Política

Como a esquerda brasileira continua correndo atrás do próprio rabo

Enquanto nos digladiamos pela melhor análise do cenário eleitoral e apontamos o dedo uns para os outros, a direita sorri e avança

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Ao verificar o mapa eleitoral, algumas análises começam a colocar a culpa da derrota no Rio de Janeiro ao fato de o PSOL e o Marcelo Freixo não “saberem falar como as massas” – como se as massas fossem algo inerte, acrítico e apolítico,uma postura típica de quem está no lugar de dominante, não de dominado.

Sobre tal perspectiva, alguns militantes mais envolvidos com a campanha do psolista respondem dizendo que o problema foi a Igreja Universal e a Record, que seria muito difícil uma vitória quando o outro lado tinha essas máquinas por trás e que precisaríamos voltar a fazer trabalho de base para conseguirmos nos contrapor a eles.

Uma generalização bastante grosseira do evangelismo, como se houvesse apenas uma denominação, e não muitas, e como se elas funcionassem todas da mesma maneira em todos os locais.

Daí o primeiro grupo, em sua análise rasa, retruca que isso não é desculpa porque Freixo teve a Globo a seu favor no segundo turno e não adiantou.

E então os militantes do segundo grupo tiram da manga a carta “vamos-lembrar-de-quem-Crivella-foi-ministro” para ver quem contribuiu mais para ele se tornar uma figura tão pública, seu tio Edir ou o lulismo?

O único acordo entre as duas argumentações é que o voto nulo, em branco ou simplesmente a ausência nas urnas foi o verdadeiro vitorioso, mostrando que a aversão à política institucional é uma herança forte do processo de insatisfação que eclode nas jornadas de junho de 2013 e que é reforçado pelas inúmeras denúncias de corrupção e pelo traumático golpe parlamentar-jurídico-midiático denominado “impeachment”.

As milícias ficaram em segundo plano nesse debate, o que me parece um equívoco. Os relatos que chegaram dão conta de que em diversos lugares do Rio foi muito difícil fazer campanha, havendo com frequência intimidação armada e cercos.

E, em último plano mesmo, ficou a possibilidade de fazermos uma análise mais complexa, que agregue todos esses elementos. Da dificuldade de uma candidatura que saiu da zona Sul em dialogar com a população – e ganhá-la de volta para a participação política – ao poder paralelo do tráfico, passando pela disputa dos meios de comunicação entre dois gigantes que não estão dispostos a se democratizar, até chegar ao frangalho das esquerdas, ao interminável balanço dos governos petistas e de como a ausência no chão das ruas deu lugar aos evangelismos crescentes. (E certamente outras questões que meu ponto de vista parcial não me permite enxergar).

Se não conseguirmos colocar lentes interseccionais mais aguçadas para vermos o mundo lá fora vai ser muito difícil sairmos desse lugar. Enquanto nós nos digladiamos pela melhor e mais correta análise, que na prática significa disputar para quem, dentre nós, vamos apontar o dedo e apresentar a conta final da derrota, Crivella sorri e diz que vai promover valores familiares e contra a “ideologia de gênero”.

Por fim, quero mesmo é ficar com a energia boa que saiu da campanha do Freixo – e de diversas outras Brasil afora, com destaque para Edmilson em Belém e Aurea Carolina em Belo Horizonte.

Sem idealizações, que obviamente também podem surgir desses movimentos, e sem achar que encontramos o novo caminho que deveríamos seguir – como se houvesse apenas um.

Mas, sim, com uma disposição que tem potência de transformação, sem fórmulas tão certas, sem tantas verdades absolutas, mas com muita vontade de acertar o rumo, acreditando que um outro mundo é sim possível e que ele não é construído apenas de dois em dois anos, quando das disputas eleitorais, mas cotidianamente.

 

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