Política

Meu adversário é o ‘voto Skaf’, diz Márcio França

O governador detalha sua estratégia para crescer nas pesquisas e diz achar que Alckmin gostaria de tê-lo como sucessor

"Ninguém botou fé que eu fosse ficar vivo nessa história", diz França
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Apesar de sua relação com João Doria estar “a pior possível”, nas palavras de um aliado próximo, é contra Paulo Skaf (MDB) que o governador de São Paulo, Márcio França, acredita que disputará o segundo turno.

A projeção vem de pesquisas semanais por telefone encomendadas pelo PSB, partido de França. Atualmente com 5% das intenções de voto, atrás de Skaf e Doria (PSDB), ele acredita ter potencial para crescer entre o eleitorado que rejeita tanto o PT quanto o ex-prefeito da capital — justamente o público que pende para Skaf. Ex-aliado de ambos, França deverá tentar se diferenciar deles por vir da classe média, o que o aproximaria da população.

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Na entrevista a seguir, França admitiu ainda não ter conseguido costurar uma chapa conjunta com o PSDB, seu plano original que tinha o aval de Alckmin.

CartaCapital: O senhor escolheu uma coronel da PM para vice. Essa escolha veio de uma projeção de cenário do PSB?
Márcio França: Tinham várias opções, mas eu entendi que ia ser uma coisa diferente, com uma mulher. Procurei encontrar algumas coisas também como futuras defesas. Acho que alguns assuntos serão fortes nessa eleição. Por exemplo, Lava Jato. Assunto forte. Se você puder não tem problemas, é melhor do que tê-los, né (risos). Dentro dos nomes, fui pegando quem tivesse menos dificuldade e talvez [fosse] uma alternativa nova.

Achei que era relevante ter duas mulheres e dois homens [na chapa]. Acho que isso podia ser uma coisa diferente. Todo mundo sempre faz uma defesa de que tem que ter mulher, e fica brigando pelas cotas, mas na hora de você fazer a coisa… pff! No fundo assim: ninguém botou fé que eu fosse ficar vivo nessa história. Entendeu? Porque o meu tamanho, principalmente do ponto de vista financeiro, de exposição, é muito menor que os outros. Apostei — e continuo apostando — que haverá um momento que isso se inverterá. Por exemplo, o pt tem uma vantagem. Ele não precisa ter um nome, ele tem a sigla, pessoas simpáticas à tese. Limitado esse público, sobraram três candidatos, digamos, mais competitivos.

CC: Mas analisando pragmaticamente, como o senhor vê a corrida daqui para frente? O senhr falou que vai tirar voto do Doria e do Skaf…
MF: Vou.

CC: Se diferenciando dos dois devido justamente a essa questão de origem, de o senhor ser filho de funcionário público, enquanto eles vêm de uma origem abastada?
MF: Exatamente. Bom comportamento. acho que eu tenho um comportamento completamente diferente deles, São pessoas de outro padrão.

CC: O senhor aposta que vai chegar no segundo turno com o Doria?
MF: Eu não diria isso. Hoje eu diria mais com o Skaf. Acho difícil o Doria ir para o segundo turno.

CC: Por causa da resistência a ele na capital?
MF: Eu sempre uso estatística, não invento. A última grande eleição, no Tocantins, foi muito semelhante à eleição daqui. Havia um sujeito que era prefeito da capital, famoso, rico, tal. Ele estava tão aclamado que resolveu renunciar para disputar o governo. Aí não sei quem apoia não sei quem, aquela Kátia Abreu (atualmente no PDT, vice de Ciro Gomes) foi candidata — uma pessoa famosa, de federação. Tinha um político antigo, o Vicentinho, que juntou alguns partidos.

E tinha o governador que estava no cargo por alguns meses, uma pessoa menos conhecida, de um partido pequeno. Quando começou a afunilar, ele acabou indo pro segundo turno com o vicentinho. O presidente da capital ficou fora, o outro ficou fora, enfim. No segundo turno, esse rapaz que era governador em exercício deu 75% a 25%. As pessoas afunilaram. No segundo turno ninguém vota em ninguém, vota mais para a reeleição dos outros.

