Política

Esther Solano: ‘Nenhum dos lados se sente contemplado pela imprensa’

Pesquisa realizada em ato de 31 de março revela pouca satisfação com governo Dilma, mas maior confiança nos partidos e nos políticos

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Mais da metade (55%) dos participantes do protesto em favor da democracia em 31 de março e contrários ao impeachment de Dilma Rousseff concordam com a frase: “O juiz Sérgio Moro é filiado ao PSDB”.

A afirmação, presente no questionário aplicado em 508 pessoas ao longo da manifestação, faz parte do levantamento realizado pela pesquisadora da Unifesp, Esther Solano, sobre a confiança nas instituições, soluções para crise, atitutes políticas em temas morais e polarização em grandes protestos de massa no Brasil.

Para a cientista social, o alto índice de credibilidade ao boato sobre o juiz Sérgio Moro e outras como “os protestos contra a corrupção são articulados pelos Estados Unidos para se apropriar do pré sal” (apoiada por 56% dos entrevistados), revelam que a baixa confiança nas informações fornecidas pela grande imprensa (que tem a desconfiança de 95% dos participantes do ato contra o impeachment) e deixa o espaço aberto para a desinformação.

Para ela, a falta de confiança nas informações fornecidas pela imprensa abre caminho para a afirmação das redes sociais como espaço de formação de opiniões políticas, o que, na visão dela, pode ser problemático.

“O que se tem agora nas redes são bolhas ideológicas, em que você só compartilha informações polarizadas que desqualificam o outro lado”, afirmou. “Ninguém se sente contemplado pela imprensa, os manifestantes, de um lado e de outro, não sentem que ela informa de maneira séria e profissional”.

Perguntados sobre as fontes de informação sobre política, 56,7% declararam que utilizam muito o Facebook para se informarem. O Whatsapp foi citado na mesma categoria por 21,9% e o Twitter, por 11%.

No grupo pró-impeachment, há também um alto índice de concordância com boatos a respeito do PT e de suas políticas sociais. Cerca de 64% concordam com a afirmação de que o partido teria a intenção de implantar um regime comunista no Brasil, 70% acreditam que cotas nas universidades geram mais racismo e 53% que o PCC é um braço armado do PT, revelam informações colhidas em 12 de abril no ato que pede a saída de Dilma do governo.

O perfil dos manifestantes do dia 31 revela que grande parte dos que aderiram ao ato pertencem a famílias de classe média, com o maior contingente recebendo entre R$4.400 e R$8.800 de rendimentos mensais.

A maioria (60%) declarou-se branca, mas apresenta maior continente de pretos e pardos (12,2% e 22,7%, respectivamente) do que o verificado no ato do dia 12 de abril, favorável ao impeachment. Nesse último, apenas 18,2% declararam-se pretos ou pardos.

Em ambos os grupos, a maior presença foi de pessoas com alto grau de escolarização. Em 31 de março, 58,1% possuiam Ensino Superior completo. O segundo maior grupo era daqueles que ainda não completaram a graduação (18,9%), seguido por aqueles com Ensino Médio completo: 14,2%.

Já no dia 12 de abril, 68,5% haviam se formado em uma instituição de Ensino Superior, seguido pelo grupo com Ensino Médio completo (13,5%) e os com Superior incompleto (11,6%).

Uma diferença observada entre os dois grupos foi o nível de confiança nos partidos e nos políticos. No dia 31 de março, 55,5% dos entrevistados afirmaram que “confiam pouco” nos partidos políticos, ante 36,6% que dizem não confiar. Outros 66% depositam sua confiança em figuras políticas e 77% disseram confiar nos movimentos sociais.

Entre os partidos que gozam de maior confiança entre os manifestantes estão o PT (40% “confia muito” e 46,5% “confia pouco”) e o PSOL (32,5% confia muito e 42,3% confia pouco). Partidos de oposição ao governo Dilma, como PSDB, e que até pouco tempo faziam parte da base alidada, como o PMDB, carregam altos índices de desaprovação por parte dos defensores do governo – 93,7% não confiam nos tucanos, mesmo índice observado com relação ao PMDB.

A REDE, de Marina Silva, foi o partido mais desconhecido (18,3% não tinha ouvido falar) e também pouco confiável na visão dos participantes do protesto (65,4% não confiam na legenda).
Já entre os defensores do impeachment presentes no dia 12 de abril, 73% declararam não confiar em partidos e 69,9% desconfiam de políticos.

O PT recebe a maior desconfiança, com 96% afirmando que não confiam no partido, seguido pelo PMDB (81,8%) e o PSOL (77,1%). No entanto, mesmo partidos identificados com o impeachment de Dilma, como o PSDB, recebem pouco crédito. No caso dos tucanos, 47,6% não confia e 41,2% confia pouco.

Apesar da adesão ao protesto que defende a permanência da presidente Dilma Rousseff, metade (50,8%) dos manifestantes declararam estar pouco satisfeitos com o atual governo, 37% sentem-se muito satisfeitos e 10,6% declararam estarem “nada satisfeitos” com o desempenho da presidente.

A respeito das soluções apontadas para a crise política, grande parte dos manifestantes contrários ao impeachment defendem saídas dentro do jogo democrático.

“Fortalecer organizações comunitárias como as ONGs e os movimentos sociais” foi uma opção defendida por 67% dos entrevistados, ao lado da sugestões ligadas à participação democrática mais direta, como consultas e plebiscitos à população, defendida por 49% dos manifestantes.

Por outro lado, opções como “entregar o poder aos militares” foi rechaçada por 96,9% dos contrários ao impeachment, assim como “entregar o poder para alguém fora do jogo político”, desaprovada por 83%, e entregar para um juiz honesto, recusada por 88%.

Outro dado interessante refere-se à maior confiança depositada no prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT-SP), do que no ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Haddad recebe “muita confiança” de 73,8% dos entrevistados, Lula, 68%. Integrante da ala de oposição à esquerda do governo, o deputado federal Jean Willys (PSOL-RJ) também goza de crédito entre os contrários ao impeachment: 58% confiam muito.

Para Esher Solano, parte da explicação está na faixa etária dos defensores da permanência do governo Dilma. Há um maior peso de jovens e universitários, cuja atividade política começou na era pós-Lula. “É um PT Dilma, que não consegue ser muito engajador”, explica.

Já o prefeito de São Paulo e Jean Willys são figuras menos identificadas com seus partidos e que carregam bandeiras suprapartidárias, como o direito à cidade e os direitos LGBT. “Os jovens se identificam com esses políticos menos tradicionais e se sentem mais a vontade com essas bandeiras suprapartidárias”.

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