Política

Com oposição frágil, Renan Filho tende a se reeleger em Alagoas

Governador do PMDB que apoia Haddad apresenta melhora em índices, apesar da persistência da exclusão em um dos estados mais desiguais do Brasil

Renan Filho ao lado de Haddad em Alagoas
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Os governistas destacam o início de uma nova era enquanto os críticos garantem que não há melhorias significativas a serem comemoradas.

A polarização das ideias em Alagoas não chega à disputa política, que oferece caminho aberto para a reeleição de Renan Filho (PMDB) depois da desistência do ex-presidente Fernando Collor (PTC), em um dos raros estados do Nordeste no qual partidos de esquerda não lideram o governo.

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Se a eleição no estado repetisse os resultados de 2014, Collor voltaria a governar sua terra natal. Há quatro anos, o político ganhou a disputa ao senado obtendo mais votos que Renan Filho, eleito governador. Apesar do retrospecto, a direita regional, assim como as forças da oposição progressista não conseguiram articular frentes com nomes competitivos para rivalizar com os situacionistas.

“A candidatura do Collor fazia um casamento de periquito com cobra d’água. Ele se lançou e a própria aliança tinha vergonha de dizer que ele era candidato. Desistiu pela dificuldade de falar com o cidadão”, pontua Renan Filho.

O recuo dos adversários, de acordo com o governo, está relacionado a avanços que passam pela estabilização das contas e a criação de um ambiente propício a investimentos. A qualificação da malha viária com 1.200 quilômetros feitos ou reformados sem a imposição de pedágio representaria essa nova fase, incluindo a duplicação da estrada que liga Maceió a Arapiraca, os dois principais complexos urbanos do estado, prevista para o início de 2020. No sertão, a extensão do canal hídrico para chegar a novas localidades aparece como outro exemplo da distribuição de recursos em obras estratégicas.

Apesar dos resultados apresentados, a crise nacional e o histórico de desigualdade continuam a exercer forte influência sobre a economia local. Enquanto não menos de dez flanelinhas disputam o para brisa de carros a poucos metros do Palácio do Governo na rua Barão de Atalaia, no Parque Shopping desfilam turistas e a elite regional consumindo marcas que superam em uma peça a renda mensal de contingentes de assalariados ou subempregados.

A realidade das marisqueiras traz uma síntese das dificuldades de valorização da classe trabalhadora. Uma das profissões mais antigas do estado expõe as significativas contradições de Alagoas, assim chamada por ser banhado por muitas águas.

O coletivo, formada em sua maioria por mulheres, quer o reconhecimento da atividade junto ao Ministério do Trabalho para assegurar o direito a pensão e o acesso a seguros em tempos de escassez da pesca. “Merecemos a garantia que pescadores e outros grupos conquistaram. Estamos expostas as mesmas incertezas dos que dependem da natureza para garantir seu sustento. Precisamos de apoio da sociedade e dos governantes a essa causa mais do que justa”, afirma Maria Siqueira.

A reforma trabalhista e o Teto de Gastos dificultam o pleito do segmento e de parcela da população que viu crescer seu grau de vulnerabilidade ao enfrentar o aumento do custo de vida e a redução das oportunidades experimentadas ao longo das gestões de Lula e no primeiro mandato de Dilma Rousseff. 

A partir desse diagnóstico, Renan Filho, contrariando a decisão do MDB, apoia a candidatura nacional de Fernando Haddad (PT), em detrimento a Henrique Meirelles, presidenciável de seu partido sem margem relevante de apoio popular.

“Às vezes no sul as pessoas pensam que o Nordeste é apaixonado pelo lula, mas não se trata disso. É que o Lula gerou emprego, girou a economia, oportunizou à classe C conhecer nossas praias e assim construíram-se hotéis, restaurantes, o ambulante vendeu mais. Por isso que o cara que vende coco na orla e em todo canto vai votar 13. Claro que Lula exerce liderança nacional e é um símbolo muito forte, mas ainda mais expressivo é o resultado do governo que ele fez, é isso que faz o cidadão sentir saudade”, comenta o governador, que posicionou-se contra o golpe imposto à presidenta Dilma.

A ênfase à defesa de Haddad, representante do legado de Lula, é considerada fundamental para que o executivo federal volte a destinar verbas aos estados para políticas de inclusão. A distribuição de cestas nutricionais e leite adquirido junto à agricultura familiar a gestantes de baixa renda necessita de investimento externo para a expansão dessas ações, que incidiram na queda da mortalidade infantil mesmo com a elevação do índice a nível nacional. Entretanto, a condição de várias famílias no Bairro Tabuleiro, na favela Jacintinho, no morro dos catadores ou à beira da lagoa na capital, evidencia a necessidade de fortalecimento da rede de proteção.

