Política

Ministério Público suspeita de toque de recolher após chacina em Salvador

Promotor desconfia de pressão do tráfico contra moradores do Cabula, enquanto Anistia Internacional acusa a PM de intimidar os moradores depois que 12 jovens foram assassinados

Manifestação em memória dos 12 mortos no Cabula, dia 11
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O Ministério Público Estadual da Bahia suspeita que os moradores da comunidade do Cabula, na periferia de Salvador, estejam sob toque de recolher duas semanas depois do assassinato de 12 jovens pela Polícia Militar. Quem cogita a possibilidade é o promotor David Gallo, que na tarde de quinta-feira 19 foi até o local do crime para colher depoimentos, sem sucesso. Embora o promotor suspeite de que a ordem tenha partido do tráfico de drogas, a Anistia Internacional garante que o silêncio dos moradores se deve a ameaças de policiais da Rondesp – o Bope baiano.

Gallo coordena os trabalhos de outros cinco promotores que acompanham o inquérito policial que investiga as condições da chacina. A Rondesp alega que os nove agentes envolvidos se defenderam de uma troca de tiros com 30 suspeitos de planejar um assalto a banco. As mortes, portanto, foram registradas como Auto de Resistência, a lesão corporal ou morte em razão da intervenção da polícia. Apenas um PM saiu ferido após a suposta troca de tiros.

A outra versão, conta o promotor, é que os 12 homens foram executados no campo de futebol do bairro depois de serem rendidos e desarmados. Essa história ganhou força a partir da quarta-feira 11, quando os moradores do Cabula decidiram fazer uma passeata pelo bairro em memória das vítimas.

Desde então, policiais militares passariam a frequentar o bairro fazendo ameaças a quem ousasse testemunhar contra a Rondesp. “Desde a marcha, a presença da PM vem sendo constante e ameaçadora. Eles colocam medo nas pessoas. Esse comportamento desestimula o testemunho de membros da comunidade diante da Justiça”, avalia Renata Neder, responsável pelos direitos humanos da Anistia Internacional no Brasil.

Rondesp Rondesp, o Bope baiano, é acusado de matar 12 jovens rendidos e desarmados

Apesar de não descartar a ação da polícia, Gallo credita o silêncio da população ao tráfico de drogas, que comandaria toda a região. “Há lugares em que o poder público não chega, e esse é um deles”, afirmou o promotor a CartaCapital enquanto voltava da vistoria, onde tentou convencer moradores a falar. “Não tinha ninguém nem nas janelas das casas, um sinal do toque de recolher. Aparentemente o chefe do tráfico proibiu que as pessoas comentassem o caso.”

O promotor foi até o terreno baldio ladeado por um matagal. É lá que as crianças jogam futebol e onde a execução ocorreu. De acordo com Gallo, o local do crime não foi preservado nem por um jornalista, que teria apanhado projeteis do chão. “Muitos moradores pegaram pertences das vítimas durante a madrugada.”

Renata contesta a decisão da Secretaria Estadual de Segurança de manter os agentes em atividade. “O ideal nesses casos é afastar o policial das ruas para que ele tenha acompanhamento psicológico.” Gallo admite que foi decisão da promotoria dar liberdade para que a PM decidisse o destino dos policiais durante as investigações. “Se tivesse qualquer coisinha, iriamos provocar para que houvesse o afastamento, mas no momento o que temos são duas versões que precisam ser apuradas.”

A previsão do Ministério Público é que os interrogatórios sejam concluídos até o final do mês. A próxima fase dos trabalhos será avaliar os laudos cadavéricos. “Pedimos urgência, acredito que teremos tudo em mãos em até 30 dias.”

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