Política
Como o projeto que equipara facções a terroristas acirra disputa entre direita e governo na pauta da segurança pública
Megaoperação no Rio e pressão popular antecipam a disputa eleitoral que se desenha em 2026
        
        A disputa entre governo e oposição em torno da proposta que equipara facções criminosas a organizações terroristas ganhou força nesta semana, no contexto da ação policial mais mortífera da história no Rio de Janeiro e sob a influência direta da opinião popular. Uma pesquisa Quaest divulgada na noite de sábado 1º mostra que 72% dos fluminenses apoiam a medida que classifica o Comando Vermelho e o PCC como grupos terroristas. Apenas 22% se dizem contra, enquanto 6% não souberam responder.
O resultado da pesquisa reforça a percepção de que a população do Rio de Janeiro quer ações mais duras contra o crime organizado, especialmente após a megaoperação realizada nos complexos da Penha e do Alemão, que deixou 121 mortos. Para a oposição de direita, liderada por governadores como Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP) e Cláudio Castro (PL-RJ), o momento é estratégico.
Segundo defensores do projeto, a mudança de tipificação permitiria enquadrar atos das facções, como domínio territorial de comunidades, ataques e ameaças, sob a mesma lógica da Lei Antiterrorismo de 2016, ganhando novos instrumentos legais para investigação e repressão. A mudança abriria também a porteira para a cooperação internacional, sequestro de bens e infiltração de agentes ou empresas fictícias.
Do outro lado, o governo Lula (PT) observa com cautela o avanço da proposta. Para o Planalto, classificar facções criminosas como terroristas abre espaço para interferência estrangeira no País, sobretudo de países que aplicam restrições a investimentos em nações que abrigam grupos terroristas. A preocupação reside na possibilidade de o Brasil ser tratado, no plano internacional, como território suscetível a ações externas ou sanções diplomáticas, além de um eventual risco de operação militar estrangeira.
Na avaliação do governo, o projeto “antifacção”, que cria o tipo penal de “organização criminosa qualificada”, é uma resposta suficiente para o combate ao crime organizado. O texto prevê penas de 8 a 15 anos para o faccionados e inclui medidas como apreensão antecipada de bens, afastamento de servidores públicos ligados às quadrilhas e monitoramento de presos.
Enquanto o embate entre direita e governo se acirra, o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), tem movimentado a Casa para tentar aprovar o projeto da direita ainda neste ano. O deputado articula a votação da proposta que enquadra facções como terroristas na segunda semana de novembro, antes da tramitação do pacote antifacção do governo e da PEC da Segurança Pública, cujo debate no plenário está previsto para dezembro.
A tensão entre as duas propostas reflete não apenas um conflito estratégico sobre como definir e punir o crime organizado, mas também a disputa política que se desenha para 2026. Enquanto a oposição busca capitalizar eleitoralmente a insatisfação popular com a violência, o governo tenta equilibrar o endurecimento das penas com a manutenção da soberania e o cuidado de não abrir precedentes que possam permitir ingerência externa no Brasil.
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