Política

Com Torquato Jardim na Justiça, a Lava Jato segue no alvo

Uma semana após o corte de orçamento da operação, novo ministro de Temer não descarta alterações no comando da Polícia Federal

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O agravamento da crise política aparentemente diminuiu os pudores do governo de Michel Temer para tomar atitudes que podem ser entendidas como tentativas de barrar as investigações da Operação Lava Jato. A nomeação de Torquato Jardim para o Ministério da Justiça, no lugar de Osmar Serraglio, é a mais recente delas.

A troca no comando da Justiça foi anunciada no domingo 28 pelo Palácio do Planalto. Nos bastidores, articuladores de Michel Temer não escondem que a ideia da mudança é interferir na Lava Jato, como afirmaram ao jornalista Gerson Camarotti, da GloboNews.

Segundo o jornalista, o objetivo da nomeação de Torquato Jardim é “retomar a influência sobre a Polícia Federal”, uma vez que a força policial é subordinada ao Ministério da Justiça. “O Planalto optou por Torquato por considerá-lo com personalidade suficiente para retomar o controle da PF”, escreve Camarotti nesta segunda-feira 21 em seu blog no portal G1.

Trocar o comando do Ministério da Justiça e interferir na Polícia Federal era uma das estratégias atribuídas ao senador Aécio Neves (PSDB-MG) pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, que acusou o tucano de tentar barrar as investigações de corrupção. 

“Mais especificamente sobre a Lava Jato, o senador teria tentado organizar uma forma de impedir que as investigações avançassem, por meio da escolha dos delegados que conduziriam os inquéritos, direcionando as distribuições, mas isso não teria sido finalizado entre ele, Michel Temer e o ex-ministro da Justiça e atual ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes”, escreveu Janot em um dos trechos do inquérito contra Aécio.

Em outro diálogo flagrado na Operação Patmos, que investigou as relações de Temer e Aécio com Joesley Batista, dono da JBS e delator, Aécio conversa com o também senador José Serra (PSDB-SP) sobre o mesmo tema – tirar Osmar Serraglio do Ministério da Justiça. Conforme o diálogo grampeado e publicado pelo jornal Folha de S.Paulo, Serra queria que Aécio conversasse com Temer sobre a substituição.

José Serra – Deixa eu te falar uma coisa, cara. Eu tô preocupado… olhando do ponto de vista macro, né… da política, eu acho que precisa ter um ministro da Justiça forte, viu Aécio.
Aécio Neves – Eu também acho, sempre achei.

José Serra – E… realmente forte. Não precisa ser da área, porque vai ficar da área… vai ficar aquele problema todo. Alguém como o Jungmann daria, entende? Bem assessorado, tal. O fato é que tem que por alguém com força. Não para fazer nada arbitrário, mas para que as coisas tenham um caminho, né? De desenvolvimento, tudo.
Aécio Neves – Vamos falar pessoalmente, tá bom.

No domingo 28, em entrevista ao mesmo jornal, o próprio Torquato Jardim não escondeu que sua entrada no Ministério da Justiça pode impactar a Lava Jato. Questionado sobre remover Leandro Daiello do cargo de diretor-geral da Polícia Federal, Jardim não descartou a mudança. “Vou ouvir a recomendação do presidente, de outras personalidades que conhecem o assunto, fazer o meu próprio juízo de valor e decidir. Não vou me precipitar nem antecipar nada”, afirmou.

Daiello é diretor-geral da PF desde 2011 e seus críticos afirmam que tanto no governo de Dilma Rousseff, que o nomeou, quanto no de Temer, ele age sem dar satisfações ao Ministério da Justiça. O longo tempo como comandante da PF também contaria a favor de sua saída, mas a mudança de comando é vista com preocupação pela força-tarefa da Lava Jato e por defensores da operação.

Em nota publicada no início da noite de domingo 28, horas após a nomeação de Torquato Jardim, a Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal manifestou “preocupação com a notícia da substituição (…) do ministro Osmar Serraglio” e surpresa, “até mesmo porque desconhecem qualquer proposta de Torquato Jardim para a pasta”. 

De acordo com a nota, “é natural que qualquer mudança no comando do Ministério da Justiça gere preocupação e incerteza sobre a possibilidade de interferências no trabalho realizado pela Polícia Federal”, afirma a entidade.

Torquato é também um crítico da Lava Jato. No mais recente comentário contra a operação, listou em fevereiro problemas na ação, como condenações sem provas que foram reconhecidas pela Justiça Federal e as extensas prisões provisórias praticadas no âmbito da operação. A postura não incomodou Temer, o que pode ser um sinal dos tempos.

Em fevereiro, o presidente da República cogitou o nome do advogado Antonio Claudio Mariz de Oliveira para a Justiça, mas recuou diante das notícias que destacavam as críticas deste à Lava Jato. Na época, a ideia de Temer era evitar a impressão de que agia contra a operação, o que aparentemente não foi levado em conta agora.

Corte de orçamento

A mudança no comando do Ministério da Justiça ocorre uma semana depois da revelação de que o governo de Michel Temer fez o primeiro corte expressivo no efetivo da Lava Jato em três anos de investigação.

Segundo reportagem do jornal O Estado de S. Paulo, diante de cortes feitos pela União, a Polícia Federal decidiu contingenciar 44% do orçamento de custeio previsto para a Lava Jato em 2017. 

Houve também uma redução da a equipe destacada para a força-tarefa em Curitiba, que tem agora 40 pessoas, 20 a menos do já teve. Neste montante conta também a redução do número de delegados para a Lava Jato, que foi de nove para quatro.

“Será o fim da Lava Jato”, afirmou ao Estadão um membro da força-tarefa, em Curitiba, sob a condição de não ter o nome revelado.

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