Política

As máquinas autônomas nunca substituirão os trabalhadores rurais

Há uma infinidade de formas de plantio, mais dependentes de mãos lavradoras ou não

As máquinas do Nando, um dia, poderão ajudar um ou outro, mas nunca os eliminarão
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Tenho-me recusado a tangenciar o momento político brasileiro nas colunas. Já o fazem às mãos-cheias. Sei que assim perco leitores da coqueluche do momento. Os “efezinhos” vão dos milhares às centenas, facilmente. Compartilha apenas quem quer incomodar algum desafeto; 90% da opinião nacional se dirige a isso, 5% à contratação de Neymar pelo PSG, os demais 5% pedem que Deus nos ajude. É o que mais posso esperar.

O Brasil, em pouco mais de um ano, como aquelas caixas que vão decrescendo suas dimensões até que na última caiba apenas uma pulga atrás da orelha, jogou fora, a paneladas, 31 anos de reconstrução democrática. Pior, expusemos a mediocridade da maioria dos brasileiros que atuam nos Três Poderes e nas folhas e telas cotidianas, e passamos a ser o miquinho do planeta.

Mesmo no agronegócio não encontro pérolas para lhes expor. Campeões nacionais como Joesley, lateral do Galo, e Wesley, da Raposa? Como um ministro da Agricultura, Blairo Maggi, um dos maiores produtores individuais de soja do mundo, que sabe tratar uma semente, plantá-la, usar inoculação, acompanhar as fases da vegetação ao ponto da colheita, não sabe cuidar de burocratas em Brasília e dar recursos à Embrapa?

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Sou insistente e procuro. De prima, encontro o senhor Fernando Gonçalves Neto, engenheiro mecânico e presidente da Jacto, empresa tradicional de máquinas e equipamentos agrícolas, que declara à revista Globo Rural (julho, 2017): “num exercício de futurologia, acredito que em quatro ou cinco anos a máquina autônoma já será uma realidade no mercado”.

Claro que o doutor fala em agricultura de precisão, onde o dono da fazenda senta a bunda em escritório ou cabine de máquina agrícola e monitora, digamos, o mínimo, até mesmo Deus. Ou não? Nando, apenas se aproveita de tecnologias não tão novas assim para melhor avaliar a empresa no mercado e seu bônus de fim de ano, diante de concorrentes multinacionais?

Caboclos, campesinos, caipiras, sertanejos e ruralistas pouco endinheirados, sacaram? A conversa do futurólogo é com vocês. Filme que já assistem há décadas. Eles os acham caros, ineficientes e com muitos “direitos trabalhistas”. Em 4 a 5 anos, sobrar-lhes-ão formar duplas sertanejas ou disputar rodeios em cavalos mecânicos.

Dizem os dicionários e aceita o saber comum: “autônoma, é aquela que não se deixa influenciar por ninguém”. A tecnologia de automação avança em qualquer atividade, é histórico, mas até que página? São milhares de culturas alimentícias, fibras, combustíveis, silvicultura, pastagens, módulos de terras, relevo, fases dos plantios, nutrição e fisiologia vegetais.

A agricultura brasileira confunde a própria dialética. Vista assim do alto, se faz orgástica e só se expressa em números, recordes, volumes, ilusões. Com a lupa, vive a contradição de não entender que o passado comporta um futuro melhor. Está sem dialética, não há contestação. Mais um ano seremos recordistas na produção de grãos, é o que basta para generalizar o sucesso e abafar todas as mazelas que mostram subjacente um estado de putrefação.

Gente do campo, não se assuste com o que diz o Dr. Fernando. Sua verdade não enxerga um planeta diversificado e seu besteirol para uns vai até a página 9, para outros até a 32, e para alguns nem passa da orelha da capa. O livro da atividade laboral no campo não tem fim. O que se quer é amedrontá-los e roubar-lhe mais fácil os direitos.

Há infinitas culturas que nascem da terra, da água, do homem. Têm a idade do planeta. Nelas, uma infinidade de formas de plantio, mais técnicas ou não, mais devastadoras de biomas ou não, mais dependentes de mãos lavradoras ou não, de maior possibilidade de agregação de valor para o comércio capitalista, ou não.

São de nossas escolhas, possibilidades e vocações, dependendo do lugar do mundo em que vivemos. As máquinas do Nando, um dia, poderão ajudar um ou outro, mas nunca os eliminarão.

Pelo contrário, vocês crescerão. Só peço uma coisa, não ajudem a crescer a bancada ruralista no Congresso Nacional. Ela já cresceu o suficiente e apenas em benefício de seus 250 componentes.

Volto ao assunto, se não vomitar ao escrever sobre eles.

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