Política

Ir às ruas agora seria cair na provocação de Bolsonaro, diz presidente da Força Sindical

Em entrevista a CartaCapital, Miguel Torres avalia ser necessário ‘medir a temperatura’ até as eleições: ‘Tem uma hora que vai ter que ser’

Miguel Torres, presidente da Força Sindical. Foto: Reprodução/TVT
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As centrais sindicais devem se reunir entre a quarta e a quinta-feira desta semana e, provavelmente, debaterão a repercussão das declarações do presidente Jair Bolsonaro (PL) com embaixadores na segunda-feira 18, quando ele proferiu versões já desmentidas sobre supostas fraudes no sistema eleitoral.

A perspectiva é de que as centrais divulguem uma nota sobre o tema, mas não há até o momento alguma orientação para organizar manifestações de rua. A informação é de Miguel Torres, presidente da Força Sindical, segunda maior central brasileira.

Em entrevista a CartaCapital, Torres avalia que chamar mobilizações de rua neste momento seria entrar em uma “armadilha” de Bolsonaro. O sindicalista defende uma “resposta dentro da democracia”, com notas que contribuam para o debate público.

Uma das propostas dele é articular a produção de uma nota no âmbito da Organização Internacional do Trabalho, a OIT, que dê respaldo às urnas eletrônicas para o exterior. Mas, para Torres, não é hora de se “desesperar”.

“A gente tem que ir medindo essa temperatura. Tem uma hora que vai ter que ser. Agora, se você for a ferro e fogo, toda semana tem que fazer manifestação“, declarou.

Na opinião do líder, a função de se manifestar neste momento está com o Senado e a Câmara, mas Rodrigo Pacheco (PSD-MG) deu uma resposta “tímida” e Arthur Lira (PP-AL) nem se pronunciou.

Torres diz estar ciente da forte expectativa para o 7 de Setembro, quando Bolsonaro deve levar às ruas uma massa de apoiadores e pode, novamente, reproduzir discursos golpistas. No entanto, para o sindicalista, responder à mobilização bolsonarista com protestos não é uma opção razoável.

A impressão de Torres é de que Bolsonaro pode até ter em mente a intenção de aplicar um golpe, mas deve encontrar dificuldades, sobretudo pela falta de apoio internacional. O tema segue sob discussão entre os movimentos, diz ele, e a questão de organizar ou não uma manifestação nacional permanece em pauta.

“Não podemos fazer loucura. A turma dele é louca, nós não somos. Nós temos responsabilidade”, pondera.

Confira, a seguir, os principais trechos da entrevista.

O presidente da Força Sindical, Miguel Torres. Foto: Reprodução/YouTube

CartaCapital: Essas ofensivas do presidente Jair Bolsonaro podem gerar alguma reação dos movimentos sociais nas ruas?

Miguel Torres: Olha, ele provoca demais. Agora, eu acho que também não temos que nos desesperar. Temos que dar resposta dentro da democracia. Acho que as centrais e as entidades estão se manifestando à medida que as coisas acontecem.

É a mesma coisa da PEC. Não dá para ser contra uma PEC que vai pôr dinheiro na mão de quem mais precisa. Eu acho que tinha que ser mais, até. Agora, na minha opinião, a população não é boba de acreditar que isso vai melhorar a vida dela. Os trabalhadores sabem que isso é temporário, sabem que é eleitoral. Eu estou naquela fase que o Lula falou: pega o dinheiro, compra uma comida, e na hora de votar dá uma banana para o Bolsonaro.

Ele já está provocando há muito tempo. As centrais provavelmente vão soltar uma nota estes dias. Agora, nas centrais, pelo menos, eu não vi nenhuma orientação de alguma manifestação, apesar de que esta semana vamos ter reunião com as centrais. É lógico, a gente não está desatento. Mas não podemos, a cada ação dele, entrar na provocação. Temos que ter cabeça.

O que nos deixa preocupado é que o sistema eleitoral está sendo questionado, e a resposta do Senado é muito fraca, e da Câmara, nenhuma resposta. Isso é grave.

CC: Qual a resposta o senhor acha que deveria ocorrer?

MT: Em defesa das eleições, das urnas. Há quanto tempo são eleitos pelas mesmas urnas, o mesmo sistema eleitoral? Eles tinham que se pronunciar. Quem fez o pronunciamento foi o Supremo. Acho que foi correto, o Fux. O Pacheco fez, mas bem tímido. Agora, a Câmara não fez. Estranho, né?

O presidente Jair Bolsonaro (PL), durante reunião com embaixadores: Reprodução

CC: O senhor acredita que reagir a essa reunião com os embaixadores e propor uma mobilização na rua neste momento seria ruim?

