Governo Bolsonaro ignora TCU e fecha contrato de R$ 450 milhões em licitação suspeita

Segundo a Corte, a gestão federal não teve ‘prudência’ e adotou uma ‘conduta reprovável’ ao assinar o documento

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O governo do presidente Jair Bolsonaro (PL) assinou um contrato de 450 milhões de reais para serviços de publicidade em uma licitação que é investigada pelo Tribunal de Contas da União. As informações são do jornal Folha de S. Paulo desta segunda-feira 18.

A suspeita é de que a Calia/Y2 Propaganda e Marketing, empresa vencedora, tenha sido favorecida na licitação, algo informado ao governo no dia 9 de maio. No dia 15 de junho, o TCU pediu ao governo que a licitação fosse interrompida para que pudesse fazer novas apurações. Seis dias depois, o governo informou à Corte que, mesmo sabendo das suspeitas, já teria assinado no dia 25 de maio o contrato de quase meio bilhão de reais.

O documento foi assinado pela Secretaria Especial de Comunicação e visa divulgar ações positivas do atual governo. Vale lembrar que a empresa chegou a ser alvo da CPI da Covid no Senado por suspeitas de que teria recebido recursos públicos para financiar sites que divulgavam fake news. Ela também foi um dos alvos da investigação da Polícia Federal que apontaram empresas de publicidade que teriam sido financiadas pelo governo para promover atos antidemocráticos.

Neste caso mais recente, o TCU estaria apurando o formato das avaliações conduzidas por integrantes do governo, que deram notas idênticas no processo. A suspeita é de que a análise da proposta da empresa tenha sido feita de forma coletiva e não individualizada como manda a lei.

Há ainda uma denúncia de que a diretora de atendimento da Calia, Alessandra Matschinski, e Peter Erik Kummer, então subsecretário de Gestão e Normas da Secom, tenham vínculos conjugais. Ele foi exonerado do cargo no dia 24 de março deste ano, um dia antes das suspeitas passarem a circular na imprensa.

Os dois itens estavam sendo apurados pelo tribunal. A assinatura em meio a apuração do TCU, portanto, causou perplexidade e irritação no ministro Weder de Oliveira, relator do caso. Ele usou a sessão plenária do tribunal para se queixar da ‘manobra’ do atual governo.


“A conduta [da Secom] observada foi oposta à esperada por esta Corte, de prudência e colaboração: o procedimento licitatório foi encerrado rapidamente, na vigência do prazo para manifestação em oitiva prévia, omitindo-se o órgão de prestar a este tribunal essa informação de suma importância, sem qualquer justificativa, tanto para a omissão, quanto para a homologação célere”, afirmou o ministro na sessão.

Para o relator, o governo se aproveitou de uma brecha processual para assinar o contrato. Isso porque a licitação foi concluída no período em que o TCU ainda estava analisando as suspeitas iniciais antes de decidir pela manutenção ou não do pedido de suspensão do processo. A brecha, inclusive, impede que a Secom seja multada.

Segundo Oliveira, essa não é a primeira vez que o governo Bolsonaro toma atitude semelhante, o que já teria ‘corroído a confiança’ entre TCU e a atual gestão.

“Situações como essa que trago ao conhecimento de Vossas Excelências são deletérias e corroem a confiança na colaboração mútua entre controlador e controlado e nos tornam reticentes acerca da possibilidade de conceder prazos que, ao invés de contribuir para desejados esclarecimentos, podem ser utilizados para consumar os fatos e frustrar a eficácia das deliberações desta Corte.”

Procurados, os envolvidos na licitação não se pronunciaram ao jornal. Apesar da assinatura, o caso segue em apuração no TCU.

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