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O abraço da jararaca

Danilo Cabral e Marília Arraes travam disputa pelo capital eleitoral de Lula

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“Temos uma aliança estratégica“, rebate o pessebista - Imagem: Felipe Ribeiro
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Há 16 anos à frente do governo de Pernambuco, o PSB corre o risco de perder a hegemonia no estado, caso o candidato a governador pelo partido, Danilo Cabral, siga estagnado na preferência do eleitorado, segundos as pesquisas, oscilando entre a quarta e a quinta colocação. Para reverter esse quadro, o pessebista aposta todas as fichas em seu principal cabo eleitoral, o ex-presidente Lula, que lidera as intenções de voto no estado. A dificuldade é convencer o eleitor pernambucano de que ele é o candidato preferencial do ex-presidente, e não a ex-petista Marília Arraes, hoje no Solidariedade, que vem explorando à exaustão a imagem de Lula na sua campanha.

Na quarta-feira 20, depois de visitar uma réplica da casa onde morou na infância no município de Caetés, o ex-presidente participou de um ato em Garanhuns ao lado de Cabral e foi incisivo ao defender o nome do pessebista. “O PT tem um compromisso com o PSB e eu sou do tempo que não precisava de documento para ser cumprido. Era no bigode. O PT vai seguir o compromisso que tem com o PSB e o PSB com o PT. Nós não precisamos professar da mesma religião nem torcer pelo mesmo time. Precisamos é gostar de gente. Por isso, meu candidato chama-se Danilo Cabral”, discursou o presidenciável. Todas as pesquisas apontam Lula como franco favorito em Pernambuco, com mais de 60% de intenções de votos, uma popularidade disputada tanto por Cabral quanto por Marília.

Enquanto Marília explora o capital político de Lula se apoiando na relação construída com ele no período em que esteve filiada ao PT, Cabral tem enfrentado duras críticas do eleitorado de esquerda por ter votado a favor do impeachment, em 2016, e por seu partido ter apoiado o tucano Aécio Neves no segundo turno das eleições presidenciais de 2014 contra Dilma Rousseff.

“São episódios superados. O próprio PSB reconheceu tratar-se de um erro histórico. Nossa preocupação é com o futuro, para reconstruir, ao lado de Lula, uma aliança como ocorreu no governo de Eduardo Campos, onde tínhamos um ambiente de avanços”, destaca o candidato do PSB. Sobre a dificuldade apontada nas pesquisas, Cabral diz não estar ansioso com os baixos índices, cita que a grande maioria do eleitorado “ainda não entrou na eleição” e, portanto, não decidiu em quem votar para governador. Na avaliação dele, muitos sequer sabem que o palanque de Lula no Estado é o da Frente Popular, coligação encabeçada por ele, com Luciana Santos, do PCdoB, como vice e a petista Teresa Leitão na vaga do Senado. Para o pessebista, a visita de Lula representa a virada de chave da sua candidatura, a se somar com a propaganda de rádio e tevê que se inicia no final de agosto.

“A minha relação com Lula é orgânica“, afirma a candidata do Solidariedade – Imagem: Gabriel Paiva

“Não existe dubiedade. Está muito claro que o único palanque de Lula em Pernambuco é o nosso. É uma aliança estratégica, na convicção de que temos um desafio grande, que é preservar a democracia e evitar o retrocesso. Lula é o grande líder desse processo e o PSB é o principal aliado, tanto que indicou Geraldo Alckmin para vice-presidente”, comenta Cabral, acrescentando não ver problema em Marília Arraes também apoiar o petista. “Vamos mostrar nosso time, que o outro lado apresente o seu”.

Sem espaço no PT para ­disputar o governo do Estado, Marília deixou a legenda em março deste ano, depois de seis anos de filiação. Antes, procurou Lula para comunicar a decisão e prometeu ser fiel à sua campanha para presidente. Desde então vem fazendo uma campanha casada com o petista, não somente utilizando imagens ao lado dele, mas procurando reproduzir em nível estadual algumas propostas históricas do PT, como o Mais Médicos, que promete implantar em Pernambuco caso seja governadora.

Uma das estratégias de Marília é passar a mensagem de que ela, embora não tenha o apoio oficial de Lula, é a candidata preferencial do petista, enquanto Cabral não teria “liga” com o petista. Recentemente, a candidata lançou o lulômetro, uma peça publicitária que pontua os candidatos que apoiaram Lula e o PT em diferentes situações, como em eleições anteriores, no combate ao impeachment de Dilma ou esteve do lado de Lula enquanto esteve preso. Na competição, Marília conquista a maior pontuação e vence com folga.

“A minha relação com Lula é orgânica, existe desde 2002, quando votei nele pela primeira vez. Nosso avalista é o povo de Pernambuco. Estivemos juntos nos momentos mais difíceis, quando ele esteve preso e enfrentou uma das mais brutais perseguições políticas que este país já viu. Temos unidade de pensamento”, explica a candidata do Solidariedade. Outra grande marca da campanha de Marília é o ex-governador e avô da candidata, Miguel Arraes, figura política muito querida no Estado, sobretudo no interior.

O ex-presidente está no palanque do PSB, mas a ex-petista criou até um “lulômetro” para provar que é a preferida do líder

“Danilo Cabral enfrenta dificuldade de emplacar devido ao desgaste da gestão do PSB em Pernambuco. Buscar a nacionalização do pleito e o apoio da imagem de Lula para o fortalecimento dessa candidatura se tornou uma sobrevivência política para o PSB, tentando resgatar no eleitorado o sentimento de que a melhor época em Pernambuco foi quando havia a conjugação dos governos Eduardo Campos e Lula como presidente da República”, analisa a cientista política Priscila Lapa, da Faculdade de Ciências Humanas de Olinda.

Para Túlio Velho Barreto, cientista político e pesquisador da Fundaj, a disputa para governador está longe de ser definida e deve se dar apenas no segundo turno. Ele chama atenção para a nacionalização da disputa e o risco de reproduzir a polarização nacional no Estado, abrindo espaço para o candidato de Bolsonaro, Anderson Ferreira, crescer até a eleição. Ele aparece em terceiro lugar nas pesquisas. “Ainda não há uma candidatura que desponte como franca favorita, apesar da dianteira de Marília Arraes. Lula pode impulsionar Danilo Cabral, mas a intensa polarização que ainda se desenha na disputa nacional pode igualmente impulsionar uma candidatura da direita local.”

A queda de braço entre Marília ­Arraes e Danilo Cabral tem agitado militantes e líderes petistas e pessebistas que estão apoiando, abertamente ou nos bastidores, o palanque de Marília Arraes. PT e PSB já realizaram expulsões de alguns dos seus filiados por esse motivo e prometem continuar com a repulsão. “O PSB não tem espaço para quem não está interessado em militar no nosso campo”, dispara o presidente estadual do PSB, Sileno Guedes.

Além de Marília Arraes e Danilo Cabral, Lula também tem o apoio em Pernambuco do palanque do PSOL, cujo pré-candidato a governador é o advogado João Arnaldo. Com três palanques no Estado, é natural que o ex-presidente abarque a maioria do eleitorado pernambucano, que historicamente tem dado vitória aos candidatos petistas nas últimas eleições presidenciais. •

PUBLICADO NA EDIÇÃO Nº 1218 DE CARTACAPITAL, EM 27 DE JULHO DE 2022.

Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título “O abraço da jararaca”

 

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