MT: É entrar na provocação, na armadilha dele. Não seria ir para a rua, na parte objetiva. Agora eu acho que tem que se manifestar, fazer notas com as entidades, chamar a sociedade civil para estar discutindo. Isso faz parte. Agora, eu não vejo ainda essas manifestações [de rua].

CC: Até a eleição, o senhor acredita que em alguma hora será o momento para os movimentos sociais irem para as ruas?

MT: A gente tem que ir medindo essa temperatura. Tem uma hora que vai ter que ser. Agora, se você for a ferro e fogo, toda semana tem que fazer manifestação. É o que ele quer. Ele quer manter essa espuma. Eu sei que tem uma expectativa muito forte para o 7 de Setembro. Até lá, nós temos que ver o que fazer e como fazer. Também não podemos fazer loucura. A turma dele é louca, nós não somos. Nós temos responsabilidade.

CC: O senhor acredita que o presidente Jair Bolsonaro pode dar um golpe?

MT: Ele pode até querer, mas é muito difícil. A sociedade brasileira está madura e consciente. Tudo demonstra que, em um golpe, ele não teria apoio de ninguém internacionalmente. Ele já é isolado. Se ele der um golpe, pior ainda. Talvez haja tentativas de alguma confusão, agora, não creio que ele terá condições. Setores mais conservadores também estão criticando as ações do presidente.

CC: Mas, quando o presidente toma essas ações e não é punido, ele não estaria avançando com a sua ofensiva?

MT: Na questão de punição, talvez o modo mais correto seria o Supremo interpelá-lo, dentro da democracia. Talvez deram muita corda para ele. Muitas coisas aconteceram e poderiam ter sido barradas pelo próprio Judiciário. Agora, a mobilização da sociedade, se tiver que acontecer, vai acontecer no momento certo.

O que estou dizendo é que a gente não pode entrar na provocação. Ele quer que o pessoal comece a xingar, a brigar. Até em festa de aniversário estão matando gente, você imagina em uma coisa mais organizada e forte. É preciso ter cuidado. Ele não vai parar. Ele fez isso ontem, deve fazer mais alguma coisa nesta semana. Temos que medir no dia a dia. Mas isso não tira de nós a questão de estar alerta.

Por exemplo, em todo ataque, o Fachin mostra a lisura do pleito. Ontem, o Fachin respondeu a questionamentos logo depois da reunião. Então, o TSE está correto. Temos que divulgar isso, mostrar para a população que é seguro. Nas centrais, podemos pensar em fazer uma nota internacional dentro da OIT, mostrando isso. É uma coisa que podemos fazer. Mas do ponto de vista das manifestações, elas vão acontecer, dentro do momento certo e com muito cuidado.

O ministro Edson Fachin. Foto: Rosinei Coutinho/SCO/STF

CC: No ano passado, houve sucessivas manifestações com muitas pessoas na rua. Neste ano, não houve nenhuma como aquelas. Tem quem diga que os movimentos perderam força, tem quem diga que perderam o interesse em realizar novas manifestações. O que mudou do ano passado para cá?

MT: Eu não vejo assim, não. As manifestações e ações estão acontecendo. Do ano passado para cá, os movimentos sociais fizeram muitas ações na área da solidariedade. Não ficaram parados. Houve arrecadações de alimentos, roupas. Tem ações, sim. Talvez não essas ações de confronto. Isso não tem, mesmo. Provocar uma manifestação no 7 de Setembro para confrontar a manifestação do Bolsonaro não é razoável, do ponto de vista do que pode acontecer. Temos que achar outros caminhos de se manifestar e de levar as nossas posições para a população. Só fazer para confronto é tiro no pé. Mas não é porta fechada. Estamos avaliando fatos por fatos.

CC: O senhor diz que ir para a rua seria um confronto. Isso não pode ser interpretado como um modo de colocar em segundo plano a importância da rua neste momento?

MT: Não, não. Eu não quis dizer que é um confronto. É que não podemos entrar na provocação dele. Na hora que entrarmos na provocação dele, estaremos no campo dele. Então, a hora que fizermos as manifestações, tem que ser muito bem feitas e organizadas. Eu não estou falando que não vai ter. Nós não podemos é fazer pela provocação.

Está se discutindo a questão do 7 de Setembro. Tem centrais a favor, tem centrais que acham que não, tem movimentos sociais que acham que não, tem movimentos que já têm marcado o Grito dos Excluídos. Tem coisas sendo conversadas. Agora, do ponto de vista imediato sobre a reunião dos embaixadores, ainda não conversamos. Nesta semana, podemos conversar.

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