Política

A pequena participação dos produtos agropecuários no comércio mundial

Como a levada dos países pobres e emergentes não supõe demanda crescente a taxas aceleradas, o comércio de alimentos, fibras e energias renováveis pouco deverá aumentar a participação

Os estoques de soja (foto), trigo e milho passarão com excedentes maiores em relação aos anos pós-crise internacional e adversidades climáticas nos EUA e Argentina
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Os agricultores do oeste paranaense, de onde acabo de voltar, não perdem tempo. Nem poderiam. Para produzir parte dos grãos que deverá se somar aos quase 200 milhões de toneladas da safra brasileira 2014/15, eles já estão com um lado do traseiro na cabine de uma colhedeira de trigo e o outro lado numa plantadeira de soja. Olhos na internet e no céu, à espera das primeiras chuvas.

Entre Cascavel, Toledo, Palotina, vi soja sendo semeada sobre a palhada de trigo colhido naquele dia. Até o final de setembro, mesmo os mais prudentes farão da dúvida certeza irreversível.

Os narizes, levemente arrebitados ou aduncos, germânicos e itálicos, permanecerão apontados para os odores e humores da Bolsa de Chicago, temerosos de que a enorme safra norte-americana traga-lhes ao paladar um gosto travoso, que não é nem de umbu nem de cajá, mas de preços em amargo jiló mesmo.

Palpite: não há dúvida de que irá diminuir o docinho de anos recentes, mas não a ponto de transformar-se em catalonha selvagem.

Os estoques mundiais de soja, trigo e milho, como escrito aqui meses atrás, passarão com excedentes maiores em relação aos anos pós-crise internacional e adversidades climáticas nos EUA e Argentina. Nem mesmo o apetite chinês será capaz dessa ingestão, o que trará para cá pelo menos dois anos de azia.

Pronto, pensarão os leitores mais afoitos e de boa memória: “O cara mudou de ideia, não iria tratar das exportações do agronegócio brasileiro?”

Até vou. Deixarei para colunas à frente a tarefa de subir o morro e pôr a vista assim do alto nas tendências para a agricultura brasileira que começa um novo plantio.

Sim, usei a lupa em “Intercâmbio Comercial do Agronegócio” (MAPA, edição 2013), e confesso não ter encontrado grandes novidades. Apenas fiquei atônito com nossa falta de habilidade em fazer crescer as divisas trazidas ao País. Bastava incluir em nossa pauta de exportações vídeos com as centenas de candidatos a representantes políticos que aparecem na TV. A rubrica: entretenimento tropical.

Vamos aos números: é pequena a participação em valores dos produtos agropecuários no comércio mundial. Elefantes físicos, formigas monetárias.

Em 2012, 7,4%. Há mais de uma década não sai da faixa entre 6,5 e 7,5%.

Mesmo com nove bilhões de bocas para alimentar em 2050 e a garantia da FAO de que o número de famintos no planeta tenha caído de um bilhão para 850 milhões, não creio em mudanças drásticas nesse perfil nas próximas décadas.

Ainda são muitos os deficientes nutricionais, vários os governos e camadas da sociedade que se lixam para isso, e milhões os habitantes que saltam dos cereais para os brinquedos eletrônicos sem passar pelas proteínas.

Como a levada dos países pobres e emergentes não supõe demanda crescente a taxas aceleradas, o comércio de alimentos, fibras e energias renováveis pouco deverá aumentar a participação nas exportações mundiais.

Até aí, estamos olhando para o planeta. Nela, no entanto, há pouco mais de 8,5 milhões de quilômetros quadrados de chão que dependem muito desse comércio. Em 2012, mais de um terço das exportações brasileiras vieram do agronegócio.

De 2002 até aí quintuplicamos o valor das exportações agrícolas, para US$ 83,4 bilhões. Gradativamente, fomos invertendo a posição de nossos parceiros.

A partir de 2006, enquanto os países desenvolvidos traquinavam com seus brinquedinhos financeiros, acabando por se machucarem, a participação das exportações agropecuárias brasileiras para esses países caiu de 46,7% para 33,0%, enquanto para os países emergentes saía de 49,7% para 63,4%.

Com produtos 85% concentrados nos complexos de soja, carnes, sucroalcooleiro, dos cereais, e no velho e bom café.

É justamente neste momento que chega o amigo Hector, ferrenho admirador de latinoamerica, que em tom quase bolivariano pergunta: “y el Mercosur”?

Pois é, a participação das exportações do agronegócio brasileiro para o Mercosul caiu de 1,8 para 1,6%.

“No puede”.

“Queria o quê, Héctor? Soja, milho, trigo, boi pra Argentina? Toma lá um cafezinho”.

De novidade mesmo, para as Estampas Eucalol, sugeriria o gosto marroquino. Em 2011, o Brasil exportou duas toneladas de cachaça para o Marrocos. No ano seguinte, nada. Ou não gostaram ou foram buscar no Paraguai.

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