Política

Dirceu, Genoíno e Delúbio são condenados por formação de quadrilha

Por 6 votos a 4, ministros entenderam que réus se associaram para corromper parlamentares

Apoie Siga-nos no

Em um julgamento apertado, os ministros do Supremo Tribunal Federal decidiram nesta segunda-feira 22 pela condenação da maioria dos réus no item dois da ação penal do “mensalão”. Com isso, o ex-chefe da Casa Civil José Dirceu, José Genoíno, Delúbio Soares e Marcos Valério foram considerados culpados por 6 ministros e inocentes por 4.

Os demais réus Cristiano Paz, Ramon Hollerbach, Rogerio Tollentino, Simone Vasconcelos, Katia Rabello e José Roberto Salgado acabaram condenados pelo mesmo placar. Por unanimidade, Geiza Dias e Ayana Tenório foram consideradas inocentes. Já Vinícius Samarane recebeu cinco votos pela condenação e cinco pela absolvição, juntando-se aos casos de empate do julgamento.

“Em 44 anos de atuação, nunca vi um caso em que se caracterizasse a quadrilha de uma forma tão clara”, disse Celso de Mello, em mais um duro voto. “[O caso] revela um dos episódios mais vergonhosos da história política do País, pois as provas expõem aos olhos de uma nação estarrecida, perplexa e envergonhada um grupo de delinquentes que degradou a atuação política transformando-a em plataforma de ações criminosas.”

Houve espaço também para alusões subjetivas a uma eventual responsabilidade do ex-presidente Lula no episódio. O ministro Marco Aurélio Mello releu um discurso de 2006, quando assumiu a presidência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) na presença do ex-mandatário petista. À época, disse que o texto, com menções a “tempos muito estranhos” de “mentiras deslavadas” e de “homens públicos desonestos”, era um “recado”. Em um trecho, faz alusão à Lula: “É a tática do avestruz: enterrar a cabeça para deixar o vendaval passar. E seguimos como se nada estivesse acontecendo. Perplexos, percebemos, na simples comparação entre o discurso oficial e as notícias jornalísticas, que o Brasil se tornou um país do faz-de-conta. Faz de conta que não se produziu o maior dos escândalos nacionais, que os culpados nada sabiam – o que lhes daria uma carta de alforria prévia para continuar agindo como se nada de mal houvessem feito.”  (Leia a íntegra do discurso AQUI).

Em outro momento, Celso de Mello também se refere ao governo do ex-presidente. Para ele, os “fins não justificavam os meios” para a conquista e preservação temporária do poder. “Embora constituam objetivos politicamente legítimos, não autorizam quem detenha a direção superior do Estado, ainda que invocando em seu favor expressiva votação eleitoral obtida em determinado momento histórico, a utilizar meios criminosos ou expedientes juridicamente marginais e delirantes da ordem jurídica.”

Antes destas afirmações, ainda no início da sessão, a ministra Rosa Weber foi a primeira a votar, seguindo a divergência aberta pelo revisor Ricardo Lewandowski ante a análise do relator Joaquim Barbosa. A magistrada entendeu não haver formação de quadrilha devido à inexistência de associação para realizar crimes indeterminados sem objetivo final. “Associação para empreender uma única operação concreta e pontual extinguindo-se neste mesmo ato, embora com características similares [à formação de quadrilha], não constitui associação ilícita”, disse ao citar um caso do Supremo argentino.

Para a ministra, uma quadrilha pressupõe uma entidade autônoma, estável e com vínculos que transcendem a vontade dos integrantes, com um centro autônomo de imputações fáticas das ações prosseguidas. “Os chamados núcleos político, financeiro e publicitário jamais formaram uma sociedade par delinquir, sobreviver e usufruir dos crimes. Havia um objetivo de conseguir apoio ao governo e todos os fatos típicos em torno sempre tiveram como objetivo garantir isso.” Por isso, haveria coautoria de crimes praticados de forma continuada, já julgados pelo Supremo em outros itens.

