Política

As ações do Exército antes, durante e depois dos ataques de 8 de Janeiro, segundo o general Dutra

O militar, que chefiava o Comando do Planalto no dia da invasão golpista, prestou depoimento à CPI dos Atos Antidemocráticos

Foto: TV Câmara Distrital/Reprodução
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O general Gustavo Henrique Dutra de Menezes, ex-chefe do Comando Militar do Planalto, afirmou nesta quinta-feira 18 que o Exército buscou “desmotivar” a presença de bolsonaristas no acampamento em frente ao Quartel-General da Força, em Brasília.

Menezes, que chefiava o CMP durante os ataques às sedes dos Três Poderes em 8 de Janeiro, é o primeiro oficial do Exército a depor na CPI dos Atos Antidemocráticos, instalada pela Câmara Legislativa do Distrito Federal.

“Nós tentamos o tempo todo, desde o início, desmotivar o acampamento. O Exército é uma instituição preocupada com a dignidade humana, a preservação da vida, o cumprimento legal das atividades”, afirmou Dutra.

O militar ainda argumentou que o Exército não removeu os acampamentos porque nenhum órgão “com poder para dizer que aquele acampamento era ilegal o fez”.

“Nós resolvemos estabelecer uma estratégia indireta para desmobilizar o acampamento. Desde o início, estabelecemos regras, limitamos os acessos e a logística”, acrescentou, em referência a comércio irregular e “gatos” de energia no local. 

Em dezembro, prosseguiu Menezes em seu relato, um militar foi orientado a ir até o acampamento e incentivar os bolsonaristas a “passarem o Natal em casa”. Nesse momento, foi exibido um vídeo na Câmara a mostrar um militar, enviado pelo CMP, se dirigindo aos bolsonaristas.

“Se não houvesse aquele lamentável 8 de Janeiro — aquela coisa fatídica, não entendo como um grupo de pessoas faz um ato de vandalismo daquele —, o acampamento acabaria naturalmente.”

Questionado sobre uma possível colaboração dos militares com os golpistas, Dutra negou. “Nunca demos vida fácil para manifestantes. Tivemos preocupação com a vida humana e nunca recebemos ordem judicial. Quando recebemos no dia 8, tiramos.”

Em resposta, os deputados apontaram relatos de que o Exército teria formado um cordão no QG para impedir a entrada da Polícia Militar e evitar a prisão dos bolsonaristas.

O general considerou a versão uma “insanidade”. “Nós estávamos ali aumentando o isolamento do SMU [Setor Militar Urbano] para dissuadir a volta dos manifestantes. Voltaram mil e poucas pessoas, porque o SMU não tem como fechar todo perímetro”, devolveu.

Os deputados distritais exibiram um vídeo em que um militar do Exército discute com um PM, enquanto os bolsonaristas estavam no local.

“O batalhão da Guarda Presidencial recebeu ordens de evacuar o Palácio do Planalto. Um coronel do GSI contatou um major do BOPE, pedindo para que ele entrasse e efetuasse as prisões. Um tinha ordem de tirar, outro tinha ordem de prender”, declarou Dutra sobre a gravação.

Bastidores das prisões no 8 de Janeiro 

Antes de deter os vândalos nas sedes dos Três Poderes, Dutra diz ter mantido uma conversa com o presidente Lula (PT), a quem sugeriu adiar o desmonte do acampamento em frente ao Quartel-General do Exército para a manhã de 9 de janeiro. 

“Ele [Lula] falou: ‘general, são criminosos, têm que ser todos presos’. [Eu disse:] ‘presidente, estamos todos no mesmo passo, estamos todos indignados iguais, serão presos. Só que, até agora, nós só estamos lamentando dano ao patrimônio. Se nós entrarmos agora sem planejamento, podemos terminar essa noite com sangue“, afirmou.

Lula teria dado seu aval à decisão de Dutra. “O presidente Lula, eu tenho uma admiração pela inteligência emocional dele. Ele na mesma hora falou: ‘seria uma tragédia’. E falou assim: ‘general, isola a praça e prende todo mundo amanhã’. Eu virei: ‘presidente, muito obrigado pela compreensão do senhor. Dentro das possibilidades, uma boa noite’. Ele virou: ‘o ministro Múcio está aí com o senhor’? Eu disse: ‘não’. Ele disse: ‘deveria estar’. E desligou o telefone”.

A situação responderia, em tese, ao que foi relatado pelo coronel da Polícia Militar do Distrito Federal Jorge Eduardo Naime. Ele acusou Dutra de impedir prisões de golpistas no QG após ordem do ministro Alexandre de Moraes, no final do dia 8. 

Sobre o planejamento para a operação, que aconteceu ainda em 8 de Janeiro, o general relata ter conversado com o ministro da Justiça, Flávio Dino, e o ministro da Casa Civil, Rui Costa, sobre o uso de ônibus para retirar os bolsonaristas do local. 

“Eu emiti, então, uma ordem de operações para os meus comandantes subordinados. Com isso, isolamos a Praça dos Cristais. Daí, acontece um fato interessante, porque havia umas pessoas, um nível de fanatismo. Quando isolamos a praça, as pessoas estavam pensando que estávamos isolando para protegê-las e foram dormir. No dia seguinte, a PMDF chegou na hora certa, com todos os meios.”

Desmonte dos acampamentos

No depoimento, Dutra ainda contou que o Exército encontrou uma arma de fogo na área do Setor Militar Urbano onde estava o acampamento golpista. 

“Após a desmontagem do acampamento, no dia 10 – não dá para fazer ligação direta -, havia um revólver dentro do lago. Esse revólver faz parte da relação de material que foi levantada nos nossos inquéritos e encaminhada ao STF”, disse.

A CPI ainda deve ouvir o tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), e o general Gonçalves Dias, ex-ministro do GSI.

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