se destaca ao apresentar candidatos “com diferentes orientações sexuais, origens raciais e étnicas”, observa, em entrevista à RFI.

No domingo, candidatos da esquerda disputaram a prefeitura de cinco capitais brasileiras: Belém, com Edmilson Rodrigues (PSOL), São Paulo, com Guilherme Boulos (PSOL), Porto Alegre, com Manuela D’Ávila (PCdoB), Vitória, com João Coser (PT), e Recife, com Marília Arraes (PT). No entanto, a preferência dos eleitores por representantes progressistas depois de uma onda da extrema direita em 2018 é um fenômeno ainda inicial, avalia Dabène. Segundo ele, as consequências dessas mudanças não são esperadas para as próximas eleições presidenciais, mas “essa renovação pode, daqui a alguns anos, trazer candidaturas inéditas, certamente”, afirma o cientista político.

Segundo Dabène, é graças a essas novas lideranças progressistas que a questão do racismo no Brasil pôde ser abordada durante as eleições municipais, marcada pelo assassinato de João Alberto Freitas em um supermercado Carrefour em Porto Alegre. “Alguns partidos políticos, como o PSOL estão melhor posicionados do que outros para evocar a questão do racismo porque eles abrem um importante espaço a candidatos negros em suas listas eleitorais, o que não é o caso de muitas siglas. A classe política brasileira é, em geral, dominada por brancos. Em um país tão diverso, isso é muito surpreendente”, afirma.

Popularidade de Bolsonaro segue alta

Apesar de, segundo uma recente pesquisa do Ibope, a popularidade de Bolsonaro ter caído em 23 das 26 capitais brasileiras, o índice segue acima de 30% na maioria dos Estados. No entanto, para Dabène “está claro que não existe um movimento bolsonarista profundo no Brasil que possa ser medido nas urnas”.

O cientista político é cético sobre a ideia de que as eleições municipais possam representar um fracasso político para o presidente. “É preciso levar em consideração que há cerca de 5.600 municípios no Brasil e a derrota dos candidatos que Bolsonaro apoia são casos particulares. De todo o jeito, ele não tem um partido político através do qual possa defender candidaturas, então não é muito surpreendente vê-lo recuar desta forma”, avalia.

Dabène também não acredita na possibilidade de o fracasso no segundo turno do prefeito do Rio de Janeiro, Marcelo Crivella, afetar a imagem de Bolsonaro. “Sim, Crivella deve ter uma grande derrota nas urnas, mas quem vai sofrer as consequências é ele, que deixou o Rio de Janeiro em um estado lamentável”, diz.

O professor admite que essa taxa popularidade do presidente brasileiro, embora tenha diminuído, ainda é contraditória em relação ao mau gerenciamento da crise sanitária gerada pela Covid-19, que deixou mais de 172 mortos no país. “Isso pode ser explicado também pela assistência social aos setores mais pobres da população, que agradece Bolsonaro por esse gesto. Mas essa ajuda deve parar de ser concedida a partir do ano que vem”, salienta.

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