Política

“Nosso foco sempre foi e será a absolvição de Lula”, dizem advogados

Cristiano Zanin e Valeska Martins revelam detalhes do processo que levou o ex-presidente à cadeia

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Cristiano Zanin Martins e Valeska Teixeira Zanin Martins são parte do núcleo duro da defesa de Lula, cuja tarefa hercúlea inclui fazer valer as incontáveis provas e testemunhos de sua inocência. Condenado em terceira instância no caso do triplex do Guarujá, e em primeira no processo do sítio de Atibaia, o ex-presidente é réu em outras sete ações que tramitam no Paraná, no Distrito Federal e em São Paulo. Ao final de todos os julgamentos, suas penas somadas podem ultrapassar 110 anos.

Se o casal Zanin e o corpo de advogados de Lula têm logrado algum sucesso, trata-se da reiterada denúncia que fazem do lawfare praticado contra o ex-presidente, considerado mundo afora o mais notório preso político da atualidade. Também pudera, o juiz responsável por sua prisão acabou por aninhar-se entre ministros do governo de extrema-direita que ajudou a eleger em dupla jornada – ao tirar Lula da concorrência condenando-o sem provas e ao divulgar trechos de uma delação fajuta do ex-petista Antonio Palocci às vésperas da eleição, prejudicando a candidatura de Fernando Haddad.

Em entrevista a CartaCapital, Zanin e Zanin revelam a esperança última: a ONU deve retirar a competência de Curitiba sobre os processos do ex-presidente, e o STF, impôr a verdade e devolver a justiça a Lula. 

CartaCapital: Que análise fazem do julgamento do processo de Lula pelo STJ na semana passada, com a consequente redução da pena?

Cristiano Zanin: Foi pouco, porque a absolvição do ex-presidente é o resultado que entendemos adequado para esse processo. Mas é um começo. Agora, vamos buscar até o fim, até o último recurso, a absolvição. Há elementos de sobra para isso.

Valeska Martins: Qualquer colegiado imparcial chegaria, sem sombra de dúvida, à conclusão de que as provas demonstram, de forma cabal, a inocência de Lula. É isso que ele pretende continuar lutando para provar, não só nos tribunais, mas para a população brasileira.

CC: Como Lula recebeu o resultado do julgamento?

CZ: A Justiça tem ignorado os argumentos da defesa, o que leva a um certo ceticismo. Por outro lado, o ex-presidente sabe da força das provas de inocência que apresentamos. Fiz todas as audiências relativas a esse processo. Foram ouvidas 73 testemunhas. Nenhuma delas fez qualquer afirmação que pudesse confirmar a hipótese acusatória. No entanto, o ex-presidente Lula foi condenado porque o corréu nessa ação, Léo Pinheiro, prestou um depoimento fantasioso, contou uma versão mentirosa. Ele próprio disse no depoimento que estava alterando a sua posição anterior. E porque estava alterando? Porque é público e notório que estava negociando um acordo com o MPF, objetivando benefícios. Então, como se pode dar credibilidade ao depoimento de uma pessoa que não presta o compromisso da verdade? O acordo que ele firmou foi discutido com o órgão acusador. Não se pode dar a esse depoimento qualquer valor de prova, mas foi isso que a Justiça acabou fazendo.

VM: Quando há a busca e apreensão, e a condução coercitiva do ex-presidente, o próprio Ministério Público diz que não há provas. Mesmo assim faz a denúncia com base em convicção, recorrendo a teorias que não são condizentes nem com o Direito brasileiro nem com os Direitos Humanos.

CC: Quais são as principais provas da inocência de Lula?

CZ: Dentre outras, os depoimentos de testemunhas que claramente afirmaram que o ex-presidente nunca teve a posse desse apartamento. O que ocorreu foi: a dona Marisa comprou uma cota da Bancoop (a Cooperativa Habitacional dos Bancários) que poderia dar a ela o direito de ter um apartamento. No entanto, esse empreendimento da Bancoop acabou não vingando, e foi transferido para a OAS. A dona Marisa não recebeu os valores que ela já havia pago, nem qualquer apartamento. Tanto que, na semana passada, a Justiça de São Paulo julgou parcialmente procedente uma ação que movemos em favor dela, reconhecendo o direito de receber de volta os valores pagos e jamais devolvidos. A situação mostra quão indevida é a condenação imposta ao ex-presidente.

