Política

Aliados de Bolsonaro querem ‘mal menor’ em caso das joias, evitando denúncia criminal

O entorno do ex-presidente vê chance de livrá-lo de denúncia com base no caso do relógio de Lula; PF sustenta que crimes de Bolsonaro vão além

Aliados de Bolsonaro querem ‘mal menor’ em caso das joias, evitando denúncia criminal
Aliados de Bolsonaro querem ‘mal menor’ em caso das joias, evitando denúncia criminal
Ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Foto: Evaristo Sa/AFP
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O entorno do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) aposta na decisão do Tribunal de Contas da União que livrou o presidente Lula (PT) de devolver um relógio de ouro recebido em viagem à França há quase duas décadas para anular o inquérito das joias sauditas.

A Polícia Federal acusa o ex-capitão de integrar uma organização criminosa montada no Palácio do Planalto para desviar presentes de luxo recebidos sob sua gestão e vendê-los no exterior. Os recursos obtidos nas negociações retornavam ao patrimônio dele e serviram para custear sua estadia nos Estados Unidos, de acordo com as investigações.

Bolsonaro foi enquadrado em associação criminosa, lavagem de dinheiro e peculato (quando um agente se apropria indevidamente de bens públicos), cujas penas, somadas, podem chegar a 25 anos de prisão. O ex-presidente nega as acusações.

Nos próximos dias, integrantes da defesa devem levar o entendimento do TCU à Procuradoria-Geral da República. Isso porque cabe ao PGR Paulo Gonet decidir se denuncia ou não o ex-capitão pelo caso das joias – ele pode pedir também a realização de novas diligências.

O relatório da PF aportou no gabinete de Gonet no início de julho. Mas, até o momento, o chefe do Ministério Público Federal não se manifestou sobre o caso. Como mostrou CartaCapital, o procurador tem repetido a interlocutores que não haverá “açodamento” de sua parte. É uma forma de de não alimentar teorias de uma suposta perseguição a Bolsonaro.

Com o entendimento do TCU, aliados do ex-capitão entendem ser possível convencer o PGR a não denunciá-lo pelos crimes apontados no inquérito. Ainda que Gonet escolhar enquadrar Bolsonaro por infrações administrativas em razão de ter incorporados bens públicos ao seu acervo pessoal, este seria um “mal menor”, na avaliação de pessoas próximas.

O temor com uma possível denúncia acontece à luz da estratégia do Partido Liberal em usar a imagem do ex-presidente para conquistar mais prefeituras nas eleições deste ano.

A cúpula da PF, entretanto, entende que a decisão do TCU não tem o potencial de anular as investigações contra Bolsonaro. Isso porque a tese vencedora na Corte não se sobrepõe ao Código Penal. Essa avaliação é compartilhada pelo diretor-geral Andrei Passos Rodrigues, para quem a competência deste caso é da Justiça criminal.

Isso porque, conforme disse ao jornal O Globonão apenas houve o recebimento das joias, mas “omissão de dados, informações, ocultação de movimentação de bens, advocacia administrativa”, entre outras condutas que vão “além de questões meramente administrativas”. 

O julgamento no TCU foi acompanhado com atenção pelo entorno de Bolsonaro, pelo potencial de modificar a situação do ex-presidente no caso das joias. A provocação que deu origem à discussão partiu do deputado bolsonarista Ubiratan Sanderson, do PL gaúcho.

Integrantes da defesa do ex-capitão trabalhavam com duas hipóteses. A primeira: caso Lula fosse obrigado a devolver o relógio Cartier que ganhou em 2005, durante viagem à França, os advogados pediriam um pente-fino em todos os presentes recebidos pelos presidentes da República ao longos das últimas décadas.

Também cobrariam apurações semelhantes às que Bolsonaro responde no Supremo Tribunal Federal. O outro cenário seria com o entedimento pela não devolução do item, o que se concretizou nesta quarta.

Durante a discussão no TCU, prevaleceu a posição do ministro Jorge Oliveira, que entendeu não ser possível determinar a devolução de presentes em razão da falta de regra clara para o tratamento dos itens recebidos durante o exercício do mandato.

Até que haja uma lei específica que regulamente a matéria, acrescentou o magistrado, não há fundamentação jurídica para que sejam enquadrados como bens públicos os presentes recebidos por presidentes da República no exercício do mandato.

Isso, segundo ele, inviabilizaria qualquer determinação do TCU para a devolução de bens incorporados ao patrimônio público. O entendimento de Oliveira foi acompanhado pelos ministros Augusto Nardes, Vital do Rêgo Filho, Jonathan de Jesus e Aroldo Cedraz.

O relator do caso, Antonio Anastasia, também votou pela não devolução pelo fato de a regra aprovada pela Corte em 2016 não possui caráter retroativo. Naquele ano, o tribunal deliberou que os presentes entregues por autoridades estrangeiras desde 2002 deveriam ser incorporados ao patrimônio público, à exceção daqueles considerados “personalíssimos” ou de consumo próprio.

Em 2023, com as revelações de que Bolsonaro teria vendidos os itens no exterior, o TCU voltou a se debruçar sobre o tema e entendeu que mesmo os itens “personalíssimos” deveriam integrar o patrimônio da União.

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