Política

O que significa a saída do PMDB do governo Dilma?

Decisão eleva as dificuldades de Dilma, mas cientistas políticos afirmam que não é possível concluir que o partido vá apoiar em peso o impeachment

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Por Jean-Philip Struck

Após meses de especulações, o diretório nacional do PMDB oficializou, durante uma reunião na tarde desta terça-feira 29, a saída do partido da base aliada do governo Dilma Rousseff, encerrando uma parceria de 12 anos com as administrações petistas.

Para a presidente, a saída representa mais um golpe nas tentativas de estabilizar a sua relação com o Congresso e frear o processo de impeachment. Já para o PMDB, levanta questões sobre como os membros da sigla vão agir nos próximos dias, à medida em que a sustentação do governo se esfarela e cresce a expectativa de que o vice-presidente Michel Temer possa assumir a Presidência.

Antes mesmo da reunião, diversas alas rebeldes do PMDB já vinham pressionando pelo rompimento. O golpe determinante ocorreu na semana passada, quando o diretório do Rio de Janeiro, que vinha sendo o principal bloco de sustentação de Dilma dentro do seu maior aliado, também decidiu apoiar a saída.

Nos último dias, Dilma iniciou tentativas de frear o processo de afastamento, como o oferecimento de cargos, mas prevaleceu a articulação da facção antigovernista, que contou com apoio explícito de Temer. Por fim, a opção pela saída se deu por aclamação apenas três minutos após o início da reunião, que foi conduzida por um dos vice-presidentes do PMDB, o senador Romero Jucá.

“Essa tendência pró-saída não era novidade. Ela mostrou que a ala governista do PMDB se tornou mesmo minoritária”, afirmou o cientista político Rafael Cortez, da Consultoria Tendências.

Oficialmente, o PMDB proibiu que qualquer membro da sigla continue no governo. Assim, peemedebistas que ocupam ministérios terão que deixar as pastas. Um acordo está sendo negociado para que isso ocorra até 12 de abril. Apenas Temer permanecerá no governo, por ter sido eleito para o cargo, e não nomeado.

A decisão da direção nacional do PMDB eleva as chances de o processo de impeachment da presidente Dilma prosperar, já que fortalece os rebeldes antigovernistas do PMDB, que agora podem convencer outros filiados a aderirem ao processo.

No Planalto, o temor é que, após a saída do PMDB, aconteça também uma debandada de outros partidos, como o PSD, PP e PR, diminuindo ainda mais o poder de manobra do governo. “Esse gesto do PMDB é um incentivo para que outras siglas parecidas sigam o mesmo caminho”, afirma Cortez.

Só que ao mesmo tempo, cientistas políticos advertem que a decisão do partido não significa que a sua própria bancada, de 68 deputados federais, vá abraçar publicamente e de imediato a saída do governo Dilma.

“Mesmo com uma decisão dessas, não gosto de cravar que esse é um movimento definitivo. É difícil de avaliar como eles vão botar isso em prática. Todos os anos, por exemplo, o PMDB gosta de falar que vai ter candidato próprio à Presidência, que vai ter um programa para unificar o partido, mas nada disso é executado. O PMDB não gosta de se unificar de fato diante de uma determinada pauta”, afirma o cientista político Rafael Moreira, que estuda a dinâmica do partido em sua tese de doutorado.

Segundo ele, é necessário esperar para ver se a saída implica que a sigla tenha se voltado em peso para o impeachment e até mesmo para ver se a ordem de abandonar o governo vai ser cumprida à risca. Para Moreira, a a reunião desta terça-feira tentou jogar um verniz de unidade numa sigla que é tradicionalmente fragmentada.

Até a noite desta segunda-feira, o PMDB ocupava sete ministérios. Com a decisão pela saída, o diretório nacional espera que todos os ministros abandonem as pastas nos próximos dias. Mas, até o momento, só Henrique Alves, do Turismo, deixou o governo, e ao menos três peemedebistas já deram mostras que pretendem ficar, entre eles a ministra Kátia Abreu, da Agricultura, que foi escolhida numa cota pessoal da presidente.

No mês passado, o partido já havia proibido seus filiados de assumirem novos cargos no governo, mas isso não impediu que o deputado Mauro Lopes tomasse posse como ministro da Aviação Civil, ignorando a decisão.

Também nesta terça-feira, membros do partido especularam que podem ser feitos arranjos para agradar os ministros que decidirem ficar no governo, como uma autorização para que eles se licenciem do partido.

Para Moreira, a questão envolvendo os ministérios é um dos maiores empecilhos para entender o movimento desta terça-feira como uma ruptura drástica e para ver o partido unido como oposição ao governo. “Esses ministros podem simplesmente ir para outro partido. Ou o partido ainda pode esticar o prazo para que eles saiam do governo. E aí, como ficaria esse discurso do PMDB?”, disse.

“Não dá para falar que todo o PMDB abraçou essa decisão. O partido nunca tomou decisões drásticas. Ele é um mestre de tomar decisões para não tomar decisões. É o caso de observar como as várias facções vão abraçar esta decisão.”

Na segunda-feira, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que vem comandando a articulação política do governo Dilma, afirmou lamentar uma eventual saída do PMDB, mas disse que ainda mantinha a esperança de negociar individualmente, com cada deputado, as questões de interesse do Planalto, como ocorreu nos primeiros meses de 2003, quando a sigla ainda não fazia parte da base aliada.

Só que, segundo Cortez, a decisão da direção nacional mostra que agora existem mais motivos para especular sobre uma mudança de governo do que para acreditar no sucesso da negociação de concessões na administração Dilma, mas, ainda assim, é difícil avaliar se o episódio desta terça-feira vai realmente marcar o começo do fim do governo Dilma, como afirma a oposição.

“Isso definitivamente gerou um incentivo para viabilizar um eventual governo Temer. Os antigovernistas também aumentaram o custo político para quem quiser continuar a apoiar o governo. No entanto, isso ainda não significa que todos os votos do PDMB serão contados para o impeachment. As dinâmicas desse processo são mais complexas, e ainda há divergências no partido sobre o que deve ser feito, mesmo com a saída. Basta observar que o partido saiu do governo, mas ainda não se posicionou oficialmente sobre impeachment”, afirma.

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