Política

Entenda a crise e as razões da revolta de servidores no Rio de Janeiro

Categorias mobilizam-se contra pacote de austeridade proposto pelo governador Pezão e aumentam a pressão sobre os deputados da Alerj

Apoie Siga-nos no

A ruína da crise financeira no Rio de Janeiro e o pacote de austeridade anunciado pelo governador Luiz Fernando Pezão (PDMB-RJ) no início de novembro catalizou uma série de manifestações protagonizadas por diversas categorias de servidores públicos no estado.

Na última quarta-feira 16, mobilização em frente à Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj) reuniu milhares de manifestantes. Em clima tenso, houve tentativa de invasão do Palácio Tiradentes e ação violenta da polícia com bombas de efeito moral e de gás lacrimogênio, além de balas de borracha. Houve feridos, entre eles, quatro jornalistas que cobriam o ato. 

As medidas, a incluir o fim de programas sociais e a cobrança de uma taxa de 30% sobre os salários dos funcionários públicos, serão discutidas e votadas pelos deputados da Alerj antes do final do ano. Entenda os principais pontos da crise: 

1) Qual é a principal causa dos embates entre servidores e o governo do Rio?
O estado passa por uma grave crise financeira. Diante da situação, o governo anunciou um pacote de austeridade com medidas impopulares, como o aumento de impostos, a cobrança do desconto de 30% dos salários dos funcionários e das pensões dos aposentados durante 16 meses, o fim dos restaurantes populares e o reajuste da tarifa do bilhete único de 6,50 para 7,50 reais.

As propostas ainda precisam ser debatidas e aprovadas pelos deputados estaduais, na forma de 21 projetos de lei. A expectativa é que as discussões se estendam até 30 de novembro e que as votações sejam iniciadas na primeira semana de dezembro.  

O anúncio do pacote no início de novembro deflagrou uma série de manifestações contrárias às resoluções, marcadas pela violência policial e aumentando a pressão política sobre o governo fluminense. Entre as categorias que estão mobilizadas contra as medidas estão os servidores nas áreas de educação, saúde e justiça, além de policiais, bombeiros, aposentados e pensionistas. 

2) Por que o Rio de Janeiro passa por uma crise financeira tão grave?
Trata-se de uma conjunção de fatores. Um dos principais pontos é a queda de arrecadação e no recebimento dos royalties pela exploração do petróleo. A concessão de incentivos fiscais é apontada por alguns como uma das causas da crise, mas não há unanimidade sobre o assunto. Os incentivos permitiram atrair empresas que geram arrecadação e empregos. De acordo com o Tribunal de Contas do Estado (TCE), o Rio concedeu 138 bilhões de reais em renúncia fiscal entre 2008 e 2013.

No caso do petróleo, houve nos últimos anos uma queda significativa nos preços. Em 2014, o barril do petróleo custava 110 dólares e chegou a valer 150 dólares. Em janeiro de 2016, o barril chegou a ser cotado a 30 dólares. 

Com relação à arrecadação dos royalties, também houve queda. Segundo dados da plataforma Inforoyalties, alimentada com dados da Agência Nacional do Petróleo, em 2014 o estado do Rio de Janeiro recebeu 3,213 bilhões de reais. Em 2015, a quantia diminuiu para 2,308 bilhões e mingou ainda mais em 2016: 1,404 bilhão.

A crise econômica brasileira, que levou à queda na arrecadação do ICMS, e a do setor petroleiro, motivada pelos escândalos de corrupção na Petrobras investigados pela Operação Lava Jato, ajudam a complicar o quadro. No caso do ICMS, houve queda de 9,4% na arrecadação do tributo entre 2014 e 2015.

3) Além dos fatores mencionados anteriormente, há outras causas?
O economista Mauro Osorio, coordenador do Observatório de Estudos sobre o Estado do Rio de Janeiro da Faculdade de Direito da UFRJ, contesta que o problema da crise carioca esteja ligado estritamente ao excesso de gastos públicos.

Ele aponta que o estado deixou de realizar novos concursos por décadas e questiona a disparidade entre os salários dos servidores do Legislativo e do Judiciário, que, em comparação com estados como São Paulo e Minas Gerais, chega a ser 70% maior.

Nos cálculos do economista, feitos a partir de dos dados das secretarias estaduais da Fazenda em São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro, para custear o Legislativo e o Tribunal de Contas do Estado, o governo gastou, em 2015, 76,88 reais por habitante. No caso paulista, o poder público desembolsou 29,40. Já em Minas Gerais, gastou-se 55,64. 

Com relação aos gastos com o TCE, o Rio de Janeiro também gasta mais: desembolsou 239,44 reais por morador. Em São Paulo e em Minas Gerais, os valores são 188,39 e 169,30, respectivamente. O peso do Legislativo e do Judiciário nas contas do Rio também cresceu nos últimos dois anos, aponta o economista.

Em 2014, a Alerj e o TCE foram responsáveis por consumir 1,61% do total gasto. No ano seguinte, gastou-se mais, 1,93%. Já o Tribunal de Justiça é responsável por consumir 4,61% das receitas em 2014. Em 2015, consumiu-se 6%. 

4) Qual é o tamanho do rombo nas finanças estaduais?
De acordo com dados da Secretaria Estadual da Fazenda do Rio de Janeiro, o déficit atual está no patamar de 19 bilhões de reais. Deste valor, 12 bilhões estão relacionados com a Rio Previdência (responsável pelo pagamento das aposentadorias e pensões do serviço público) e 7 bilhões dizem respeito à dívida pública do estado. Para 2016, o orçamento previsto para o Rio é de 78,8 bilhões. 

5) Quais são as propostas do governo para tentar frear a crise?
Em 4 de novembro, o governador Luiz Fernando Pezão (PMDB-RJ) apresentou um pacote de medidas para conter a crise econômica no estado. Apelidado pelos críticos de “pacote de maldades”, entre as determinações, há a redução em 30% das gratificações em cargos comissionados, o aumento da alíquota previdenciária dos servidores de 11% para 14%. Um dos pontos mais criticados é o desconto de 30% dos salários de funcionários e das pensões dos aposentados por 16 meses.

6) Que outras áreas serão afetadas, caso o pacote seja aprovado pela Alerj?
Haverá a municipalização, isto é, o repasse da gestão, do estado para os municípios, das unidades do Restaurante Cidadão, que oferece refeições a preços populares. Também está na mira o fim do pagamento do aluguel social para 10 mil beneficiários – em geral, moradores de baixa renda que vivem em áreas de risco. Está previsto também reajuste de 15% na tarifa do Bilhete Único intermunicipal, que passará de 6,50 para 7,50 real. 

A proposta do governo também prevê o aumento de impostos como o ICMS para setores como cerveja (de 17% para 19%), fumo (25% para 27%), energia residencial (25% para 29%), refrigerante (de 16% para 18%) e telecomunicações (26% para 30%). Outra mudança é a redução do número de secretarias estaduais de 20 para 12 pastas.

 

ENTENDA MAIS SOBRE: , , , ,

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo

Apoie o jornalismo que chama as coisas pelo nome

Os Brasis divididos pelo bolsonarismo vivem, pensam e se informam em universos paralelos. A vitória de Lula nos dá, finalmente, perspectivas de retomada da vida em um país minimamente normal. Essa reconstrução, porém, será difícil e demorada. E seu apoio, leitor, é ainda mais fundamental.

Portanto, se você é daqueles brasileiros que ainda valorizam e acreditam no bom jornalismo, ajude CartaCapital a seguir lutando. Contribua com o quanto puder.

Quero apoiar

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo