Política

Em carta, deputados dos EUA veem democracia do Brasil em risco

Para parlamentares, Bolsonaro é ameaça aos direitos humanos e às minorias; prisão de Lula e autoexílio de Wyllys são citados como exemplo

Bolsonaro e o secretário de Estado americano, Mike Pompeo (Foto: EBC)
Bolsonaro e o secretário de Estado americano, Mike Pompeo (Foto: EBC) Bolsonaro e o secretário de Estado americano, Mike Pompeo (EBC)
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Preocupados com as ameaças à democracia no Brasil, trinta deputados americanos fizeram um alerta ao secretário Mike Pompeo – o principal articulador da política externa dos EUA – em relação ao presidente Jair Bolsonaro.

Em carta aberta, esses deputados cobram uma postura mais crítica do governo americano em relação ao novo presidente do Brasil. Até agora, a relação é amistosa e inclui encontros e trocas públicas de elogios.

Assinam o texto a deputada Alexandria Ocasio-Cortez, do Partido Democrata, e outros vinte e nove deputados.

Na visão dos signatários, Bolsonaro deu sinais consistentes de ameaça aos direitos das mulheres, indígenas e LGBTQ+. E, mais do que isso, coloca em risco a própria democracia do país. “Embora as eleições de outubro de 2018 tenham colocado Bolsonaro na Presidência, acreditamos que aqueles de nós que representam os Estados Unidos devem deixar claro que a fala e as ações que aumentam a divisão, o ódio e a exclusão ameaçam a democracia e suas instituições vitais”, afirma o documento.

A cassação dos direitos políticos de Lula é vista como exemplo desse fenômeno. Dizem os deputados: “Deveria preocupar a todos aqueles que estão comprometidos com a democracia brasileira que Bolsonaro foi eleito depois que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva – amplamente reconhecido como o líder político mais popular no Brasil – foi impedido de concorrer em circunstâncias polêmicas que colocam em risco o direito do povo do Brasil de escolher livremente seu presidente.”

O autoexílio do deputado Jean Wyllys (PSOL) também é citado, como “sinal claro do perigo enfrentado pela comunidade brasileira LGBTQ+”.

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Leia a seguir.

“Caro secretário Pompeo:

Estamos escrevendo para enfatizar publicamente a importância de defender os direitos humanos do povo brasileiro. Desde a eleição do candidato de extrema-direita Jair Bolsonaro como presidente, ficamos particularmente alarmados com a ameaça que a agenda de Bolsonaro representa para a comunidade LGBTQ+ e outras comunidades minoritárias, mulheres, ativistas trabalhistas e dissidentes políticos no Brasil. Estamos profundamente preocupados que, ao atacar direitos políticos e sociais duramente conquistados, Bolsonaro esteja pondo em perigo o futuro democrático do Brasil a longo prazo.

Como uma democracia ainda em desenvolvimento, o Brasil deve ser particularmente vigilante na proteção de suas instituições e na garantia da separação de poderes no país. Mesmo antes de Bolsonaro tomar posse, as tendências regressivas que pressionavam contra a democracia do Brasil eram claras. Deveria preocupar a todos aqueles que estão comprometidos com a democracia brasileira que Bolsonaro foi eleito depois que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva – amplamente reconhecido como o líder político mais popular no Brasil – foi impedido de concorrer em circunstâncias polêmicas que colocam em risco o direito do povo do Brasil de escolher livremente seu presidente.

Embora as eleições de outubro de 2018 tenham colocado Bolsonaro na Presidência, acreditamos que aqueles de nós que representam os Estados Unidos devem deixar claro que a fala e as ações que aumentam a divisão, o ódio e a exclusão ameaçam a democracia e suas instituições vitais. Estamos particularmente alarmados com o impacto que Bolsonaro, que se descreveu como “homofóbico” – e muito orgulhoso disso”, e fez afirmações odiosas contra indivíduos LGBTQ+ ao longo de sua carreira política, terá sobre a comunidade LGBTQ + e dissidentes políticos. Num sinal claro do perigo enfrentado pela comunidade brasileira LGBTQ+ e dissidentes políticos, o primeiro membro abertamente gay do Congresso Nacional do Brasil, Jean Wyllys, anunciou recentemente que renunciaria a sua posição e deixaria o Brasil devido aos temores por sua segurança em meio à crescente violência e intimidação contra indivíduos LGBTQ+.

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Nas semanas que se seguiram à posse de Bolsonaro, ele já começou a minar os direitos dos indivíduos LGBTQ + e membros de outras comunidades minoritárias. No primeiro dia na Presidência, ele assinou decretos retirando os direitos LGBTQ+ de seu status de direitos humanos protegidos bem como reduzindo as proteções à terra para comunidades indígenas e descendentes de escravos. A decisão de Bolsonaro de transferir o poder de regulamentar e criar reservas indígenas para o Ministério da Agricultura, juntamente com outras políticas que sinalizam sua intenção de buscar agressivamente o desmatamento na Amazônia, despertou profunda preocupação entre os defensores dos direitos indígenas e proteção ambiental – tanto no Brasil quanto no mundo.

Nós também estamos preocupados com os direitos das mulheres sendo infringidos pelo governo Bolsonaro. A alta taxa de homicídios e outras formas de violência contra as mulheres no Brasil está bem documentada, e o histórico de declarações violentas e machistas de Bolsonaro contra as mulheres é extenso. A retórica degradante e desumanizante de Bolsonaro, combinada com ações como a assinatura de um decreto que amplia significativamente o acesso a armas, sugere que o abuso doméstico e outras formas de violência contra as mulheres não serão uma prioridade para seu governo. Recentemente, o governo de Bolsonaro anunciou que removeria as referências ao feminismo e à violência contra as mulheres dos livros escolares das escolas públicas, além das referências relacionadas à comunidade LGBTQ+.

Os direitos dos trabalhadores e aqueles que os defendem também estão em perigo desde que o governo Bolsonaro eliminou o Ministério do Trabalho do Brasil, com as responsabilidades anteriormente consagradas no Ministério do Trabalho agora divididas entre três ministérios distintos. O Ministério da Justiça – normalmente voltado para atividades criminosas – recebeu a autoridade de conceder ou negar direitos de representação legal aos sindicatos em um processo cada vez mais politizado, capaz de estigmatizar e reduzir a atividade sindical vital e legítima.

Bolsonaro também demonstrou uma clara hostilidade à própria democracia. Ele expressou sua admiração pela ditadura militar que governou o Brasil de 1964 a 1985, elogiou a tortura e prometeu designar dissidentes como inimigos internos e membros de organizações terroristas. Em uma passeata, uma semana antes de sua eleição, Bolsonaro prometeu levar a cabo seus opositores políticos em “uma limpeza nunca vista antes na história do Brasil”, sugerindo que adversários políticos como o candidato presidencial rival de 2018, Fernando Haddad, do Partido dos Trabalhadores, poderia ser preso ou enfrentar a violência.

Estamos profundamente decepcionados pelo fato de que, longe de expressar a preocupação dos Estados Unidos com a defesa dos direitos humanos no Brasil, o governo fez declarações públicas elogiando Bolsonaro.

Como membros do Congresso, pretendemos continuar acompanhando de perto essa situação à medida que ela se desenrola. Como o principal diplomata de nossa nação, cabe a você representar os valores mais elevados da nação, defendendo os direitos fundamentais e a dignidade de todas as pessoas no Brasil.”

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