Política

Cade prepara-se para julgar cartel do metrô

Processo deverá ser desmembrado para apressar decisão. ‘Cartéis nem sempre são só cartéis, são organizações criminosas’, diz superintendente-geral

Estação de metrô em São Paulo: ao menos partes dos trens da cidade foram superfaturados, segundo a investigação
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O processo do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) contra o cartel do metrô de São Paulo e de mais quatro estados deverá ser desmembrado para acelerar o julgamento. Foi aberto em março, mas existem tantos investigados que até hoje o órgão antitruste procura alguns deles para intimá-los a apresentar suas defesas. Enquanto todas as 18 empresas e 109 pessoas físicas citadas não forem encontradas, não começará a contar o prazo geral para a entrega das defesas.

A maior dificuldade está sendo localizar pessoas investigadas que vivem no exterior. Por isso, uma possibilidade examinada pelo Cade é dividir o caso entre um para aqueles citados que estão no Brasil e outro exclusivo para os que estão fora. A separação permitiria uma decisão mais rápida sobre o núcleo do cartel, formado por empresas como Alstom, Siemens, Bombardier, CAF e Caterpillar. Todas estas já foram notificadas, segundo o superintendente-geral interino do Conselho, Eduardo Frade.

No inquérito que levou à instauração do processo, o Cade colheu provas de atuação do cartel em 15 licitações. Elas foram realizadas entre 1998 e 2013 por empresas estatais de metrô e trem de São Paulo, do Rio Grande do Sul, do Rio de Janeiro, de Minas Gerais e do Distrito Federal. Deram origem a contratos a somar 9,4 bilhões de reais. A maior parte deles foi assinada em São Paulo, um total de 6,2 bilhões de reais.

Além do volume de recursos, São Paulo tem outras particularidades. É o estado com mais contratos suspeitos de sobrepreço. E com o maior número de contratos assinados durante um longo período de tempo. Há negócios fechados desde o fim dos anos 90 e por toda a primeira década dos anos 2000. Neste período, o estado foi governado apenas pelo PSDB, enquanto nos demais estados envolvidos no processo houve alternância de poder.

De acordo com Frade, cartel atuante em licitações tem, quase sempre, a cumplicidade de agentes públicos. Não fosse assim, seria difícil para as empresas conseguirem superfaturar obras. É o que provavelmente aconteceu na Petrobras, como se vê Operação Lava Jato, a levar à prisão uma série de executivos de empreiteiras e de ex-diretores da estatal. “Cartéis nem sempre são só cartéis, são organizações criminosas”, afirma o superintendente-geral interino.

O Cade negocia há algumas semanas uma delação premiada com uma empresa envolvida na Lava Jato, a Setal Óleo e Gas, e é bem possível que abra um processo contra o cartel das empreiteiras na área petrolífera. Este ano, já foram assinados dez acordos do gênero, segundo maior número desde que a prática começou em 2003.

O órgão antitruste considera este tipo de acordo, chamado de acordo de leniência, como essencial no combate a cartéis. Sem isso, diz Frade, é “dificílimo” descobrir conluios entre empresas. Foi assim, aliás, que nasceu o processo do cartel do metrô. O Cade foi procurado por uma das participantes, a Siemens, e selou a delação premiada em maio do ano passado. Com isso, a multinacional alemã espera ficar livre de multas administrativas e de ações penais na Justiça.

Segundo a literatura internacional a respeito do assunto, cartéis costumam trabalhar com um superfaturamento de 20%. Se foi assim no caso metroferroviário brasileiro, o desvio de verba pública no processo em exame no Cade teria sido de 1,8 bilhão de reais. Apenas em São Paulo, de 1,2 bilhão. “Cartel não é um ilícito menor. Muitas vezes gera prejuízos maiores ao consumidor do que corrupção, furtos, roubos”, diz Frade.

*A pedido Eduardo Frade, a assessoria de imprensa do Cade procurou a reportagem no dia 1/12 para dizer que o superintendente foi mal interpretado em seus comentários sobre o andamento do processo. Por este motivo, foi suprimida do texto a informação de que o caso poderia ser julgado ainda este ano.

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