Política

No fim da gestão Mandetta, Saúde pôs na rua licitação suspeita

Negócio estimado em 400 milhões teve documento vazado em dezembro e virou caso para a Corregedoria do Ministério

O ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta. Foto: Marcello Casal Jr./Agência Brasil
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O deputado Luiz Henrique Mandetta (DEM-MS) foi demitido por Jair Bolsonaro em 16 de abril do Ministério da Saúde, por desavenças sobre o coronavírus. No apagar das luzes de sua passagem pelo cargo, o Ministério botou na praça uma licitação cujos preparativos foram marcados por um fato esquisito: o vazamento antecipado, para interessados no negócio, de um certo documento. 

O edital dessa licitação saiu no Diário Oficial da União de 17 de abril. É a contratação de transporte aéreo (helicóptero, basicamente) para Distritos Sanitários Especiais Indígenas, uma espécie de rede SUS dos povos tradicionais. Cada um dos distritos, cerca de 30, costuma fazer licitação própria. No novo edital, a contratação será única. Resultado: um negócio gordo, estimado em 400 milhões de reais. Os vencedores serão conhecidos em 5 de maio.

 

O edital tem data de 16 de abril, dia da demissão de Mandetta. É assinado pelo subsecretário de Assuntos Federativos do Ministério da Saúde, Alexandre Pozza Urnau Silva. Este havia sido nomeado para o cargo em janeiro de 2019, mês em que Mandetta assumira o comando da pasta. 

A licitação foi preparada em 2019 pela Secretaria de Saúde Indígena (Sesai) do Ministério. O “termo de referência” dela circulou em dezembro entre interessados no negócio. Eis o fato esquisito. 

Esse “termo” detalha aquilo que um órgão público quer adquirir e em quais condições. O normal é ficar disponível aos fornecedores depois da publicação do edital, que é mais genérico, um simples aviso de compra pública a caminho. Deveria ser conhecido só agora, portanto. Ter vazado antes é sinal de favorecimento a todos os que tiveram chance de pegar a papelada.

CartaCapital obteve uma cópia do “termo” vazado e noticiou em janeiro sua existência. Procurado na época, o Ministério da Saúde não respondeu a pedidos de esclarecimento. Segundo a reportagem apurou agora, a notícia do vazamento fez com que o caso fosse parar na Corregedoria da pasta.

Uma pessoa que acompanha essa licitação com lupa tem uma explicação para o edital ter sido publicado no apagar das luzes da gestão Mandetta: garantir àqueles que haviam recebido o “termo de referência” antes que a licitação sairia mesmo, e nos termos pré-conhecidos. E qual seria a razão para esse esforço de assegurar que o contrato milionário vingaria, mesmo em meio a uma pandemia que deveria concentrar energia e recursos do Ministério? Dá para imaginar. Detalhe: há contratos vigentes de serviço de transporte aéreo para os distritos indígenas.

O secretário de Saúde Indígena que tomou as providências finais do edital também foi nomeado por Mandetta, a exemplo de Urnau Silva, o subsecretário que assina o documento. É Robson Santos da Silva, um militar amigo do deputado. 

Silva foi chefe de gabinete de Mandetta no Ministério, antes de assumir, em fevereiro, a Secretaria. Ao despedir-se da pasta, Mandetta contou à equipe uma história sobre ele. Médico de formação, o deputado apresentou-se ao Exército no início dos anos 1990, após ter feito residência. Era então aspirante a oficial. Seu instrutor nessa passagem pelos quartéis foi Silva.

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