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Ao reconhecerem González como vencedor, EUA dificultam trabalho com o Brasil sobre a Venezuela, diz professor
Para Rafael Ioris, docente de História e Política da Universidade de Denver, eleição americana pode explicar a ‘correria’ de Antony Blinken


O fato de o chefe da diplomacia dos Estados Unidos, Antony Blinken, ter reconhecido uma suposta vitória de Edmundo González sobre Nicolás Maduro na eleição presidencial da Venezuela dificulta o trabalho conjunto entre os governos norte-americano e brasileiro, avalia Rafael Ioris, professor de História e Política da Universidade de Denver, no Colorado.
Blinken afirmou, na quinta-feira 1º: “Dada a esmagadora evidência, está claro para os Estados Unidos e, mais importante, para o povo venezuelano, que Edmundo González Urrutia ganhou a maioria dos votos nas eleições presidenciais da Venezuela em 28 de julho”.
Dois dias antes, os presidentes Lula (PT) e Joe Biden haviam conversado por telefone e concordado sobre a necessidade de a Venezuela divulgar na íntegra as atas eleitorais. A Casa Branca e o Palácio do Planalto não fizeram, naquele momento, qualquer menção a atestar um dos lados como vencedor.
“O presidente é superior, mas por que o ministro das Relações Exteriores faz esse anúncio?”, questiona Ioris, em referência à declaração de Blinken. “É um jogo de peso pesado lá dentro do Estado americano. Isso dificulta a possibilidade de Brasil e Estados Unidos trabalharem conjuntamente.”
O professor diz estranhar o que considera uma “correria” de Blinken para se manifestar. Isso pode decorrer, em sua avaliação, do cenário eleitoral nos Estados Unidos, devido a uma cobrança para que os democratas sejam mais firmes em relação à Venezuela.
Apesar disso, Ioris ainda vê espaço para um “diálogo de alto nível” entre Lula e Biden, embora o caminho esteja mais estreito após a afirmação de Blinken.
Na quinta 1º, os governos de Brasil, Colômbia e México reiteraram uma cobrança à Venezuela pela divulgação das atas eleitorais. Os países também instaram todas as partes a resolver por vias institucionais as “controvérsias”.
Rafael Ioris projeta, entretanto, ser improvável que a exigência por mais clareza na publicação dos resultados prospere. “Esse argumento é correto, é a posição correta, mas os fatos estão atropelando essa postura por princípio correta, porque está havendo violência e porque os Estados Unidos já tomam uma posição de força.”
Em uma coletiva de imprensa em Caracas nesta sexta, Maduro disse estar “pronto” para divulgar a íntegra das atas da eleição – depende, segundo ele, de um pedido do Tribunal Supremo de Justiça.
Horas antes, o Conselho Nacional Eleitoral ratificou a vitória do chavista sobre González por 51,9% a 43% dos votos. A oposição, porém, não reconhece o resultado e alega fraude na contagem.
Enquanto isso, além dos Estados Unidos, países como Argentina, Uruguai, Equador, Costa Rica e Peru reconhecem González como presidente eleito da Venezuela.
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