CC: O senhor tem hoje na sua coligação PR e PTB, dois partidos que costumam se aliar em troca de algum cargo futuro. Como vai ficar isso?
MF: No caso do PTB, ele já estava no governo. Se eu não tivesse a chance de ter tempo [de TV] e alianças, não teria condição de ser candidato. PT e PSDB sempre fazem essas conversas assim, tipo: “Não se alie, se você aliar, é ruim.” Mas eles se aliam! Todo mundo é satélite deles. Eu não tenho vocação pra ser satélite. Quem imaginou isso vai errar. Não tenho essa coisa que eles têm de antagonismos. Sinto muito isso: se é do PT, o PSDB parece que torce pra dar errado. Se é do PSDB, o PT torce pra dar errado.

CC: O senhor foi aliado desses dois partidos.
MF: É, tenho amigos de dois lado que vêm aqui. Tenho certeza que terei votos do PT e do PSDB, e não serão poucos. Porque as pessoas [falam] “Se é pra ganhar você, prefiro que ganhe o Márcio”. [Sou] uma espécie de segunda opção.

CC: O voto útil.
MF: O voto útil, claro. Agora, é uma eleição mais difícil por uma razão. Uma população muito desanimada com tudo e uma tendência de que a eleição [em São Paulo] seja puxada pela nacional.

CC: A grande aposta para crescer é o tempo de TV, então.
MF: Claro. Eu não tinha outra opção.

CC: Isso é bom ou ruim para o senhor?
MF: Eu gostaria de ser conhecido, claro (risos). As pessoas às vezes sabem que tem um novo governador, mas não sabem identificar o nome e nem, muito menos, fisicamente. Quando você põe “atual governador”, dá uma diferença [nas pesquisas]. Porque a pessoa fala, “Não gosto do PT”, “Não gosto do Doria”, meio que cai no que eu conheço, que é o Skaf. Então acho que o primeiro adversário direto será esse “voto Skaf”. O eleitor dele não é um eleitor dele, é um eleitor que não quer votar nem de um lado, nem do outro.

CC: O senhor chegou a tentar costurar uma candidatura com o apoio do PSDB.
MF: Sim.

CC: Apesar de que muitas pessoas acharam que não fosse dar certo.
MF: Era muito difícil. Era muito difícil.

CC: Como o senhor se lembra do período que passou na Câmara dos Deputados?
MF: Logo que eu cheguei, tive uma divergência grave com o PT. porque o Aldo (Rebelo, do PCdoB) era presidente da Câmara. E eu formei e fui líder do bloco que formava eu, PDT, PCdoB e uns pequenos, para dar sustentação. Na minha visão, ali foi o primeiro grande erro do PT. Quando fizeram a junção e elegeram um do PT para presidente da câmara, que era o Arlindo [Chinaglia], deram a vaga de vice para o PMDB. Eles trocaram esse bloco de três partidos progressistas pelo PMDB, que era maior e era um só. Muito comum acontecer isso.

CC: Pensaram numericamente.
MF: É mais fácil negociar com um só do que com todos. Era uma tese antiga dos petistas. “Vamos trocar esse bloco por um bloco maior aqui.” Fui líder do bloco [de esquerda], e foi super bem-sucedido. Na época, não existia essa tradição de fazer bloco, era uma novidade.

CC: Como tem sido sua experiencia no Bandeirantes? O senhor chegou a fazer jantares de culinária paulista…
MF: Exatamente. Me incomoda ficar sozinho. Ele [Alckmin] é o contrário, é sempre muito reservado. Os moços aqui que dizem, “Você recebeu mais gente aqui em mês do que ele tinha recebido em vinte anos”.

CC: Era outra dinâmica.
MF: Não sei se você o conhece. Ele é uma pessoa bem diferente do normal. Sempre muito reservado e preservado. Ele não combina muito no PSDB. Minha opinião. O PSDB sempre foi uma coisa mais elaborada quando começou, eram pessoas de um tipo de cultura mais acadêmica. O Alckmin não é desse perfil. Vai ser um contraste absoluto [nas eleições], porque o Haddad é. Eu diria que as pessoas no PSDB acabaram engolindo [o Alckmin], porque ele foi se encaixando, virou vice, virou governador e foi indo.

CC: Até pela semelhança entre o senhor e Alckmin — que também começou como vice —, não acha que deveria ser um sucessor natural dele?
MF: Acho que talvez a vontade dele fosse essa. Mas ele não tem o perfil de ter força para falar, ‘Faça assim, pronto!’ no PSDB. Não é o perfil dele. O PSDB — me contaram eles, né — foi nascido a partir de uma situação do MDB com o Quércia que todos eles tinham trauma de que um cara te mata e guarda a arma embaixo do braço (gesticula). Então criaram todo um sistema de assembleísmo decisório. Não parece que tem alguém que decida, é um pouco todo mundo que decide junto.

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