Impeachment ou cassação da chapa? Saída de Bolsonaro volta à pauta

Crise ambiental, alta da desaprovação do governo e CPI das Fake News ressuscitam conjecturas

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Em conversa a portas fechadas em 26 de agosto sobre o País e o governo, Jair Bolsonaro comentou: “Eu vou embora do Brasil”. Quem o ouvia quis entender o que ia por sua cabeça: “Vai levar quem?”A resposta foi uma daquelas homofobias presidenciais: “Sou hétero, só minha mulher”. O interlocutor saiu com a impressão de que Bolsonaro já assimila a ideia de não terminar o mandato.

Na véspera, Eduardo Bolsonaro havia tuitado sobre a necessidade de o pai usar a web para enfrentar jornalistas, os quais retratariam o presidente como igual a antecessores. “Quando as pessoas forem hipnotizadas para ter este pensamento será o fim. Sairá o único presidente eleito sem amarras, capaz de mudar o sistema, e entrará um bundão a servir este establishment”, escreveu o deputado.

Por “bundão”, presume-se que se referia ao vice-presidente. Hamilton Mourão foi personagem em Brasília quando, entre o fim de março e o início de abril, figurões discutiam se o País aguentaria quatro anos de Bolsonaro. Uma história contada na edição de CartaCapital que circulou em 29 de março. Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), falou disso abertamente à Veja em agosto.

Pois a queda de Bolsonaro voltou a ser assunto em Brasília, no embalo da crise amazônica e do avanço de sua impopularidade. No dia em que ele falou em deixar o País, soube-se que 39% dos brasileiros acham seu governo ruim ou péssimo, 10 pontos acima dos que acham bom ou ótimo. Aprovação e desaprovação caminhavam juntas desde abril, pelos 30%, 32%.

(Valter Campanato/EBC)


Advogado e ex-juiz, o deputado Luiz Flávio Gomes, do PSB paulista, diz: será difícil Bolsonaro reverter a impopularidade, vai chegar a hora de apresentar um pedido de impeachment. E ele, Gomes, diz que apresentará. “A lei do impeachment, a 1.079, de 1950, prevê 67 hipóteses de crime de responsabilidade. O Bolsonaro já violou umas 20. Ele vai cair pelo conjunto da obra”, afirma.

Impeachment no Congresso? Ou cassação da chapa Bolsonaro-Mourão? Há no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) uma ação a pedir a cassação por disseminação de mentiras na campanha. A ação tende a ser abastecida pela CPI das Fake News prestes a ser instalada. O comando da investigação será da oposição. A relatoria da CPI deverá ficar com a deputada Lídice da Mata, do PSB da Bahia.

CartaCapital ouviu de dois deputados de partidos diferentes que depor Bolsonaro no TSE talvez seja a melhor solução para as elites políticas. A começar pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia, do DEM do Rio, articulador da criação da CPI, proposta por um deputado do DEM, o paulista Alexandre Leite.

Se Bolsonaro sofrer impeachment, Mourão assume, e este é visto como lobo em pele de cordeiro. Se o ex-capitão cair no TSE, Mourão cai junto. Se a chapa fosse cassada até 2020, haveria nova eleição direta. De 2021 em diante, eleição indireta, restrita a parlamentares. E, nesse caso, o favorito seria Maia. Assumir o Palácio do Planalto não seria uma boa para Maia disputar o poder em 2022?

“O debate sobre a permanência do Bolsonaro é inevitável”, diz o líder do PT no Senado, Humberto Costa, de Pernambuco. O PT, recorde-se, era contra quando o tema ensaiou despontar, há cinco meses. Era cálculo político. Bolsonaro em cena ajudaria os petistas eleitoralmente. “Parece que as elites já perceberam que o Bolsonaro é um estorvo, veja o agronegócio”, afirma Costa.

Eleitor do ex-capitão em 2018 e ex-ministro da Agricultura, o fazendeiro Blairo Maggi vê estragos rurais com a crise amazônica. Agora há risco lá fora para um setor que cresceu só 0,1% no primeiro semestre. “Os setores exportadores tiveram grande trabalho de refazer essa imagem do Brasil e mostrar que temos controle de desmatamento e de todas questões ambientais. Tínhamos conseguido superar bem esse assunto. Mas agora teremos que refazer tudo isso”, disse Maggi à BBC.

“A base de sustentação desse governo é frágil. Por isso, lamentavelmente, não se pode descartar que a gente tenha de enfrentar o debate sobre o afastamento do presidente”, diz o líder da oposição no Senado, Randolfe Rodrigues, da Rede do Amapá. “O que sustenta esse governo são o Paulo Guedes e o Sergio Moro. Se eles saírem, não vai sobrar nada.”

Guedes é o ministro da Economia. No primeiro semestre, o PIB cresceu só 0,7%. Na pesquisa que constatou 39% de desaprovação do governo, a CNT/MDA, a impopularidade é de 48% entre os mais pobres (renda até 2 salários mínimos). Metade dos brasileiros dizia ter medo de perder o emprego. O otimismo com a abertura de vagas era de 51% em fevereiro e caiu a 36% em agosto.

O ministro da Justiça é outro que garante pontos de aprovação ao governo e que parece bambear no cargo. Bolsonaro não para de desmoralizar Moro, já enrascado em conversas secretas de seu tempo de juiz da Operação Lava Jato, reveladas pelo Intercept. Em Brasília, circula que, se Moro quiser sair, João Doria, o governador tucano de São Paulo, o receberia de braços abertos na equipe.

Quanto menor for o ibope do ex-capitão, mais à vontade estarão as elites políticas e econômicas para contestar a permanência dele no poder.

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