                       

O entendimento levou Barbosa a sustentar que a posição poderia restringir o enquadramento desta conduta à apenas crimes de sangue, como sequestro e roubo, excluindo os de colarinho branco. Uma afirmação à qual a ministra Cármen Lúcia também manifestou preocupação, mas, ao adiantar seu voto, disse não se aplicar a esse caso.

A presidente do Tribunal Superior Eleitoral acompanhou a divergência do revisor, defendendo a não existência de quadrilha neste item. “Seria necessário fazer uma associação estável e permanente para crimes em geral. Não me parece que tenha havido a comprovação de que houve a constituição de uma associação com fins a durar indeterminadamente com tais finalidades.”

Há, segundo ela, indivíduos que chegaram a cargos de poder de maneira legítima e empresa com atividades legitimas, que em seus postos de trabalho violaram a lei. Motivo pelo qual respondem por outras acusações. “Não chegaram ao poder para cometer os crimes. Os crimes não foram praticados porque uma associação foi criada para este fim.”

Em seguida, Luiz Fux sustentou estar provado que os três núcleos do esquema uniram-se para criar um projeto “delinquencial” para tornar refém a Câmara dos Deputados, o que colocou em risco a paz pública. “A quadrilha atuou por quase três anos, uma duração incomum para uma coautoria. A prática de um projeto delinquencial precisa de um tempo para alcançar seu objetivo e a união de três núcleos foi fundamental para isso ocorresse.”

O ministro entendeu estar configurada a conduta por haver o conhecimento dos acusados sobre crimes contra a administração pública e o sistema financeiro julgados anteriormente, além de se caracterizar a associação de ao menos quatro pessoas para prática de crimes indeterminados, não sendo necessário que estes fossem o único objetivo da ação. “O acervo probatório induz inequivocamente que os réus se associaram para prática de vários crimes. Era um grupo voltado à prática de um ilícito impar do país.”

De forma resumida, Dias Toffoli pediu para que seu voto escrito fosse anexado aos autos e declarou que apenas seguira o voto do revisor. Em seguida, Gilmar Mendes considerou a existência da quadrilha. “A necessidade de cada um [dos réus] encontrou no outro a sua necessidade de satisfação, o que levou a uma longa associação interrompida apenas com a denúncia de Roberto Jefferson.”

Marco Aurélio Mello divergiu de Barbosa apenas ao absolver Samarane e condenar Geiza Dias, destacando haver um entrosamento entre os réus. “Houve formação de uma quadrilha das mais complexas, envolvendo na situação concreta o núcleo político, financeiro e operacional. Mostrou-se que seus integrantes eram afinados”, disse. “A confiança entre eles estaria a lembrar a máfia italiana, já que envelopes eram buscados contendo, sem que o intermediário soubesse, cifras altíssimas.”

Penúltimo a votar, o decano Celso de Mello destacou que os réus atentaram contra a democracia. “São homens que desconhecem a república, pessoas que atraídas por uma perversa vocação para o controle do poder, desonraram com seus gestos ilícitos e ações marginais à ideia mesma que anima o espírito republicano pulsante no texto de nossa Constituição. Mais do que práticas criminosas, identifico no comportamento destes réus, notadamente nos que exerceram parcela de poder no Estado, grave atentado à ordem democrática.”

Fechando o julgamento, Ayres Britto ressaltou ter havido dano a paz pública com atuação dos acusados. “Não é uma reunião ocasional. A palavra associaram-se traz consigo algo de fidelização, uma liga entre as pessoas que se associam em quadrilha. A relação de quadrilhamento não é apenas de participação, é de pertencimento.”