VM: A história desse apartamento é muito interessante, porque ele foi objeto de emissão de debêntures, que é uma captação que a OAS fez quando assumiu o empreendimento no mercado. Ou seja, esse apartamento já nasce hipotecado. Depois, é cedido a uma seção fiduciária de direitos creditórios. Isso significa que o imóvel já havia sido alienado para o fundo gerido pela Caixa Econômica Federal. Então, é impossível que esse apartamento fosse prometido, reservado, dado como propina ao ex-presidente, porque se ele o quisesse, teria de pagar à Caixa. Então, essa é uma história que não tem lógica. Como ele teria sido garantidor de um grande esquema de corrupção para ao final ficar com um apartamento pelo qual ele teria de pagar? É exatamente isso que ficou provado nos autos. Não faz sentido.

CZ: O fato é que, quando houve a apreciação imparcial dos fatos conectados com o processo do triplex, a Justiça deu razão ao ex-presidente Lula e seus familiares. Mas quando o processo foi analisado pela Justiça Federal, à época comandada pelo ex-juiz Sérgio Moro, o cenário foi outro.

CC: Há algumas semanas, o STF ia julgar a constitucionalidade da prisão depois de condenação em segunda instância. O julgamento foi adiado a pedido da OAB. O STJ apressou-se então a apreciar o recurso do ex-presidente, confirmando sua condenação. Agora, aventa-se que o STF possa mudar seu entendimento, autorizando a prisão a partir da terceira instância. Foi uma manobra para Lula não ser solto?

CZ: Ao longo desse processo, vimos algumas vezes o Judiciário agir de forma estratégica, o que não deve ser aceito, porque o papel do Judiciário deve ser analisar de forma imparcial e independente um processo e dar seu veredicto. Tivemos diversas anomalias, uma tramitação claramente acoplada aos acontecimentos políticos do país, uma velocidade recorde imposta ao processo para que ele tivesse desdobramento antes das eleições presidenciais de 2018. Houve situações em que o julgamento de recursos e precedentes não ocorreram ou ocorreram de uma forma não prevista pela defesa, possivelmente, como já disse, por uma via estratégica do Judiciário.

VM: O próprio ministro Marco Aurélio, ao final daquele julgamento da prisão preventiva do ex-presidente, deixa bem claro ao plenário que, “neste dia, a estratégia havia vencido direitos”.

CC: Isso confirma a tese de que este é um julgamento político?

VM: Sem dúvida alguma. Parte do Judiciário e da mídia brasileira atuaram sempre no sentido de demonizar o ex-presidente, deslegitimá-lo, e assim destruir o inimigo. Se você faz com que uma pessoa se defenda constantemente, você a retira de sua atividade principal, então você já ganhou. Estrangula financeiramente a pessoa. Quando faz com que recaia sobre ela suspeitas difusas e, portanto, a mensagem que se passa ao cidadão comum é que “ele deve ser culpado de alguma coisa”. São muitas acusações, e todas elas seguem a mesma lógica, ou a mesma falta de lógica. Os maiores experts do mundo em lawfare corroboram essa nossa percepção, e por isso levamos o caso ao Comitê de Direitos Humanos da ONU. O que pedimos é um julgamento por um tribunal independente e imparcial.

CC: E qual seria esse tribunal, o STF?

VM: O Comitê de Direitos Humanos da ONU tem de retirar da 13ª Vara de Curitiba a competência sobre esse processo, porque aquela força-tarefa e aquela jurisdição, desde o início, são derivadas de motivações políticas e não jurídicas. O processo deve ser anulado e redistribuído para um tribunal competente que consiga julgá-lo de forma imparcial. Cabe ao STF impôr a verdade e reconstruir a justiça para Lula, que não está acima da lei, mas também não pode ficar abaixo dela. É isso o que pretendem, e ele não vai aceitar essa situação.

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