A preocupação se estende à saúde ao se aguardar com ansiedade a conclusão e o pleno funcionamento de cinco novos hospitais para desafogar as unidades existentes e corrigir o insuficiente número de leitos. As quatro UPAs abertas pela atual gestão e o Hospital Geral do Estado (HGE), muitas vezes convulsionado pela alta demanda, concentram os atendimentos. “Sabemos que não há dinheiro para tudo, mas o governo erra nas prioridades. Agora estão construindo um elevado ao custo de milhões nas proximidades da localidade de Garça Alta sem que haja razão para essa obra. A pressão imobiliária de empresários ligados ao setor deve ser a razão para justificar essa escolha”, alerta a estagiária de administração, Juliana Sonaly.

O protagonismo alagoano

Mesmo tendo somente pouco mais de  1% da população brasileira, os políticos alagoanos têm alçado papel destacado no cenário nacional, especialmente após a redemocratização. Além do ex-presidente Collor, o senador em terceiro mandato Renan Calheiros (PMDB) passou pelos principais postos da República, de presidente do Congresso a Ministro da Justiça de Fernando Henrique Cardoso. Pela esquerda, depois de militar anos no PT, a ex-senadora Heloisa Helena, atualmente na Rede, chegou à candidatura presidencial pelo Psol em 2006, obtendo 6,5 milhões e meio de votos na mais expressiva votação alcançada pela legenda.

O retrospecto se viu reforçado com as escolhas de Temer para a linha de frente da equipe ministerial a partir da presença do deputado federal Max Beltrão (PMDB) na chefia do Ministério do Turismo, e de seu colega de Câmara Maurício Quintella (PR), atualmente concorrente ao Senado, que ocupou o cobiçado Ministério dos Transportes Portos e Aviação Civil. Ambos estão inseridos na coalizão liderada pelo governo.

O componente da  violência também está entre as marcas da política no estado. O único assassinato cometido dento do Congresso brasileiro teve autoria do senador Arnon de Mello, pai de Collor, crime que permaneceu impune. O patriarca errou o tiro em Silvestre Péricles, vitimando José Kairala,em 1963. Antes, na década de 1950, deputados foram armados para a votação de impeachment contra o governador Muniz Falcão, que chegou ao final do mandato mesmo após a troca de tiros na Assembleia e o registro da morte de um parlamentar.

Em tempos recentes, o assassinato do tesoureiro de Collor, Paulo César Farias continua suscitando dúvidas acerca do que realmente aconteceu com uma das figuras mais polêmicas do início dos anos 90. De todos episódios a Chacina da Gruta foi a que mais impactou a sociedade. Em 1998, a deputada federal recém diplomada Ceci Cunha foi vítima de uma emboscada. Além da parlamentar, outros três familiares foram assassinados na ocasião.

À época, realizou-se uma forte campanha até a condenação dos pistoleiros e do mandante do crime, um suplente da coligação que pretendia assumir a vaga com a morte da deputada. A participação dos filhos de Ceci exigindo a elucidação do caso foi considera fundamental, especialmente a postura de Rodrigo Cunha.

Eleito deputado estadual em 2014 e candidato ao senado, a liderança tucana quer chegar à Brasília sem atrelar-se a aliança do PSDB, que apoia o ex-superintendente da Polícia Federal Pinto de Luna (PROS), herdeiro do posto de Collor.

“Não seria coerente com meus princípios estar ao lado dos que praticam a velha política, alguns investigados que estão sendo por corrupção. Defendi que o PSDB lançasse candidatura, com ideais próximos aos meus. Infelizmente as coligações falaram mais alto, por isso preferi fazer minha campanha distante dos nomes que não representam em nada o povo alagoano”.

Durante seu mandato, Rodrigo criou a plataforma Monitora Alagoas para acompanhar o cumprimento das promessas de Renan e garante que apenas 5% foram concretizadas. “Pode-se ver que o governo não é tão eficiente quanto se vende em suas propagandas”, alega.

 Da violência política à criminalidade das ruas, a discussão sobre segurança resulta em avaliações diferentes do eleitorado acerca dos resultados da gestão. Segundo o Fórum Brasileiro de Segurança, Maceió, a capital mais violenta do Brasil por dez anos – e a sexta do mundo -, hoje é a nona, diminuindo os homicídios. Apesar disso, a briga das facções por territórios chegou ao estado, que também registra situações de abuso de poder pelas forças de segurança e demora nas investigações.