Confira como cada ministro votou:

Os personagens:

Em um julgamento apertado, os ministros do Supremo Tribunal Federal decidiram nesta segunda-feira 22 pela condenação da maioria dos réus no item dois da ação penal do “mensalão”. Com isso, o ex-chefe da Casa Civil José Dirceu, José Genoíno, Delúbio Soares e Marcos Valério foram considerados culpados por 6 ministros e inocentes por 4.

Os demais réus Cristiano Paz, Ramon Hollerbach, Rogerio Tollentino, Simone Vasconcelos, Katia Rabello e José Roberto Salgado acabaram condenados pelo mesmo placar. Por unanimidade, Geiza Dias e Ayana Tenório foram consideradas inocentes. Já Vinícius Samarane recebeu cinco votos pela condenação e cinco pela absolvição, juntando-se aos casos de empate do julgamento.

“Em 44 anos de atuação, nunca vi um caso em que se caracterizasse a quadrilha de uma forma tão clara”, disse Celso de Mello, em mais um duro voto. “[O caso] revela um dos episódios mais vergonhosos da história política do País, pois as provas expõem aos olhos de uma nação estarrecida, perplexa e envergonhada um grupo de delinquentes que degradou a atuação política transformando-a em plataforma de ações criminosas.”

Houve espaço também para alusões subjetivas a uma eventual responsabilidade do ex-presidente Lula no episódio. O ministro Marco Aurélio Mello releu um discurso de 2006, quando assumiu a presidência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) na presença do ex-mandatário petista. À época, disse que o texto, com menções a “tempos muito estranhos” de “mentiras deslavadas” e de “homens públicos desonestos”, era um “recado”. Em um trecho, faz alusão à Lula: “É a tática do avestruz: enterrar a cabeça para deixar o vendaval passar. E seguimos como se nada estivesse acontecendo. Perplexos, percebemos, na simples comparação entre o discurso oficial e as notícias jornalísticas, que o Brasil se tornou um país do faz-de-conta. Faz de conta que não se produziu o maior dos escândalos nacionais, que os culpados nada sabiam – o que lhes daria uma carta de alforria prévia para continuar agindo como se nada de mal houvessem feito.”  (Leia a íntegra do discurso AQUI).

Em outro momento, Celso de Mello também se refere ao governo do ex-presidente. Para ele, os “fins não justificavam os meios” para a conquista e preservação temporária do poder. “Embora constituam objetivos politicamente legítimos, não autorizam quem detenha a direção superior do Estado, ainda que invocando em seu favor expressiva votação eleitoral obtida em determinado momento histórico, a utilizar meios criminosos ou expedientes juridicamente marginais e delirantes da ordem jurídica.”

Antes destas afirmações, ainda no início da sessão, a ministra Rosa Weber foi a primeira a votar, seguindo a divergência aberta pelo revisor Ricardo Lewandowski ante a análise do relator Joaquim Barbosa. A magistrada entendeu não haver formação de quadrilha devido à inexistência de associação para realizar crimes indeterminados sem objetivo final. “Associação para empreender uma única operação concreta e pontual extinguindo-se neste mesmo ato, embora com características similares [à formação de quadrilha], não constitui associação ilícita”, disse ao citar um caso do Supremo argentino.

Para a ministra, uma quadrilha pressupõe uma entidade autônoma, estável e com vínculos que transcendem a vontade dos integrantes, com um centro autônomo de imputações fáticas das ações prosseguidas. “Os chamados núcleos político, financeiro e publicitário jamais formaram uma sociedade par delinquir, sobreviver e usufruir dos crimes. Havia um objetivo de conseguir apoio ao governo e todos os fatos típicos em torno sempre tiveram como objetivo garantir isso.” Por isso, haveria coautoria de crimes praticados de forma continuada, já julgados pelo Supremo em outros itens.

                       

O entendimento levou Barbosa a sustentar que a posição poderia restringir o enquadramento desta conduta à apenas crimes de sangue, como sequestro e roubo, excluindo os de colarinho branco. Uma afirmação à qual a ministra Cármen Lúcia também manifestou preocupação, mas, ao adiantar seu voto, disse não se aplicar a esse caso.

