Política

CPI da Covid não soube virar a página de crimes já comprovados, dizem especialistas

Webinar Saúde de CartaCapital discutiu charlatanismo e desinformação na pandemia com Pedro Hallal, Natalia Pasternak e Gustavo Cabral

Webinar Saúde discutiu desinformação na pandemia. Foto: Reprodução
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A CPI da Covid depositou todas as suas forças nos casos de corrupção na compra de vacinas e não soube virar a página de crimes que já têm comprovação, analisam especialistas em saúde ouvidos por CartaCapital nesta quarta-feira 25, no 4º episódio do Webinar Saúde, com o debate Combatendo o charlatanismo e a desinformação. A mesa teve a participação do infectologista Pedro Hallal, da bióloga Natalia Pasternak e do imunologista Gustavo Cabral.

 

Para Hallal, a CPI não pode perder a razão de sua instauração: apurar ações e omissões no enfrentamento da pandemia. Por mais que as eventuais “negociatas” motivem investigações relevantes, diz o professor, a comissão já conseguiu identificar os principais motivos para que o Brasil apresente um desempenho cinco vezes pior que a média mundial na prevenção à mortalidade pelo coronavírus.

Os crimes comprovados já deveriam ter justificado uma responsabilização contra o presidente Jair Bolsonaro, opina ele, seja por impeachment ou mesmo por uma medida que proibisse o chefe do Executivo de executar qualquer ato sobre a pandemia, como, por exemplo, manifestar-se publicamente em relação ao tema.

“O presidente da República lidera a desinformação”, opina Hallal.

Na visão do infectologista, a questão da corrupção tem apaixonado sobretudo os senadores, que já estão acostumados a apurar crimes dessa natureza. O conjunto de depoimentos de especialistas em saúde não foi bem aproveitado, e logo após as participações dos irmãos Miranda os parlamentares passaram a depositar forças na 2ª linha de investigações.

“A CPI está cometendo um erro neste momento”, afirma. “Ela não soube virar a página de coisas que estão comprovadas, para entrar na linha da corrupção. A verdade é que a CPI já tem elementos comprovados para afastar Bolsonaro do combate à pandemia no Brasil.”

Esqueceram por que a CPI foi criada, avalia Pedro Hallal.

Natalia Pasternak disse concordar que os senadores, mais habituados a investigar corrupção, “não sabiam muito bem o que fazer” com as conclusões tiradas a partir dos depoimentos dos especialistas em saúde na CPI.

“Ficou meio no limbo, pendurado”, apontou a bióloga.

Ao mesmo tempo, ela afirmou que entende “por que a corrupção choca”. Em sua visão, a opinião pública já tinha noção de que Bolsonaro é o maior culpado pela má condução do combate à pandemia.

“Quando você insere um elemento que, além do descaso, do negacionismo e da promoção de curas milagrosas, ainda por cima teve gente querendo ganhar dinheiro em cima de vacina? Isso é o que choca”, observa a especialista. “Você fala: estão roubando em cima da vida dos brasileiros? Por isso, talvez, os senadores tenham perdido um pouco o pé. As duas situações são muito inadmissíveis.”

Diante do cenário, a pesquisadora criticou a “falta de resposta” de instituições que representam a ciência brasileira, como a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência e a Academia Brasileira de Ciências. Para ela, a postura dessas associações é “muito discreta em relação ao perigo que esse governo representa”.

Governos autoritários, fascistas e antidemocráticos são muito mais perigosos que uma simples polarização política, diz Natalia Pasternak.

Para Gustavo Cabral, Bolsonaro depende de uma eventual vitória nas eleições de 2022 para não ser preso, e sua gestão da pandemia pode ser julgada em tribunais internacionais.

Ao mesmo tempo, o imunologista crê que o impeachment já estaria justificado, e uma medida mínima seria restringir poderes do presidente na gestão de saúde pública em meio à crise atual.

“Já tem dados suficientes para mostrar o que aconteceu e o que levou à morte de milhares de pessoas. A questão é: falta focar nas ações contra o Bolsonaro e a sua equipe de imediato, porque temos uma variante se espalhando loucamente, e ele vem a público falar que a máscara não é importante”, opina o professor. “As ações contra ele têm que ser duras, porque as ações dele são duras contra a vida.”

Cabral observa, por outro lado, que os senadores tentam explorar uma confusão gerada na população sobre a suspeita de que uma figura supostamente honesta, como se vende Bolsonaro, esteja envolvida em um esquema irregular de aquisição de imunizantes.

“É período de eleição também. Muitos já estão tramando a estratégia para o ano que vem”, opina. “Nós não sabíamos tão declaradamente que não se quis comprar a vacina de forma honesta.”

Bolsonaro vai pagar algum dia. Ele tem que ganhar de todas as formas essa eleição, porque ele vai para a cadeia, diz Gustavo Cabral.

A próxima e última mesa do Webinar Saúde de CartaCapital ocorre em 31 de agosto, pelo YouTube, com o tema O que esperar do novo normal. Participarão da discussão a pneumologista Margareth Dalcolmo, o infectologista Esper Kallás, o ex-ministro da Saúde José Gomes Temporão e a socióloga Paula Johns. A inscrição é gratuita e pode ser realizada em https://www.dialogoscapitais.com.br/.

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