Política
Ganharam contra um Nordeste que pede o que Lula deu: paz, trabalho e renda
Um verme fatal para a democracia não foi percebido por quase 58 milhões de brasileiros


“Não se deve diminuir as abrangência e importância do evento, mas na próxima coluna serei menos repórter e mais crítico. Inté”. Prometia um terceiro artigo sobre o II EsalqShow, em Piracicaba, onde comentaria certos autoelogios exagerados ao nível de excelência da atual agricultura.
Veio o dia 28 de outubro e derrubou minha intenção, pois no Canto 1 de “Os Lusíadas”, Luís Vaz de Camões (1524(?)-1580) chamou-me à atenção:
Cesse tudo o que a Musa antiga canta,
Que outro valor mais alto se alevanta
(…)
Que não se arme e se indigne o Céu sereno
Contra um bicho da terra tão pequeno?
Um verme fatal para a democracia não foi percebido por quase 58 milhões de brasileiros. E aonde? Mesmo que o saibam, não precisarão usar as quatro operações aritméticas. Basta distinguirem cores nos mapas eleitorais apresentados em folhas e telas cotidianas. Mais uma vez, o eleitorado esteve dividido entre regiões pobres e ricas. Os primeiros pedem clemência, os outros lhes entregam opressão.
Sim, embora os estados do Sul e do Centro-Oeste já o indiquem, estratificadas fossem as atividades de seus eleitores, transparências ruralistas seriam percebidas no capitão do mato, nascido paulista e parasitado carioca.
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Foram eles. Sabem o quanto ganharão. Não em armas, que estas já possuem aos montes, mas em causas quando continuarem com a matança de assentados, caboclos, campesinos, indígenas, quilombolas e sertanejos. Todos esses “vagabundos que não servem nem para a procriação quanto mais para trabalharem”.
Sabem os leitores e leitoras de minhas Andanças Capitais. Pois não há casa de ruralista, amigo ou não, que não tenha uma arma, quando não coleções delas, tanto faz se legalizadas ou não, é de seus espíritos, convicções, e mentem ao dizerem ser para defesa própria. É prazer!
E contra quem haveriam de se defender? Cacos-velhos humanos? O lúmpen rural? Dos fiscais do Ministério do Trabalho que não deverão mais incomodá-los, pois cedido a alguma raposa patronal? Ou temem o Movimento dos Trabalhos Sem Terra (MST) que definhou a partir da ex-presidente Dilma Rousseff? Só não se importam com o empobrecimento rural em massa, exposto no último Censo Agropecuário.
Porra nenhuma! As armas, que vocês já têm, servirão para entregar aos seus jagunços, pois nem coragem de usá-las por conta própria têm. Depois é só pagar advogados capazes de fechar conluios com policiais e livrarem a cara do “empregado”.
Chega de conflito no campo, né? Para isso ganharam contra um Nordeste que pede o que Lula lhes deu: Paz, Trabalho e Renda.
Essa parte do crime é de vocês.
A outra parte pertence aos dândis e madames do “nem um nem outro”. Do fugidio #EleSNão, recordistas do “não voto”, por ausência, brancura ou abstenção.
Ele com a camisa polo de enorme brasão, ela de jeans apertadinho com celular no bolso-bunda. Se pobres, o casal chinelo de dedo, bermudão ou shortinho, boné mastigado na aba, canoa ou a pé nos cus de mundo do nosso território, três crianças os seguindo e empatando chegarem até 17 horas.
Assim, forma ou outra, preferiram ou não conseguiram votar, 42,1 milhões de pessoas. O maior índice, desde 1989, 1/3 do total.
Branquearam, 2,4 milhões; anularam 8,6 milhões. Quase 10% do total. Seriam incapazes de teclar fora de um telefone celular?
Outros 31 milhões não foram votar (21,3%) do total. Pela diversidade do país, aqui não opino para não cometer injustiças. Teria que explicar uma alta de 22% sobre 2014? Descrédito nos políticos? Talvez.
Em números totais, o capitão reformado teve 36,4% dos votos e Fernando Haddad, 29,7%.
Aqui ao meu lado, alguém diz: poderiam ter feito diferença a favor de presidente e vice honestos, preparados, com futuro de estadistas.
Respondo: além de tudo, bonitos. Ou você se apaixonaria por Jair, mesmo sendo Messias, ou por Mourão sem estar envolto em arame far(d)pado?
Vem aí o terror fascista. Boa sorte.
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