A presidente do Tribunal Superior Eleitoral acompanhou a divergência do revisor, defendendo a não existência de quadrilha neste item. “Seria necessário fazer uma associação estável e permanente para crimes em geral. Não me parece que tenha havido a comprovação de que houve a constituição de uma associação com fins a durar indeterminadamente com tais finalidades.”

Há, segundo ela, indivíduos que chegaram a cargos de poder de maneira legítima e empresa com atividades legitimas, que em seus postos de trabalho violaram a lei. Motivo pelo qual respondem por outras acusações. “Não chegaram ao poder para cometer os crimes. Os crimes não foram praticados porque uma associação foi criada para este fim.”

Em seguida, Luiz Fux sustentou estar provado que os três núcleos do esquema uniram-se para criar um projeto “delinquencial” para tornar refém a Câmara dos Deputados, o que colocou em risco a paz pública. “A quadrilha atuou por quase três anos, uma duração incomum para uma coautoria. A prática de um projeto delinquencial precisa de um tempo para alcançar seu objetivo e a união de três núcleos foi fundamental para isso ocorresse.”

O ministro entendeu estar configurada a conduta por haver o conhecimento dos acusados sobre crimes contra a administração pública e o sistema financeiro julgados anteriormente, além de se caracterizar a associação de ao menos quatro pessoas para prática de crimes indeterminados, não sendo necessário que estes fossem o único objetivo da ação. “O acervo probatório induz inequivocamente que os réus se associaram para prática de vários crimes. Era um grupo voltado à prática de um ilícito impar do país.”

De forma resumida, Dias Toffoli pediu para que seu voto escrito fosse anexado aos autos e declarou que apenas seguira o voto do revisor. Em seguida, Gilmar Mendes considerou a existência da quadrilha. “A necessidade de cada um [dos réus] encontrou no outro a sua necessidade de satisfação, o que levou a uma longa associação interrompida apenas com a denúncia de Roberto Jefferson.”

Marco Aurélio Mello divergiu de Barbosa apenas ao absolver Samarane e condenar Geiza Dias, destacando haver um entrosamento entre os réus. “Houve formação de uma quadrilha das mais complexas, envolvendo na situação concreta o núcleo político, financeiro e operacional. Mostrou-se que seus integrantes eram afinados”, disse. “A confiança entre eles estaria a lembrar a máfia italiana, já que envelopes eram buscados contendo, sem que o intermediário soubesse, cifras altíssimas.”

Penúltimo a votar, o decano Celso de Mello destacou que os réus atentaram contra a democracia. “São homens que desconhecem a república, pessoas que atraídas por uma perversa vocação para o controle do poder, desonraram com seus gestos ilícitos e ações marginais à ideia mesma que anima o espírito republicano pulsante no texto de nossa Constituição. Mais do que práticas criminosas, identifico no comportamento destes réus, notadamente nos que exerceram parcela de poder no Estado, grave atentado à ordem democrática.”

Fechando o julgamento, Ayres Britto ressaltou ter havido dano a paz pública com atuação dos acusados. “Não é uma reunião ocasional. A palavra associaram-se traz consigo algo de fidelização, uma liga entre as pessoas que se associam em quadrilha. A relação de quadrilhamento não é apenas de participação, é de pertencimento.”

Confira como cada ministro votou:

Os personagens:

ENTENDA MAIS SOBRE: , , , ,

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo

Um minuto, por favor…

O bolsonarismo perdeu a batalha das urnas, mas não está morto.

Diante de um país tão dividido e arrasado, é preciso centrar esforços em uma reconstrução.

Seu apoio, leitor, será ainda mais fundamental.

Se você valoriza o bom jornalismo, ajude CartaCapital a seguir lutando por um novo Brasil.

Assine a edição semanal da revista;

Ou contribua, com o quanto puder.