Do sonho à frustração

A esperança e o fracasso da campanha das Diretas Já contado por quem esteve na linha de frente do movimento

Multidão. No Vale do Anhangabaú, mais de 1 milhão clamavam pelo direito de escolher o presidente – Imagem: Oswaldo Luiz Palermo/Estadão Conteúdo

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O relógio marcava 10h45 da noite de uma quarta-feira atípica, quando a Câmara dos Deputados deu início à votação de uma emenda, na qual os brasileiros depositavam o sonho de liberdade. O ano era 1984 e o dia, 25 de abril. A votação entrou pela madrugada. A Emenda Dante de Oliveira, que estabelecia eleições diretas para presidente da República, acabaria derrotada pela covardia de alguns parlamentares. Faltaram 22 votos para os 320 necessários. “Quando a emenda não passou, eu me senti derrotado”, afirma Walter Casagrande, ex-jogador e comentarista esportivo, à época um dos líderes do grupo que ficou conhecido como “Democracia Corintiana”. “Aquela foi uma das noites mais tristes da minha vida. Depois de uma campanha belíssima, uma grande festa democrática pelo Brasil, perdemos por pouco. E isso só aconteceu porque deputados ligados aos militares fugiram do plenário e se esconderam nos seus gabinetes para não dar quórum”, relembra o jornalista Ricardo Kotscho, que cobriu tanto a votação quanto as caravanas País afora de apoio às Diretas Já. Mais de 5 milhões de brasileiros saíram às ruas para lutar por um direito usurpado durante duas décadas. E que só viria a ser exercido cinco anos depois.

A emenda das Diretas foi apresentada no início de 1983 pelo jovem deputado Dante de Oliveira, parlamentar mato-grossense de primeiro mandato. A proposta enfrentou resistência no próprio partido, o PMDB, antes de ganhar força, extrapolar os gabinetes do Congresso, virar assunto em escritórios, fábricas, assembleias, botecos e lares, e ser encampada pelos movimentos civis. Um ano mais tarde, a ideia de Oliveira reuniria todas as forças políticas de oposição ao regime no mesmo palanque, de Ulysses Guimarães e Franco Montoro a Tancredo Neves e Leonel Brizola, de Fernando Henrique Cardoso a Lula e José Dirceu.

Multidão. No Vale do Anhangabaú, mais de 1 milhão clamavam pelo direito de escolher o presidente – Imagem: Oswaldo Luiz Palermo/Estadão Conteúdo

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6 comentários

Eduardo Sarquis Soares 29 de abril de 2024 11h24
Participei da manifestação em Belo Horizonte. A avenida Afonso Pena estava lotada desde a praça da rodoviária, onde foi montado o palco, até a praça Sete de Setembro. um dos momentos mais marcantes ocorreu quando um dos palestrantes afirmou que a rede Globo, até então, não havia noticiado as manifestações. A vaia à Globo foi estrondosa! Naquela noite, o Jonal Nacional mencionou a nossa manifestação.
ALEXANDRE MARUCA 29 de abril de 2024 20h37
Quem cunhou o termo democracia Corinthiana creio que foi Washington Olivet.
ALEXANDRE MARUCA 29 de abril de 2024 20h37
oliveto
CESAR AUGUSTO HULSENDEGER 30 de abril de 2024 14h23
Sonhos que foram adiados para o século XXI, mas que novamente foram atropelados pela “concertação por cima” característica da política brasileira.
PAULO SERGIO CORDEIRO SANTOS 1 de maio de 2024 22h45
A História sempre foi a disciplina mais subversiva no currículo escolar até os dias de hoje e a matéria que mais causa arrepios no opressor, desde que bem contatada e escrita com fidedignidade e a mais pura verdade. Todos os personagens do artigo são referências históricas do período do final da ditadura, redemocratização Tancredo Neves- Sarney, passando por Collor, Itamar, FHC, Lula, Dilma, Temer, Bolsonaro e neste terceiro mandado do presidente Lula. Essa revista neste precioso artigo de Fabíola Mendonça nos traz lembranças e reflexões que nos faz chorar e lamentar tudo o que poderíamos ter feito e não conseguimos. Tivemos, de fato, um Congresso reacionário decadente no passado com uma sociedade e um eleitorado sedento e carente por mudanças profundas que poderiam colocar o país num patamar infinitamente melhor do que estamos hoje. Os fantasmas reacionários do passado estão encarnados em muitos políticos do presente que querem o retrocesso e pior, respaldados por um eleitorado imbecilizado repleto de pessoas más, sem ética, senso de solidariedade ou qualquer consciência do que foi o período mais negro e hediondo que envergonhou a nossa História, a Ditadura Militar. Por isso elegeram Bolsonaro e seus seguidores em alguns Estados, no Congresso Nacional, nas prefeituras, para reproduzir o que de pior existe na política e na sociedade. A intolerância, a desigualdade econômica e social, a ignorância são alguns elementos que explica todas as nossas mazelas de um país tão rico e tão desigual e cruel com o seu próprio povo.
GILVAN PIO HAMSI JUNIOR 5 de maio de 2024 16h00
Se possível, corrigir a foto do ato de São Paulo que mostra a Praça da Se e não o Vale do Anhangabaú. Houve um ato na Se após o do Anhangabaú, já no descenso do movimento, quando a emenda já havia sido derrotada e Tancredo conchavando a indireta. Talvez, tenha havido um ato na Se anterior ao do Anhangabaú.

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O bolsonarismo perdeu a batalha das urnas, mas não está morto.

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