Fim da linha para Ricardo Teixeira

Em uma carta de oito frases, Ricardo Teixeira renuncia e coloca fim a um reinado de 23 anos à frente da CBF

Ricardo Teixeira, agora ex-presidente da CBF. Foto: Jorge Adorno/Reuters/Latinstock

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Uma carta de renúncia entregue nesta segunda-feira 12 encerrou o reinado de 23 anos de Ricardo Teixeira na entidade máxima do futebol nacional.

Menos de uma semana após anunciar seu afastamento da CBF, a Confederação Brasileira de Futebol, alegando motivos de saúde, o cartola divulgou uma carta comunicando sua renúncia. Sem apoio no governo federal, e a pouco mais de dois anos para a Copa de 2014, ele não suportou a pressão diante das suspeitas de ter se beneficiado do cargo para enriquecer e deixou o comando do futebol. Teixeira, além de presidir a CBF, estava à frente também do Comitê Organizador Local, o COL, órgão responsável por gerenciar a organização do Mundial.

Em sua despedida, usou apenas oito frases, nas quais se queixava das críticas recebidas e afirmou ter feito o que estava em seu alcance, “sacrificando a saúde”. “Fui criticado nas derrotas e subvalorizado nas vitórias.”

A renúncia acontece no momento de tensão entre a Fifa, entidade máxima do futebol internacional, e a CBF (LEIA MAIS ). Desafeto do presidente da Fifa, Joseph Blatter, Teixeira pretendia sair como candidato à presidência da entidade em 2015, logo após a Copa, mas era boicotado por Blatter desde a última eleição da Fifa, quando apoiou Mohammed Bin Hamman, do Catar.

Pesava ainda  contra ele a suspeita de ter recebido suborno da ISL, empresa de marketing que controlava direitos de imagem das Copas do Mundo nos anos 1990. O resultado da investigação é mantido em sigilo na Suíça, sede da entidade – mas quem acompanha o escândalo garante que seu teor poderia vir a público a qualquer momento, com a ajuda de Blatter. A exposição deixaria Teixeira sem condições de comandar a CBF e o COL às vésperas do megaevento no Brasil.

Em fevereiro, Teixeira foi citado em outro escândalo: o de ter sido beneficiado com dinheiro público que bancou um amistoso supostamente superfaturado entre Brasil e Portugal, no Distrito Federal.


A empresa organizadora da partida, a Ailanto Marketing, foi contratada sem licitação pelo governo local – administrado por José Roberto Arruda, preso e investigado no chamado “Mensalão do DEM”.

Em reportagem recente, a Folha de S.Paulo mostrou os elos entre o cartola e a empresa, que pertence ao espanhol Sandro Rosell, presidente do Barcelona, ex-diretor de marketing da Nike no Brasil e padrinho de casamento de Teixeira. O agora ex-manda-chuva da CBF é acusado de ter recebido dinheiro da Ailanto após o amistoso.

A má notícia para os torcedores brasileiros é que o substituto de Teixeira será o ex-governador paulista José Maria Marin – que, em 25 de janeiro deste ano, foi flagrado embolsando uma medalha em meio à premiação dos campeões da Copa São Paulo de juniores.

Em sua carta de despedida, Texeira escreveu:

“Ser presidente da CBF durante todos esses anos representou na minha vida uma experiência mágica. O futebol, no Brasil, é mais que esporte, mais que competição. É a paixão que envolve, é o sofrimento que alegra, é a fidelidade que unifica.

Por essas razões, pensei muito na decisão que ora comunico e pensei muito no que dizer sobre minha decisão.

Presidir paixões não é tarefa fácil. Futebol em nosso país é sempre automaticamente associado a duas imagens: talento e desorganização. Quando ganhamos, despertou o talento. Quando perdemos, imperou a desorganização.

Fiz, nestes anos, o que estava ao meu alcance, sacrificando a saúde, renunciando ao insubstituível convívio familiar. Fui criticado nas derrotas e subvalorizado nas vitórias. Mas isso é muito pouco, pois tive a honra de administrar não somente a Confederação de Futebol mais vencedora do mundo, mas também o que o ser humano tem de mais humano: seus sonhos, seu orgulho, seu sentimento de pertencer a uma grande torcida, que se confunde com o país.

Ao trazer a Copa de 2014, o Brasil conquistou o privilégio de sediar o maior e mais assistido evento do mundo, se inseriu na pauta mundial, alavancou mais a economia e aumentou o orgulho de todo o povo brasileiro.

Tentei, no limite das minhas forças, organizar os talentos. Nas minhas gestões, criamos os campeonatos de pontos corridos e a Copa do Brasil, aumentamos substancialmente as rendas do futebol brasileiro, desenvolvemos o marketing e, principalmente, vencemos.

Hoje, deixo definitivamente a presidência da CBF com a sensação do dever cumprido. Não há sequência de ataques injustos que se rivalizem à felicidade de ver, no rosto dos brasileiros, a alegria da conquista de mais de 100 títulos, entre os quais duas Copas do Mundo, cinco Copas América e três Copas das Confederações. Nada maculará o que foi construído com sacrifício, renúncia e dor.

A mesma paixão que empolga, consome. A injustiça generalizada, machuca. O espírito é forte, mas o corpo paga a conta. Me exige agora cuidar da saúde.


Em obediência ao estatuto da CBF, mais precisamente ao disposto em seu artigo 37, você, meu vice-presidente e ex-governador de São Paulo, José Maria Marin, passa a presidir a CBF. A você, desejo sorte, para que o talento se revele na hora certa; discernimento, para que o futebol brasileiro siga cada vez mais organizado e respeitado; e força, para enfrentar as dificuldades que certamente virão.

Deixo a CBF, mas não deixo a paixão pelo futebol. Até por isso, a partir de hoje e sempre que necessário, coloco-me à disposição da entidade. Reúno-me com mais força à minha família, que entendeu minha missão, apoiou-me sempre e me faz ainda mais feliz.

Agradeço de maneira especial aos presidentes de clubes e das federações estaduais, aos dirigentes e colaboradores da CBF, amigos leais em quem sempre encontrei apoio incondicional para o desempenho de meu trabalho.

À torcida brasileira, meu muito obrigado. Nunca me esquecerei das taças sendo erguidas. Elas estão no coração de cada um de nós. Elas são um pedaço do Brasil.”

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