Um dos casos emblemáticos envolve o desaparecimento de David da Silva em agosto de 2014 depois de ser visto pela última vez em um veículo da radiopatrulha da Policia Militar. O grafite nas ruas perguntando Cadê David deixa acesa a memória do fato, agravado pela morte da principal testemunha, Raniel Silva.

O Ministério Público e a Polícia Civil denunciaram os quatro policias implicados na abordagem por sequestro, ocultação de cadáver e homicídio. a PM arquivou o processo e o caso corre em segredo de justiça, os acusados declaram-se inocentes.

Quem não fica calado é o rap alagoano dos Comparsas na música Bando de Fuleiro. “Nada muda por aqui, eterno pesadelo essa porra nunca acaba, soldado do diabo, popular gangue fardada na bala, na faca. A lei é feita assim, o coronelismo ainda impera por aqui. Promoção de voto, pague três leve cinco, fortuna certa com o suor dos bestas. Sempre saem impune por roubar o proletário, compram o executivo, subornam o judiciário. Já falei demais, vou ficando por aqui, senão vou terminar como o PC e a Ceci”.                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                Os rumos da esquerda

A inexistência de deputados estaduais do PT, PCdo B e Psol dão a medida do desequilíbrio de forças – na capital o quadro se repete na Câmara de Vereadores – cidades como Arapiraca e Penedo,que costumam eleger conterrâneos para a Assembleia e Câmara Federal tem optado por parlamentares conservadores. A situação levou parte do campo progressista apostar na ocupação de espaços na máquina pública para avançar em pautas sensíveis às minorias.

Nesse espírito insere-se a nomeação na Secretaria de Mulher e dos Direitos Humanos de Maria José da Silva, filiada ao PT. O partido que havia rompido com o governo depois do voto favorável ao golpe do senador Renan Calheiros, candidato à reeleição, voltou a aproximar-se com a defesa da liberdade de Lula e a oposição às reformas de Temer.

Acumulando experiência na Fundação Palmares e na Central Única das Favelas, a gestora empossada em junho deste ano tem a missão de qualificar as políticas aos indígenas, LBGTQI, povos de terreiros, ciganos, movimentos sociais, das mulheres e quilombolas, cuja história no estado é simbolizada pelo líder Zumbi do Palmares e seu grito de liberdade na Serra da Barriga.

 “Em minha equipe temos esses segmentos representados. Precisamos voltar a fazer o Minha Casa, Minha Vida, Luz para Todos, o Bolsa Família. A transformação de vida dos grupos vulneráveis veio através desses programas. As comunidades quilombolas em Alagoas, por exemplo, somam 69 espalhadas do sertão, ao agreste e zona da mata. A construção da estrada para União dos Palmares foi uma das medidas importantes para melhor o acesso ao local sendo possível graças a emenda do deputado Paulão”, destaca Maria, citando o parlamentar petista que é o único do partido a concorrer à Câmara Federal.

Ao passo que a esquerda acessa espaços governamentais ainda restritos, o poder da direita se espalha do futebol às emissoras de TV e ao controle político de regiões. A família Collor segue proprietária da afiliada local da Rede Globo e a influência do senador sempre pesou nas decisões do CSA, agora menos garantem os torcedores azulinos que sonham com a consagração da chegada à primeira divisão em 2019 – quem atingiu o ápice novamente foi a alagoana Marta, premiada a melhor do mundo.

Os Calheiros também valem-se do poder angariado ao longo de décadas, em Murici, cidade identificada com o clã, Renan Filho elegeu-se prefeito aos 23 anos, sendo reeleito quatro anos mais tarde.

“A esquerda teve seus momentos melhores lá atrás com Muniz Falcão e com minhas vitórias em 1998 e 2002, época em que o PT e PCdoB governaram comigo. Depois de 2006 houve um enfraquecimento muito grande”, cita o ex-governador Ronaldo Lessa (PDT), cuja candidatura está ameaça por perseguição de setores do judiciário, garante.”Nomes flagrados na Operação Taturana, que desvendou o maior esquema de corrupção recente em nossa Assembleia estão com suas candidaturas registradas e eu estou nessa situação. É inacreditável”.

O experiente político integra a aliança governista e destaca a inauguração das 50 primeiras escolas em tempo integral como reflexo dos êxitos do executivo.

Primeiro governador nascido no interior desde a redemocratização, Renan obtém relevante aceitação nas pesquisas que indicam aprovação acima de 70%, conforme o Ibope, números que esvaziaram a capacidade da oposição de organizar um discurso de mudança.  Resta saber se o peemedebista conseguirá colocar na boca do povo a satisfação com a continuidade do projeto que caminha para continuar no poder pelos próximos quatro anos.

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