Política

Disparo em massa de mensagens ameaça democracia e viola lei

Especialistas avaliam como a atividade ilegal influencia de forma ilícita a disputa eleitoral

Disparo WhatsApp
Propaganda de candidatos por meio de disparos em massa de mensagens instantâneas é proibida. Foto: iStock Propaganda de candidatos por meio de disparos em massa de mensagens instantâneas é proibida. Foto: iStock
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A Resolução 23.610/19, publicada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) no ano passado, proíbe a propaganda de candidatos por meio de disparos em massa de mensagens instantâneas. Apesar disso, a prática permanece, segundo investigação do Ministério Público de São Paulo (MP-SP), que identificou empresas que ainda oferecem o serviço.

 

Advogados especializados no tema concordam que a atividade ilegal influencia de forma ilícita a disputa eleitoral. “A conduta dos candidatos que se utilizam de disparos em massa tem significativo impacto no que concerne ao âmbito democrático, uma vez que o modus operandi das empresas que fazem esse tipo de tratamento de dados vai de encontro aos princípios republicanos e à proteção de dados pessoais”, afirma André Damiani, criminalista especializado em Proteção de Dados Pessoais e Direito Penal Econômico.

Ele explica como funciona a busca pelo público-alvo. “As empresas realizam uma raspagem de perfis por meio de geolocalização e hashtags, ocasião em que coletam informações sobre um indivíduo, como nome data de nascimento, renda, domicílio e número de Whatsapp. Com essa perspectiva, essas empresas e, consequentemente, o candidato possuem acesso ao perfil dos indivíduos e conseguem direcionar toda uma campanha especialmente para estes”, diz.

Ainda de acordo com o especialista, se uma empresa ou candidato tem acesso a determinado número de pessoas em determinada faixa etária, que residem em certo bairro, possuem determinada renda, frequentam determinados locais e postam em suas redes sociais a favor ou contra determinados temas, é facilmente construído um perfil. “Isso permite que essa empresa ou candidato direcione o conteúdo das mensagens que irão chegar até esses indivíduos através de publicidade que, muitas vezes, é confundida como campanha política”, complementa.

A advogada Blanca Albuquerque, especialista em proteção de dados pessoais pelo Data Privacy Brasil e sócia de Damiani, observa que, com um volumoso banco de dados, incluindo o número de WhatsApp, “é possível disparar mensagens em massa para basicamente todo o eleitorado da cidade, segmentado em perfis, por meio de centenas de chips com números distintos, ou até mesmo por aplicativos que clonam o WhatsApp e fazem disparos discretos por ‘bots’ que reproduzem atos humanos como o de digitar letra por letra e o de alternar mensagens com conteúdo distinto”.

No entender de Blanca, as empresas que oferecem “com tamanha desfaçatez” diversos pacotes de bancos de dados não consentidos e impulsionamento de campanhas através dos disparos em massa, “simulam uma situação de legalidade, quando a verdade é simples: raspar dados pessoais de cidadãos através de redes sociais e geolocalização, bem como programar ‘bots’ para disparar mensagens em massa e por sua vez interferir no convencimento do eleitorado através de um falso engajamento é ilegal e ameaça diretamente a democracia brasileira”.

Advogada cobra controle de atos ilícitos

Vera Chemim, advogada constitucionalista, mestre em Direito Público Administrativo pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), cobra medidas mais duras por parte das autoridades para combater a prática.

“A realidade fática apenas ratifica o que tem ocorrido em tempos recentes e que tende a continuar acontecendo, a despeito da legislação existente sobre o tema e de modo especial a LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais). O que precisa ser urgentemente agilizado pelas autoridades públicas competentes das três esferas de governo é o controle efetivo de tais atos ilícitos e a consequente imposição de sanções do ponto de vista eleitoral e penal, com absoluto rigor jurídico”, defende Chemim.

Alan Thomaz, advogado especialista em tecnologia e Direito Digital, esclarece que o impulsionamento é permitido apenas em alguns casos, estipulados pela legislação eleitoral. “De acordo com a lei eleitoral, o conteúdo publicado oficialmente como propaganda eleitoral pode ser veiculado nos sites oficiais dos candidatos e partidos, e nas respectivas redes sociais. Tais conteúdos podem ser impulsionados em redes sociais como Twitter, Facebook e Instagram para aparecerem para um número maior de usuários dessas plataformas. A propaganda eleitoral na internet poderá ser veiculada pelo candidato ou qualquer pessoa, por meio de aplicativos de mensagens instantâneas como WhatsApp, desde que não haja contratação de impulsionamento e de disparo em massa de conteúdo nesse contexto. Na maior parte dos casos, é necessário obter o consentimento do usuário para assegurar que o uso de seus dados e o envio da mensagem não viola a LGPD”, opina Thomaz.

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