Política

IBGE recorre à AGU e diz que o Censo 2022 terá que ser adiado caso inclua questões sobre orientação sexual

Segundo o instituto, não há tempo hábil e recursos disponíveis para que as mudanças metodológicas necessárias sejam feitas ainda neste ano

IBGE sofre crise orçamentária e falta de reposição de trabalhadores temporários. Foto: Divulgação/Agência IBGE de Notícias
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A edição 2022 do Censo Demográfico do IBGE pode sofrer seu terceiro adiamento consecutivo.

O motivo: o instituto é contra a inclusão de questões sobre orientação sexual e identidade de gênero no Censo deste ano. Não por qualquer razão de cunho preconceituoso, mas pela falta de tempo e de recursos para fazer as alterações necessárias na pesquisa.

O IBGE entrou com recurso junto à Advocacia-Geral da União, para tentar derrubar a decisão da Justiça Federal do Acre, que determinou a adição dessas informações no Censo 2022. 

Segundo o instituto, as mudanças “podem diminuir significativamente a produtividade do recenseador e elevar o tempo de coleta como um todo, aumentando o gasto com mensalistas, aluguéis, dentre outros.” Além disso, questões relacionadas a identidade sexual e de gênero já estariam abarcadas no conjunto de pesquisas que compõem o Sistema Integrado de Pesquisas Domiciliares do IBGE.

“Inserir tais quesitos em um Censo Demográfico, em cima da hora, sem prévios estudos, testes e treinamentos, seria ignorar a complexidade e o rigor de uma operação censitária do porte continental da brasileira – cuja discussão e elaboração dos questionários e sucessivos planejamentos e preparações se iniciaram em 2016.”

A realização da pesquisa está prevista para 1º de agosto. O levantamento foi adiado em 2020 por conta da pandemia de Covid-19 e em 2021 pela falta de orçamento. 

O último levantamento realizado pelo IBGE aconteceu há dez anos.  O Censo é responsável pelos dados populacionais, socioeconômicos e étnicos de toda a população brasileira. 

Leia o comunicado na íntegra:

“Sobre a decisão da Justiça Federal do Acre, o IBGE informa que, a menos de dois meses do início da operação do Censo Demográfico 2022, não é possível incluir no questionário pergunta sobre “orientação sexual/identidade de gênero” com técnica e metodologia responsáveis e adequadas – muito menos com os cuidados e o respeito que o tema e a sociedade merecem.

Haverá impacto financeiro severo, especialmente se for constatada a necessidade de mudança metodológica, caso as perguntas precisem ser respondidas individualmente – exigindo que as informações sejam coletadas com a própria pessoa – o que aumentaria a necessidade de revisitas, correndo o risco de inviabilizar a operação censitária. Essas mudanças podem diminuir significativamente a produtividade do recenseador e elevar o tempo de coleta como um todo, aumentando o gasto com mensalistas, aluguéis, dentre outros.

Ademais, os quesitos relacionados à “identidade de gênero” e “orientação sexual” já estão previstos para investigação no conjunto de pesquisas que compõem o Sistema Integrado de Pesquisas Domiciliares do IBGE, a saber: Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua), no primeiro trimestre de 2023; Pesquisa Nacional de Demografia em Saúde (PNDS), que irá a campo no segundo trimestre de 2023; Pesquisa Nacional de Saúde (PNS), prevista para ir a campo em 2024; e na próxima edição da Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF).

Inserir tais quesitos em um Censo Demográfico, em cima da hora, sem prévios estudos, testes e treinamentos, seria ignorar a complexidade e o rigor de uma operação censitária do porte continental da brasileira – cuja discussão e elaboração dos questionários e sucessivos planejamentos e preparações se iniciaram em 2016.

Trata-se de coletar informações em cerca de 76 milhões de domicílios. Para isso, o IBGE vem contratando e capacitando mais de 200 mil recenseadores, que vão bater de porta em porta, já a partir de 1º de agosto. Uma operação que já mobilizou governos (federal, estadual e municipal), Assembleias Legislativas, Câmaras Municipais, Forças Armadas, Guardas, Brigadas, Polícias Militares e outras instâncias públicas incluindo organismos internacionais e organizações não governamentais. Que conta ainda com outros setores privados. Todos os processos exigiram e envolveram – a longuíssimo prazo – conversações e negociações estratégicas, com etapas de refinamentos minuciosamente desenhadas.

O IBGE fez no ano passado os testes de homologação dos sistemas – tudo completamente e devidamente pronto. A avaliação dos técnicos responsáveis é que alterar esses sistemas agora, para inclusão intempestiva, põe em risco considerável toda a operação censitária. A medida pode gerar impactos não estimados, no tempo e na qualidade das respostas dos entrevistados; e, evidentemente, causará aumento de custos (recursos federais) não contemplados no orçamento previsto para o Censo 2022: cerca de 2,3 bilhões de reais.

Seria irresponsabilidade arriscar a integridade do Censo Demográfico enquanto principal pesquisa do país, ainda que por iniciativa inspirada em legítimas causas e boas intenções. De tal modo, o IBGE reafirma seu compromisso com a qualidade das pesquisas que realiza já há 86 anos, sempre com a missão histórica de retratar o Brasil e subsidiar políticas públicas com dados relevantes.

Nesse caso – para dar cumprimento escorreito à liminar da Justiça do Acre – restaria ao IBGE, como única alternativa possível, o adiamento do Censo 2022. O IBGE tem ciência de que um novo adiamento do Censo imporá vultosos impactos financeiros e sociais, inclusive prejudicando vários planejamentos nacionais, como a repartição das verbas dos Fundos de Participação dos Estados (FPE) e Municípios (FPM), além de repasses de verbas destinadas a programas sociais.

Tecnicamente e metodologicamente, um Censo não pode ser levado a campo partindo de um questionário não estudado, não testado e com equipe não devidamente treinada.

Dessa forma, o IBGE acionou a AGU (Advocacia Geral da União) para recorrer da decisão e evitar o adiamento do Censo 2022.”

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