Política
No palco ou na política, os bolsonaristas são, antes de tudo, covardes
Gusttavo Lima e os demais vaqueiros teriam muito a aprender sobre o empreendedorismo, a vida e a globalização se prestassem mais atenção no cérebro e menos no tororó da Anitta


O sertanejo é, antes de tudo, um fraco. O chapéu moldado para abrigar duas cabeças, a fivela que lembra um cinto de castidade, as botas enfeitadas como árvores de Natal escondem o matuto frágil, o corno manso, a criança sem eira nem beira largada nesse mundão de Deus. Obcecado pelo tororó dos outros, desaba quando o próprio tororó é incluído na discussão. “Estou sofrendo perseguição na minha vida pessoal e profissional. Estou cansado, quase jogando a toalha (oxalá). É triste ser tratado como um criminoso, um bandido”, desabafou, às lágrimas, Gusttavo “com dois tês” Lima. “Somos uma equipe gigantesca de colaboradores, que nos ajudam a subir sempre mais um degrau”, emendou, ao desfiar a típica cantilena: sou trabalhador, homem de bem, pago meus impostos, sustento muita gente blábláblá.
Nasci no interior de Minas Gerais e sei o quanto é difícil exorcizar o Jeca Tatu amoitado nas entranhas, mas Gusttavo “com dois tês” e os demais vaqueiros teriam muito a aprender sobre o empreendedorismo, a vida e a globalização se prestassem mais atenção no cérebro e menos no tororó da Anitta “com dois tês”, artista independente, consciente, batalhadora e mundialmente famosa, dona do próprio nariz e do tororó que involuntariamente expôs o traseiro dos sertanejos bolsonaristas. Querem ser respeitados? Engulam as lágrimas e rebolem até o chão.
Rendo-me a Gregório Duvivier: o country nativo aponta o dedo para o tororó da Lei Rouanet, de inúmeros defeitos sem dúvida, com o intuito de esconder o esquema do “orçamento secreto” das prefeituras miseráveis que bancam seus shows. O sertanejo é o Centrão da música brasileira e Gusttavo Lima, o Arthur Lira da vaquejada. Não bastassem os cachês milionários, o grupo empresarial que é dono de seus shows esteve envolvido em um empréstimo de 300 milhões de reais a juros camaradas do BNDES, alvo de um desmonte sem precedentes. Trata-se da versão mequetrefe, remendo, da “gatonet” da política de “campeões nacionais” dos tempos do PT, que ao menos propunha criar multinacionais brasileiras. Agora, o banco de desenvolvimento, certamente em nome dos interesses nacionais, financia a propaganda eleitoral pró-Bolsonaro de gosto duvidoso em um helicóptero e abastece os churrascos no Palácio do Alvorada.
Gusttavo Lima e Jair Bolsonaro poderiam curtir a sofrência juntos. Uma noite de pijamas, regada a uísque e picanha. Também Bolsonaro é, antes de tudo, um fraco. Altivo e corajoso à beira do cercadinho, sempre arruma um atestado médico para fugir dos compromissos. A cinco meses da eleição, o ex-capitão avisou que não pretende participar dos debates no primeiro turno. Teme o complô dos concorrentes e o “baixo nível” dos confrontos. Promete comparecer no segundo turno, se segundo turno houver. Jogou a toalha. Só faltou chorar. Mas não faltarão oportunidades.
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