Política
Brasileiro votará em meio à maior crise desde a redemocratização
Eleitor vai às urnas com desejo de renovação no cenário político e deve reduzir espaço ocupado pela esquerda
Neste domingo 2, mais de 144 milhões de brasileiros irão às urnas em 5.568 municípios para escolher os candidatos de sua preferência entre 16.953 prefeituráveis e 463.376 postulantes a vereador. Esta será a eleição que vetou as empresas de financiar campanhas. Mas será também o pleito que não impediu o poder econômico de influenciar os eleitores: em boa parte das cidades despontam os milionários que colocaram a mão no bolso para pagar seus jingles e santinhos.
O eleitor terá a oportunidade de escolher políticos que, pela primeira vez, se apresentam como ‘apolíticos’ ou rechaçam os ‘políticos profissionais’. Homens e mulheres que, apesar das negativas, conseguiram costurar alianças partidárias para disputar uma eleição majoritária – algo bastante difícil.
Cientistas políticos ouvidos pela CartaCapital avaliam tendências para este domingo. Entre elas, a possibilidade de os eleitores rejeitarem caciques tradicionais da política para optar por novatos, confirmando o desejo de renovação surgido em junho de 2013. O risco, porém, é de o novo não ser realmente uma novidade.
Para Ivan Filipe Lopes Fernandes, professor da Universidade Federal do ABC (UFABC) e estudioso de tendências de voto a partir dos movimentos da economia, o crescimento de candidatos negando a política reflete a busca pelo eleitor de uma solução rápida para a crise econômica.
O problema, contudo, é que o eleitor tem dificuldade em entender a solução passa necessariamente pela política. “A grande maioria da população está rejeitando a política e esse é um problema que a gente precisa corrigir para o futuro”, diz Fernandes.
William Nozaki, professor Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESP-SP), avalia que a ascensão econômica das últimas décadas reforçou no imaginário social a ideia de antes do cidadão vem o consumidor, o empreendedor. Em contrapartida, reduziu o espaço da negociação para que questões sociais fossem atendidas com políticas públicas.
Esse anseio de uma política de cunho mercadológico, mapeado pelos partidos, levou ao lançamento de candidatos com o estereótipo liberal. Ou seja, os muitos que se apresentam como gestores desgarrados do modo de vida do político profissional.
“A crise geral de representação e o cansaço da população, que não enxerga expectativas futuras mais favoráveis (na economia), criou um clima de ‘os políticos são todos iguais, ineficientes, incompetentes e precisam se substituídos por outro perfil que não o do político’”, considera Nozaki.
Enfraquecimento da esquerda
O movimento deve reduzir os espaços ocupados pela esquerda, principalmente o número de municípios governados pelo PT, que deve recuar nos grandes centros urbanos. “Os governos de esquerda e mais progressistas devem ter um encolhimento no número de cidades e uma mudança no perfil de cidades governadas. Os municípios onde a esquerda será vitoriosa certamente serão aqueles pequenos e médios”, avalia Nozaki.
Fernandes avalia que a esquerda que conseguiu polarizar o eleitorado com grupos de centro direita deve voltar à casa de 30% dos votos de antes da chegada do PT à presidência da República em 2003.
“A esquerda vai sofrer um revés, mas não vai ser um revés tão forte. Isso porque quando o PT assumiu o poder ele ampliou o espectro de apoio ao petismo e à esquerda. Com essa crise, o PT deve retornar para um lugar mais próximo da sua origem”, afirma o professor da da UFABC.
A coordenadora do Grupo Opinião Pública da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), a cientista política Helcimara Telles, aposta na ocupação dos espaços de poder perdidos pela esquerda pelo que ela denomina chama de “neopopulismo de direita”.
“Com a ruptura do partidarismo, a gente já notava em pesquisas de 2014 o surgimento desse neopopulismo de direita”, diz. “É um populismo que vem com o discurso de que vai devolver o poder ao povo”, afirma.
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