Política

Nova lei que estabelece crimes contra o Estado de Direito divide opiniões na oposição

‘Entulho da ditadura’, Lei de Segurança Nacional será substituída por regras de criminalização de atos contra a democracia

Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado
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Não há consenso na oposição sobre a aprovação, no Senado, da derrubada da Lei de Segurança Nacional e a definição de novos crimes contra o Estado Democrático de Direito. O texto, que já passou pela Câmara, foi votado nesta terça-feira 10 pelos senadores e depende da sanção presidencial para entrar em vigor.

Relator do projeto no Senado, Rogério Carvalho (PT-SE) celebrou a aprovação e chamou a Lei de Segurança Nacional de “resquício da ditadura”. A lei em questão foi fundada em 1983 e vinha sendo empregada pelo governo de Jair Bolsonaro para enquadrar judicialmente personalidades críticas à sua gestão.

“Vitória da Democracia! Tanques nas ruas nunca mais!”, escreveu o petista.

A comemoração se dá no dia em que o governo levou às ruas de Brasília um desfile de tanques militares, ato interpretado como intimidação ao Parlamento, que resiste em aprovar o voto impresso para 2022. A derrubada da Lei de Segurança Nacional, portanto, é descrita como uma segunda resposta do Legislativo ao Palácio do Planalto.

No lugar da antiga lei, o Senado estabelece novas regras de crimes contra a democracia. São 10 novos delitos tipificados:

  • Atentado à soberania: Prisão de três a oito anos se negociar com governo estrangeiro ou grupo estrangeiro para provocar atos típicos de guerra contra o País e invasão. Pena pode subir com agravantes;
  • Atentado à integridade nacional: Prisão de seis meses a dois anos para violência ou grave ameaça relativa a desmembramento regional para constituir país independente;
  • Espionagem: Prisão de três a 12 anos por entrega de informações secretas para governo ou organização criminosa do exterior;
  • Abolição violenta do Estado Democrático de Direito: Prisão de quatro a oito anos por tentativa de abolir o Estado Democrático de Direito, com emprego de violência ou grave ameaça, impedindo o exercício de poderes constitucionais;
  • Golpe de Estado: Prisão de quatro a 12 anos por depor contra o governo legitimamente constituído, com emprego de violência ou grave ameaça;
  • Interrupção do processo eleitoral: Prisão de três a seis anos por impedimento ou perturbação de eleição por meio de violação do sistema de votação;
  • Comunicação enganosa em massa: Prisão de um a cinco anos por oferta, financiamento e integração de campanha para disseminar fake news capazes de comprometer o processo eleitoral;
  • Violência política: Pena de três a seis anos e multa por restrição ou impedimento de exercício de direitos políticos por meio de violência física, psicológica ou sexual, em razão de sexo, cor, raça, etnia, religião ou nacionalidade;
  • Sabotagem: Prisão de dois a oito anos por inutilização de instalações e serviços destinados à defesa nacional, com objetivo de abolir o Estado Democrático de Direito;
  • Atentado a direito de manifestação: Prisão de um a quatro anos por impedimento, mediante violência ou grave ameaça, de livre e pacífico exercício de manifestação de partidos, movimentos, sindicatos, órgãos de classe ou demais grupos políticos, associativos, étnicos, raciais, culturais ou religiosos.

A aprovação das novas regras, porém, sofre críticas de entidades do campo progressista. Em nota, a organização jurídica Terra de Direitos criticou o “caráter punitivista” da nova legislação e declarou que o processo de apreciação não garantiu amplo debate com a sociedade civil.

“O texto aprovado no Senado segue com os problemas do texto aprovado pela Câmara”, disse Gisele Barbieri, coordenadora de incidência política da Terra de Direitos, ouvida por CartaCapital. “Há consenso de que é preciso revogar totalmente a Lei de Segurança Nacional, mas não temos consenso de que a lei deve ser substituída por outra lei de caráter punitivista. Seguimos em alerta, porque o texto mantém definições e termos vagos que abrem brechas para interpretações pelas autoridades do sistema de justiça penal.”

Em maio, um relatório contrário à aprovação do projeto de lei apontou semelhanças das antigas regras com as novas. O documento foi assinado pela Terra de Direitos e por outras 10 organizações: Anistia Internacional, Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, Instituto Vladimir Herzog, Justiça Global, Grupo Tortura Nunca Mais, Artigo 19, Coalizão Direitos na Rede, Movimento Negro Unificado, Comitê Brasileiro de Defensores de Direitos Humanos e Núcleo de Assessoria Jurídica Universitária Popular Luiza Mahin, da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Para essas organizações, conceitos vagos na nova lei podem perpetuar a aplicação inadequada de determinadas criminalizações. Além disso, a votação apressada pode enfraquecer a mobilização contrária à Lei de Segurança Nacional, já que ficará mais difícil reverter eventuais trechos perigosos que forem avalizados agora.

Ouvida por CartaCapital à época em que a matéria estava com os deputados, a relatora do texto na Câmara, Margarete Coelho (PP-PI), rebateu as acusações de pressa na análise. A parlamentar argumentou que o projeto atual deriva de textos propostos em 1991 e 2002, havendo, portanto, tempo suficiente para o debate.

“A lei está extremamente discutida e debatida”, disse sa congressista. “Não estamos inaugurando esse debate agora. O que estamos fazendo é colher os frutos de todo o debate feito por todo esse tempo.”

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