Política
Morre aos 88 anos o fotógrafo Evandro Teixeira, que captou o horror da ditadura
‘Minha forma de enfrentamento à ditadura sempre foi através das minhas fotografias’, disse Teixeira, no Chile, em setembro de 2023


Morreu no Rio de Janeiro nesta segunda-feira 4, aos 88 anos, o fotógrafo Evandro Teixeira, um dos principais nomes do fotojornalismo brasileiro. Ele estava internado na Clínica São Vicente, na Gávea, zona sul da capital fluminense. Segundo a instituição, a morte ocorreu por falência múltipla de órgãos, em decorrência de complicações de uma pneumonia.
O velório ocorrerá na Câmara de Vereadores, nesta terça-feira 5, das 9h às 12h.
Natural de Irajuba (BA), Teixeira nasceu em 25 de dezembro de 1935. Iniciou sua carreira no fotojornalismo em 1958, como estagiário do Diário da Noite, do Rio. Cinco anos depois, chegou ao Jornal do Brasil, no qual permaneceu até 2010.
Fotografias sobre a ditadura militar estão entre seus trabalhos mais marcantes. Logo de cara, na madrugada de 1º de abril de 1964, registrou a tomada do Forte de Copacabana pelos oficiais insurgentes.
Outros registros icônicos de Teixeira datam de 1968, em meio ao recrudescimento do regime de exceção. Em junho daquele ano, cobriu uma violenta repressão policial a estudantes, conhecida como “Sexta-feira sangrenta”, e a “Passeata dos Cem Mil”, ambas no Rio de Janeiro.
Também esteve no Chile em 1973, ano do golpe militar que depôs o presidente Salvador Allende e deu início à ditadura do general Augusto Pinochet.
O presidente Lula (PT) lamentou a morte de Evandro, a quem classificou como “referência no fotojornalismo do nosso País e do mundo”.
“Evandro deixa um acervo de mais de 150 mil fotos, com imagens que fazem parte da história do Brasil. Cobriu posses presidenciais, registrou a fome, a pobreza, esportes, personalidades e a cultura do nosso País”, acrescentou o petista. “Meus sentimentos aos familiares, amigos, colegas e admiradores de Evandro Teixeira.”
Teixeira não se limitou, porém, a eventos políticos: também esteve na cobertura de edições dos Jogos Olímpicos e da Copa do Mundo de futebol.
É autor dos livros Fotojornalismo (1983); Canudos 100 anos (1997); e 68 destinos: Passeata dos 100 mil (2008), sobre integrantes da celebrada manifestação de protesto à ditadura militar que Evandro fotografou.
Em setembro do ano passado, o Museu da Memória e dos Direitos Humanos de Santiago abriu uma exposição de Teixeira sobre a ditadura chilena e a morte do poeta Pablo Neruda. Foi uma realização da Embaixada do Brasil no Chile, com cerca de 40 fotos.
Teixeira foi o primeiro fotógrafo no mundo a captar a morte de Neruda, cujo velório foi o marco inicial da resistência à ditadura de Pinochet.
“As minhas fotografias apresentadas na exposição eternizam um capítulo tenebroso da história do Brasil e do Chile”, disse, na ocasião. “Mas, ao contar essa história, conseguimos renovar a necessária memória sobre o que é, de fato, uma ditadura e seus horrores. Minha forma de enfrentamento à ditadura sempre foi através das minhas fotografias. E para eu conseguir os cliques, a minha atitude precisava ser discreta e esperta. Eu evitava o confronto direto, fingia seguir as regras, tudo para conseguir as imagens que queria. Minha arma contra a ditadura foi a minha Leica M3.”
Ele recebeu, entre outros, prêmios da Unesco e da Sociedade Interamericana de Imprensa.
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