Política
“Mais importante que um candidato é a democracia”
Em ato pelas eleições diretas em São Paulo, cidadãos ouvidos por CartaCapital preferem não declarar apoio a eventuais concorrentes


Em ato pelas Diretas Já no Largo da Batata, em Sao Paulo, o vendedor ambulante que se apresenta como Frei Jabá, 62 anos, conta as dificuldades de seu filho, atualmente no quarto ano de engenharia, para conseguir um estágio. A atual situação o deixa desiludido. “Eu tô com vergonha do meu País”.
Ele pede a saída de Michel Temer e a convocação de novas eleições, mas diz não ter candidato para uma eventual disputa antecipada. “Por enquanto, não voto em ninguém. Não tem ninguém aí. Tô de saco cheio de velho, velho sou eu.”
Por motivos diferentes, os manifestantes que foram ao Largo da Batata neste domingo 4 preferem não falar em possíveis nomes para a Presidência. Enquanto uma parcela da sociedade brasileira olha com desconfiança para a bandeira das Diretas Já, vista por muitos como parte de uma suposta estratégia de Lula de fugir de uma condenação na Justiça, defensores das eleições antecipadas ouvidos por CartaCapital levantam a bandeira pela democracia e não por partidos ou possíveis lideranças.
O professor da rede pública José Ibipirano, 46 anos, afirma que “desde o começo tem lutado contra o golpe”. “Fomos ativos no processo de impeachment, entendemos que o Temer é um golpista, ilegítimo e tem que ser tirado”. A resistência às reformas da Previdência e trabalhista e a defesa da convocação de Diretas Já são a prioridade para o momento, diz. “Ainda vamos construir um alternativa”, afirma, quando perguntado sobre um possível nome para a Presidência.
Professora e terapeuta, Marine Sobrosa, 39 anos, afirma que é preciso saber quais serão as propostas das candidaturas em uma eventual eleição antecipada. “Temos que ter novos candidatos. Não importa em quem eu vou votar. O importante é exercer esse direito. O resto vai se acomodando. Acredito na nossa democracia.”
Rodrigo Martins, professor da rede pública, diz que, se pudesse, escolheria o deputado federal Chico Alencar (PSOL-RJ) como candidato à presidente, mas diz não ser esse o objetivo da manifestação. Ele também rejeita qualquer vínculo entre a bandeira das Diretas Já com uma eventual candidatura de Lula. “Ele cumpriu o papel dele na sociedade. Agora tem de dar espaço para novas políticas que estão surgindo.”
Os mais jovens demonstram certa desilusão. Juliana Risole, 20 anos, diz não acreditar no “Volta, Lula”, bandeira de muitos presentes ao ato. “Tem de surgir algo novo na esquerda, eu não acredito na união da esquerda com o PT. Estou aqui também pelo fim da corrupção, não da forma como a direita pede, mas por uma nova forma de fazer política.”
O designer Ricardo Pereira, 27 anos, ainda não vê uma candidatura que o represente. “Ninguém da Direta é uma saída, o Lula não é uma saída. A gente só quer conquistar o nosso direito de votar.”
O músico Chico César, primeiro a se apresentar no ato que reúne outros nomes de peso como Mano Brown, Tulipa Ruiz e Criolo, faz coro com os outros manifestantes. “Ainda não há candidatos lançados. Mais importante que um candidato, é a própria democracia. Para aquele que pensa diametralmente oposto a mim poder votar. Precisamos nos confrontar no debate, nas ruas e nas urnas.”
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